Pretos Olhares

Fotografia e outras linguagens da arte feitas por pessoas pretas

Pretos Olhares - Catarina Ferreira
Catarina Ferreira
Descrição de chapéu Dias Melhores

Projeto Click na Favela oferece aulas gratuitas de fotografia

Criado por fotógrafos de Paraisópolis, em São Paulo, iniciativa quer incentivar contato com a arte e senso crítico em jovens

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São Paulo

"Eu não quero sair da favela para ser alguém, quero ser alguém dentro dela. Já sou alguém hoje", afirma Daniel Eduardo, 28, fotógrafo e morador de Paraisópolis, a segunda maior favela da capital paulista.

Ele coordena o Projeto Click na Favela (PCNF) , criado em 2019, para oferecer aulas gratuitas para jovens entre 15 e 25 anos. Seu trabalho, afirma, é mostrar aos mais novos que eles têm capacidade criativa, que podem contar suas histórias e usar a imagem, o texto e a música para isso.

Dois adolescentes negros seguram uma câmera fotográfica
O Projeto Click na Favela foi criado em 2019 para capacitar jovens da periferia interessados no estudo da fotografia - @adazzi/PCNF

Sem ignorar os problemas estruturais e sociais da região, Daniel se diz incomodado com o trabalho de muitos fotógrafos, jornalistas e artistas que retratam a favela com uma visão estereotipada, apenas pelo viés da violência.

"Posso mostrar o meu mundo através das fotos. E essa vai ser a arma para transformar minha vida e mostrar a realidade da favela", diz ele, que é o idealizador do PCNF.

Os encontros do projeto são semanais. O curso tem duração de quatro meses e ao final os alunos organizam uma exposição com as imagens que fizeram. Além das aulas teóricas, que passam pelos fundamentos da fotografia, como luz, composição da imagem e funcionamento das câmeras, os encontros debatem a autoestima dos participantes e a valorização do entorno —de quem vive e trabalha na favela.

Os pré-requisitos para participar são: ter interesse por fotografia e morar em Paraisópolis, ou outra região da periferia da cidade.

Artistas e pesquisadores que nasceram na periferia de São Paulo também são convidados para rodas de conversa com os estudantes.

"Sempre tentamos enfatizar ‘você pode ser um fotógrafo, pode trabalhar em mídias sociais, pode produzir eventos, você pode fazer muita coisa"', diz Dieson Moraes, 30, o Didico, que também trabalha no PCNF.

Para ele, mesmo com a popularização do celular e o maior acesso à fotografia, trabalhar com o audiovisual é uma realidade muito distante para quem cresce na favela. "Os cursos são caros e as possibilidades profissionais desconhecidas."

Didico começou a fotografar em 2015. Arquiteto de formação, ele se apaixonou pelo audiovisual trabalhando com fotografia de rua.

Foi em um coletivo de fotógrafos que encontrou Daniel. Colegas de profissão, eles se tornaram amigos e descobriram também que eram vizinhos, moradores de Paraisópolis.

A principal semelhança entre eles, disseram em conversa por vídeo, é a vontade de utilizar a arte como meio de transformação social.

Alguns participantes desenvolvem desejo de trabalhar com fotografia. Já outros, que querem seguir profissões diferentes, dizem ter melhorado o senso crítico e estético, mudado a relação com a arte, além de ter conhecido profissionais de diferentes áreas de atuação, relata a dupla.

Mais velho de três irmãos e filho de mãe solo, Daniel teve o primeiro contato com fotografia ao trabalhar como assistente no estúdio de uma das clientes de sua mãe, que trabalhava como diarista.

Lá, ele teve contato com trabalho de iluminação, edição, produções de publicidade, além de ter tido acesso a livros de fotógrafos renomados como Sebastião Salgado. Depois de anos atuando como assistente no estúdio, Daniel diz ter começado a se interessar pela fotografia.

E foi a partir da experiência de registrar as ruas de Paraisópolis que percebeu o interesse das crianças e dos jovens em aprender.

Além de Daniel e Didico, outros dois fotógrafos fazem parte da organização do projeto. Eles se dividem entre as aulas, a produção de conteúdo para redes sociais e a procura por recursos para subsidiar o PCNF.

As aulas expositivas do projeto acontecem no centro cultural que abriga um projeto socioeducativo mantido pelo Hospital Albert Einstein. As atividades práticas são feitas pelas ruas de Paraisópolis. As inscrições para participar são feitas online, duas vezes ao ano. A turma 2023 iniciou as aulas no sábado (19).

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Escreva para catarina.ferreira@grupofolha.com.br

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