Conrado Hübner Mendes

Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC

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Conrado Hübner Mendes
Descrição de chapéu Folhajus

A esfinge lava-jatista, capítulo 7

Por uma reforma que reforce independência e controle do MPF, não subserviência

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O Ministério Público Federal é a instituição mais inovadora na história do direito constitucional brasileiro. Suas atribuições em defesa do meio ambiente, dos povos indígenas, da cidadania vulnerável e dos direitos civis, combinadas com a autonomia funcional de procuradores, fazem do MPF um motor de promoção da liberdade.

Em defesa de minorias e da ordem pública, essa instituição central de fiscalização deve estar bem ancorada para enfrentar conglomerados do poder público e privado e não precisar ceder às forças retrógradas da política nacional. Deve também estar sujeita a limites. Administrar o equilíbrio entre independência e responsabilidade é tarefa de arquitetos constitucionais e dos procuradores que lá operam.

Um agente público com tamanha atribuição precisa ter não só coragem e prudência, mas proteção institucional e limite. Deve se submeter a procedimentos de controle que corrijam erros e apliquem sanções. Esses procedimentos não podem estar ocupados pelo centrão.

Fachada da PGR (Procuradoria-Geral da União) em Brasília
Fachada da PGR (Procuradoria-Geral da União) em Brasília - Gabriela Biló - 22.ago.23/Folhapress

A cruzada anticorrupção por vias ilegais na Operação Lava Jato, chancelada pelo STF, assim como a calamitosa gestão de Augusto Aras na Procuradoria-Geral da República, foram episódios de trágica falha institucional.

Demonstram a urgência de se conter os surtos de lava-jatismo e anti-lava-jatismo. Do sujo e do mal lavado. Surtos sectários que continuam a escamotear interesses políticos e econômicos na aplicação da lei. A manipular a esfera pública e confundir jornalistas.

O período de Aras na PGR foi marcado por quatro falhas institucionais principais. Primeiro, ele foi nomeado. Segundo, ele levou às últimas consequências o poder irrecorrível de arquivamento. Terceiro, como colaborador da violência bolsonarista, pôde lutar pela recondução à PGR e nomeação ao STF. Afinal, isso é juridicamente possível. Quarto, loteou o Conselho Nacional do Ministério Público com apologistas que encamparam sua política de intimidação de procuradores.

Essas quatro falhas podem ser corrigidas ou atenuadas por boas reformas.

O método de nomeação de um chefe do Ministério Público se discute no mundo todo. Segundo relatório da Comissão de Veneza ("Opinions Concerning Prosecutors", 2022), o método precisa "ganhar confiança do público e respeito do judiciário e da profissão jurídica". Relatório da OCDE ("The Independence of Prosecutors", 2020) afirma que se deve "prevenir todo risco de influência política imprópria".

Mesmo que o atual método informal de lista tríplice seja frágil, como visto no capítulo anterior, a alternativa da nomeação discricionária absoluta é bem pior. Pode-se se pensar num procedimento mais institucionalizado e independente. Talvez por lista tríplice, tal como são nomeados os procuradores gerais de justiça nos Estados da federação. Não para alimentar o corporativismo, mas pela autonomia e competência.

O poder irrecorrível do qual Aras abusou, inigualável no Estado brasileiro, poderia estar sujeito a revisão por um colegiado superior, como o Conselho Superior do MPF.

A possibilidade de um presidente prometer reconduzir um PGR ou nomeá-lo ao STF por bons serviços facilita a captura de um vassalo. Poderia ser neutralizada com a proibição de recondução e uma quarentena para eventual nomeação ao STF.

O CNMP prestou a Augusto Aras serviço relevante. O órgão chefiado pelo PGR compõe-se de 14 membros nomeados pelo presidente, entre procuradores, promotores, juízes, dois advogados indicados pela OAB e dois cidadãos indicados pelo Congresso.

Capturado pelo PGR, abriu processos sancionatórios contra procuradores da República dissidentes, boa parte deixada em cima da mesa à espera incerta de julgamento. Uma técnica conhecida de disseminação de medo e paralisação institucional.

Para consolidar no CNMP a função espúria de perseguição política, bastaria ampliar os assentos de indicação partidária (como na proposta de emenda constitucional 5, de 2021). Para reforçá-lo como canal democrático e plural de controle, há outros caminhos.

O MPF precisa ser salvo de seus inimigos internos e externos, não anulado por desinteligência ou má-fé. Deixar o MPF ser colonizado pela política joga fora a maior criação do constitucionalismo brasileiro. O crime organizado dentro e fora do Estado também agradece.

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