Pretos Olhares

Fotografia e outras linguagens da arte feitas por pessoas pretas

Pretos Olhares - Catarina Ferreira
Catarina Ferreira

Vilões negros de 'Homem-Aranha' e 'Pantera Negra' usam tranças nagô

Penteado sinônimo de liberdade e resistência para o povo preto também faz a cabeça dos anti-heróis

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Jundiaí (SP)

"Homem-Aranha no Aranhaverso" e "Pantera Negra" são filmes protagonizados por homens pretos — neste multiverso heróico, onde só brancos eram os principais.

As produções foram bem recebidas pela crítica, fizeram dinheiro nas bilheterias e ganharam sequências. "Wakanda para Sempre" (2022) e "Homem-Aranha: através do Aranhaverso" (2023).

Miles Morales, o homem-aranha, em 'Através do Aranhaverso'
Miles Morales, o homem-aranha, em 'Através do Aranhaverso' - Divulgação

Os vilões desses quatro filmes compartilham semelhanças. Também são homens negros e usam tranças nagô, penteado símbolo da resistência contra o colonialismo e o racismo, caracterizado por um enlace dos fios próximo ao couro cabeludo. Vale lembrar, porém, que apesar da associação estética cabelos de pretos não devem ser temidos, e sim respeitados.

O primeiro a aparecer com o penteado foi Erick Killmonger (Michael B. Jordan), em "Pantera Negra". Ele começou o filme usando dreads curtos, parecidos com os que Fred Nicácio usou no BBB 23. Depois de ganhar os poderes do pantera e vestir o traje de batalha, o vilão começou a usar tranças nagô.

Killmonger foi construído para ser um militar inteligente, forte, ambicioso e desleal. Ele estava disposto a qualquer coisa para vingar seu pai, destronar seu primo T’Challa (Chadwick Boseman) e iniciar uma vingança contra os países que colonizaram e oprimiram o povo preto. Quase conseguiu.

A luta pela reparação histórica e a beleza de Michael B. Jordan fizeram com que Killmonger não fosse interpretado apenas como maligno, mesmo após ter matado wakandanos. O vilão, morto pelo seu primo, reaparece como espírito no segundo filme da franquia.

A aparição de Killmonger aconteceu quando a princesa Shuri (Letitia Wright) estava prestes a adquirir os poderes sobrenaturais. Na cena, ela usa um disfarçado, como é popularmente conhecido o corte de cabelo em degradê que inicia curto na nuca e laterais e termina com os crespos em cima.

Neste momento, Shuri buscava vingança contra Namor (Tenoch Huerta) por assassinar sua mãe. Após um breve encontro espiritual com seu primo, ela ganhou super-poderes e também assumiu as nagôs.

Shuri não era a vilã. Mas, a mudança de penteado veio no momento em que a personagem estava mais inclinada a matar outra pessoa. Vale lembrar que no primeiro filme ela também usa tranças, mas essas eram soltas da raiz do cabelo e formavam mechas finas.

As nagôs também foram usadas no Aranhaverso. Elas são o principal elemento visual que diferencia Miles Morales da sua variante no universo 42, o Gatuno, personagem da galeria vilanesca do cabeça de teia.

O Miles da Terra 42 deve retornar no próximo filme, só aí descobriremos sua história completa e suas intenções. Mas, nessa primeira aparição, a impressão que ficou foi a do vilão, que golpeou o rosto do protagonista.

No entanto, é necessário entender que as tranças nagô, assim como qualquer outro penteado usado por pessoas pretas, não são sinônimos de maldade, e sim de liberdade e autoestima.

Por que importa

O Brasil do século 21 ainda nutre preconceito com a estética capilar de pessoas pretas. No mercado de trabalho, por exemplo, negros e negras deixam de ser selecionados para vagas por seus fios crespos, cortes e penteados.

Daí a importância da situação. Em 2023, foi a primeira vez que pessoas diversas — inclusive em idade — vibraram quando uma mulher preta grávida, com cabelo black power e poderes de aranha apareceu na tela do cinema pilotando uma moto para derrotar um vilão.

Cena do filme 'Homem-Aranha: Através do Aranhaverso' mostra Jessica Drew, a mulher-aranha, disparando sua teias - Divulgação

A cena da personagem Jessica Drew é parte da animação. Há quem considere a aparição dessa mulher-aranha uma forçação no roteiro. É difícil dizer qual é a motivação desse pensamento.

Mas, ele parece um eco das críticas preconceituosas relacionadas à mudança racial de personagens do mundo da fantasia. Uma distopia racista que insiste em acreditar que só homens brancos podem fazer missões impossíveis por aí.

A animação —que mostra com naturalidade uma partida de basquete paralímpico no Brooklyn — e o live action de Wakanda com protagonismo feminino abriram caminhos para que ações heróicas fossem realizadas por toda sorte de pessoas.

Agora, cabe ao público evitar a demonização baseada no estilo de cabelo e na cor da pele.

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