David Wiswell

Escritor, roteirista e comediante americano

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Descrição de chapéu Partido Republicano

Antes de enfrentar o rato do Trump, DeSantis terá de derrotar o ratinho Mickey

Guerra contra Disney fez governador da Flórida praticamente garantir indicação republicana para ex-presidente

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O governador da Flórida, Ron DeSantis, é considerado o principal rival de Donald Trump na disputa das primárias republicanas, mas, antes de enfrentar esse rato, ele primeiro precisará derrotar o ratinho Mickey.

Em uma escalada recente da guerra em curso em torno da legislação anti-LGBTQIA+ promulgada pelo governador, a Disney moveu uma ação contra DeSantis alegando que ele usou seu poder para retaliação.

O governador da Flórida, Ron DeSantis, acena após evento em Londres, na Inglaterra
O governador da Flórida, Ron DeSantis, acena após evento em Londres, na Inglaterra - Henry Nicholls - 28.abr.23/Reuters

Olhando para os dados de pesquisas, esse é um conto de fadas tipo "Alice no País das Maravilhas", porque se DeSantis pensa que atacar o amado parque temático infantil vai ajudá-lo, deve estar numa viagem de ácido. Com políticos de direita —de Bolsonaro a Putin— tendo sucesso com tais ataques, será que a surra que DeSantis está levando é de alguma maneira uma vitória da tolerância e também de Trump? Bem...

Era uma vez (no ano passado), numa terra onde laranjas crescem selvagens, ex-presidentes selvagens ficam cor de laranja e Bolsonaro passou meses escondido no que parecia a continuação de "Procurando Nemo", um governador malvado que aprovou uma lei batizada pela esquerda de "Não Diga Gay".

A lei limita a discussão ou o reconhecimento de temas ligados a pessoas LGBTQIA+ em escolas. Pode soar progressista em comparação com as diatribes antigays de Bolsonaro, mas foi recebida com temor pela comunidade LGBTQIA+ dos EUA, da qual muitos membros trabalham na Disney. Em meio à pressão de funcionários, a empresa emitiu uma nota contra a legislação e suspendeu doações políticas no Estado.

Furioso, DeSantis, que à época devia estar prendendo uma princesa numa torre congelada, contra-atacou, nomeando um conselho de aliados para ajudá-lo a revogar legalmente o (bizarro) status de autonomia que a Disney desfruta há muito tempo.

O status permitia à Disney ser seu próprio órgão de governo, com autonomia total em seu distrito, Reedy Creek. A empresa literalmente emite títulos de dívida e opera seu próprio transporte municipal. Por quê?

Ela arrecada muitos dólares para a Flórida. Segundo a Oxford, em 2019 a Disney teve um impacto econômico de US$ 75 bilhões (R$ 372 bilhões) sobre o estado. Se a companhia fosse um país, teria o 73º maior PIB no mundo. Ou seja, o pirata Jack Sparrow é mais rico que o Caribe inteiro.

DeSantis fez seu nome aproveitando as guerras culturais, em que políticos evitam se engajar em ações políticas que interessam ao bem público, em nome de atacar teatralmente alguém ou algo apontado como inimigo de sua base. Usando aquele velho truque político: o inimigo de meu inimigo é meu amigo.

Mas sua queda nas pesquisas de opinião parece indicar que muito poucos enxergam os personagens favoritos de seus filhos como inimigos. Mesmo republicanos "preocupados com a agenda gay" provavelmente se recordam de Peter Pan com afeto. Assim, em segredo, mesmo os homofóbicos podem achar "cool" ver um bando de meninos fazendo piruetas de calça legging.

Isso também revela uma grande hipocrisia em relação à sua base. DeSantis é um conservador pró-menos governo, pró-empresas, pró-livre expressão que vem usando seu cargo público de peso para se afirmar contra a liberdade de expressão de uma empresa. Como sua base é pró-armas de fogo, ele talvez tivesse resultados melhores se simplesmente desse um tiro na cara da mãe de Bambi.

Ainda pior para DeSantis foi que a Disney localizou acordos que anulam boa parte do poder dele sobre a empresa, levando-o a fazer ameaças de ações punitivas, como abrir um presídio ao lado dos parques.

Isso forçou a Disney a mover uma ação na Justiça, que o conselho de DeSantis está combatendo com uma ação contrária, encurralando o governador numa guerra impopular, depois de já ter perdido pontos nas pesquisas. Ele praticamente garantiu que a indicação presidencial republicana seja dada a Trump.

Embora seja uma perda enorme para as guerras culturais de direita, isso infelizmente só vem comprovar que é possível ganhar se você é uma corporação poderosa. É um pouco irônico que o criador da Disney, Walt Disney, tenha talvez sido apoiador de Hitler. Sendo menos progressista que a empresa de um nazista (supostamente! não me processem também!), é hora de DeSantis olhar fundo no espelho mágico e entender que, ironicamente, pode ser que ele só desperte desse sonho se... For beijado por um príncipe.

Tradução de Clara Allain 

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