David Wiswell

Escritor, roteirista e comediante americano

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Casos de documentos sigilosos fazem perguntar se líderes dos EUA são imprudentes ou burros

Republicanos e democratas parecem não concordar sobre nada, a não ser sobre descuido com segurança nacional

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Um país que devora tanto fast food digestivamente comprometedor quanto os Estados Unidos e rejeita o sistema métrico como se ele fosse uma salada talvez não consiga controlar suas merdas —nem literal nem figurativamente.

Isso ficou evidente com a onda recente de revelações de que nossos líderes mais experientes mantiveram ilegalmente documentos sigilosos em locais inseguros e aleatórios. O fato de eles nem sequer conseguirem apontar onde os papéis estão nos força a perguntar: os políticos são imprudentes, burros ou algo pior que isso?

Mas, em meio a toda a brincadeira interpartidária de atribuir a culpa aos outros, novas informações dão um colorido adicional à história.

O ex-presidente dos EUA Donald Trump chega à Trump Tower, em Nova York
O ex-presidente dos EUA Donald Trump chega à Trump Tower, em Nova York - David 'Dee' Delgado - 10.ago.22/Reuters

A confusão começou com a recusa de Trump de devolver todos os seus documentos confidenciais, conforme exige a lei, levando o FBI a revistar sua residência, um resort altamente povoado, e recuperar mais de 13 mil papéis, 103 dos quais marcados como sigilosos e 18 como ultrassecretos.

Restam indagações sobre as pastas vazias encontradas numa área de armazenagem e em sua sala de trabalho. Tudo isso foi fruto da incompetência habitual de Trump ou do maquiavelismo habitual de Trump? Os documentos encontrados eram incriminatórios? Foram levados por uma empregada ou um hóspede? Trump os vendeu ou trocou por outra coisa?

O negócio inexplicável de US$ 2 bilhões fechado por seu genro e assessor presidencial sênior com o príncipe saudita, suas declarações de renda que revelam receitas dúbias de todo o mundo mais sua reputação inescrupulosa tornam esses temores tão reais quanto o resultado das eleições.

Tudo isso lembra os ataques de Trump a Hillary Clinton, sua rival na corrida presidencial de 2016, por ter usado um celular não autorizado em um servidor inseguro em sua casa quando era secretária de Estado.

Uma violação protocolar imprudente que permitiu que seus emails fossem hackeados e divulgados pelo Wikileaks. Emails que cobriam desde discussões delicadas com doadores poderosos até o favoritismo partidário oculto que a teria ajudado a conseguir a indicação democrata para a corrida presidencial, passando de fato por informações sigilosas.

Trump então ironizou, dizendo que ela "colocou informação confidencial ao alcance de nossos inimigos, o que a desqualifica para a Presidência". E, falando da investigação subsequente aberta pelo FBI, disse que "qualquer pessoa que seja investigada pelo FBI não é qualificada para ser presidente". Discurso esse que Trump deixou para trás depois de ser alvo de quatro investigações do FBI e desde seu recente derretimento nuclear (esperemos que não literal) devido aos documentos.

Tendo ironizado o escândalo de Trump, também Biden foi obrigado a engolir suas palavras, já que vários lotes de seus próprios documentos confidenciais foram encontrados em um antigo escritório (não governamental) e em sua atual garagem, onde evidentemente estavam de modo irregular.

Assim, quando foram recuperados documentos em posse do vice de Trump, Mike Pence, além de me proporcionar uma boa gargalhada, isso me deu um pouco de esperança estranha. Nossos partidos políticos parecem não concordar sobre praticamente nada hoje em dia, a não ser a palhaçada bipartidária do descuido de ambos com a segurança nacional. Viva!

É assim que todos os líderes americanos tratam nossos segredos? Será que o segredo de quem matou Kennedy está esquecido no vão debaixo da escada da casa de Obama? E a resposta sobre se existem extraterrestres ou não, está perdida naquele espaço poeirento e grudento em cima da geladeira de Bush? Será que há pedacinhos da declaração original da Independência presos entre os dentes de madeira de George Washington?

Parece que 1,3 milhão de pessoas nos EUA têm autorização para acessar documentos "altamente sigilosos". Não é tão "top secret" assim. Com cerca de 300 milhões de cidadãos no país, estatisticamente falando isso significa que, dos 500 alunos que se reuniam nas assembleias do meu colégio na adolescência, 2 tinham acesso a informação altamente sigilosa do governo.

Informações que agora só posso supor que fossem compostas em grande parte de arquivos explicando como fazer um som de peido com o sovaco. Outra coisa: especialistas dizem que a cada segundo três documentos são marcados como confidenciais. Como eles dizem que os homens pensam em sexo a cada sete segundos, de cada 21 documentos o último deve tratar de seios. Peitos secretos.

Quanto mal é feito em última análise por essa negligência arrogante e quanto disso se deve à burocracia inchada de um sistema idiota, explorado pelos dois lados para atacar o outro, conseguir mais influência e se mostrar como moralmente superior? Não tenho certeza quanto à resposta –ela é altamente sigilosa. Quem sabe a encontremos no sótão de Ronald Reagan.

Tradução de Clara Allain 

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