A fotógrafa e artista visual Márvila Araújo se diz orgulhosa do trabalho que construiu em seus dez anos de carreira. A baiana, que hoje vive na capital capixaba, afirma rejeitar práticas que aprendeu serem "regras da fotografia" para exaltar a pele negra em seus registros.
"Compreendi que o formato de fotografia que era vendido para mim, e no qual estava trabalhando, era voltado para uma pele que não era o meu objetivo retratar", diz sobre práticas voltadas para a pele branca. Nas imagens feitas por ela, a pele das pessoas negras, seja retinta ou em tons mais claros, atua como protagonista e reluz sob o sol.
Uma das concepções que Márvila diz rejeitar é o horário considerado ideal para fotos ao ar livre, no nascer e no pôr do sol, que pela luz suave cria menos sombras no rosto do fotografado. Esses horários também são conhecidos como "hora de ouro", pela coloração alaranjada que o céu adquire.
Já o sol do meio-dia é desaconselhado por muitos profissionais, conta, por ser considerado mais difícil de trabalhar e por causar sombras mais duras no rosto fotografado. Este, no entanto, é o momento preferido de Márvila para produzir suas fotografias.
"Venho de uma família preta de pigmentação retinta, então observava muito a pele da dos meus familiares, do meu pai, da minha avó. Observava como essa pele brilhava no sol, como difundia a luz, a sombra. Ela reluz no horário que eu gosto de fotografar, sinto que potencializa ainda mais a melanina."
Seu objetivo é que suas fotos contribuam com o resgate da autoestima da população negra. "Quero retratar o poder dessas pessoas. Na minha arte elas estão sempre com olhar elevado, o corpo elevado e o Sol acima da cabeça."
O diálogo com a ancestralidade também é um aspecto importante da fotografia de Márvila. Candomblecista, ela convida homens e mulheres para representarem diferentes orixás.
Entre 2015 e 2017 a fotógrafa começou a desenvolver uma linha de pesquisa voltada às imagens da ancestralidade afro-brasileira, registros históricos, fotos de cerimônias religiosas, retratos etc. Unir pesquisa e religião, afirma, foi um passo essencial para que ela pudesse desenvolver sua percepção artística.
"Quero expandir a fotografia para trabalhar o sagrado, a imagem como uma forma de representar aquilo que nem sempre a gente consegue tocar e sim sentir, e fazer isso com muito respeito às manifestações [de arte e cultura] que vieram antes de mim."
É possível acompanhar o trabalho da fotógrafa no Instagram e também ver algumas das fotos do ensaio "Travessia do Retorno" expostas na mostra "Um Defeito de Cor", inspirada no livro homônimo de Ana Maria Gonçalves, que está em cartaz no Sesc Pinheiros, em São Paulo, até 1° de dezembro.
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