Uma cambalhota do STF ajudou Arthur Lira pela primeira vez em 2021. O deputado acabara de se eleger presidente da Câmara quando a corte reverteu uma decisão anterior e rejeitou uma denúncia por desvio de dinheiro contra a cúpula do PP.
Pesavam contra Lira as mesmas acusações que haviam sido aceitas pela Segunda Turma da corte em 2019 —mas o tribunal já era outro. A denúncia foi arquivada graças a uma mudança de placar produzida pela aposentadoria de Celso de Mello (alinhado à Lava Jato) e a chegada de Kassio Nunes Marques (indicado ao STF por Jair Bolsonaro).
A troca de cadeiras concretizou uma mudança nos ventos jurídicos e políticos do STF. A chamada ala garantista engordava à medida que aumentava a reação aos abusos da Lava Jato, incentivando o tribunal a procurar atalhos para mudar decisões. Além disso, alguns ministros buscavam uma acomodação com políticos poderosos após anos do que classificavam como um processo de criminalização dos partidos.
A cambalhota virou um duplo twist carpado na decisão que livrou Lira de mais uma acusação nesta terça (6). Primeiro, a Procuradoria-Geral da República mudou de ideia e desistiu de uma denúncia oferecida contra ele em 2018 por corrupção passiva. O STF, que em 2019 havia votado para tornar o deputado réu, seguiu o entendimento e arquivou o processo por unanimidade.
As mesmas variáveis do primeiro caso apareceram novamente: mudança na composição da corte (saiu Marco Aurélio Mello e entrou André Mendonça), desgaste da Lava Jato (a PGR argumentou que a acusação era baseada apenas em delação) e ajustes da política (Lira se tornou um dos homens mais poderosos do país).
A conjunção de fatores deu ao Supremo, em dobradinha com a PGR, conforto suficiente para corrigir excessos de uma onda do passado, mas também atrevimento para se adequar às circunstâncias de cada momento —mesmo que, para isso, precise minimizar provas e aceitar um carimbo político em suas decisões.
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