Ian Bremmer

Fundador e presidente do Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, e colunista da revista Time.

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Batalha final em Idlib, na Síria, é alvo de interesse de potências

Exército de Assad, reforçado pela Rússia, deve atacar a província para derrubar últimos rebeldes

Protesto contra o governo de Bashar al-Assad na cidade de Idlib, na Síria
Protesto contra o governo de Bashar al-Assad na cidade de Idlib, na Síria - Zein al-Rifai - 28.set.18/AFP

A situação ainda é de calma no último reduto rebelde remanescente na Síria. O governo turco mediou um acordo que adia o dia do julgamento final, quando o exército de Bashar al-Assad, reforçado pela Rússia, vai atacar a província de Idlib para dizimar seus derradeiros defensores.

Essa trégua é boa notícia para os 2,9 milhões de homens, mulheres e crianças encurralados em situação de perigo iminente, mas não há garantia alguma de que ela vá durar. Isso vai depender de se diversos grupos rebeldes, que, juntos, têm dezenas de milhares de combatentes encurralados em Idlib, vão depor suas armas ou lutar até o amargo fim.

Se e quando começar o ataque do governo sírio a Idlib, será a última grande batalha da guerra civil síria, que já dura sete anos. A reconstrução em grande escala poderá começar quando os combates terminarem, mas esse conflito já matou ou deslocou metade das pessoas que viviam no país em 2011 e causou danos psicológicos irreversíveis àqueles que fugiram e aos muitos que ficaram.

O presidente Assad quer evitar um banho de sangue, se possível. As acusações de que ele teria utilizado armas químicas proibidas pelas leis internacionais, incluindo em ataques a civis sírios, já prejudicaram sua credibilidade de modo duradouro. Mas ele também quer começar a reconstruir o controle sobre seu país, e há razões claras para temer que sua paciência com os rebeldes tenha limites claros.

Assad está longe de ser a única parte interessada. Este conflito abriu a Síria a uma gama grande de atores e observadores externos que temem as repercussões dele para seus próprios interesses. Para entender esta guerra e o futuro da Síria, é importante enxergá-la desde várias perspectivas.

O Irã é o principal aliado regional da Síria. Seu governo, que comanda um país cercado por vizinhos árabes hostis e que sofre pressão econômica constante de Donald Trump, precisa que Assad esteja firme no controle da Síria. O Irã quer ver os grupos islâmicos, milícias rebeldes e outros inimigos de Assad esmagados, mas seus líderes também temem que sua influência sobre o futuro da Síria seja enfraquecida pela outra aliada que tem a confiança de Assad, a Rússia.

O presidente russo Vladimir Putin quer muito ampliar a influência de seu país no Oriente Médio, como meio de fortalecer o prestígio da Rússia no palco mundial e garantir que sua Marinha continue a ter acesso ao Mediterrâneo. Mas ele também tem consciência do mal que uma catástrofe humanitária em Idlib causaria a seus interesses. Putin gostaria de evitar uma batalha sangrenta que provocaria indignação ainda maior na Europa e dificultaria o levantamento de fundos para a reconstrução da Síria. Mas, como Assad e o Irã, ele está disposto a declarar vitória e encerrar esta guerra.

Ninguém fora da Síria está mais determinado a evitar uma batalha final e terminante em Idlib que o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan. A Turquia já abriga cerca de 3,5 milhões de sírios em acampamentos improvisados, uma solução que não é sustentável. Um ataque frontal do governo sírio a Idlib levaria mais um tsunami de civis desesperados a atravessar a fronteira turca vizinha. A economia turca já enfrenta problemas suficientes sem receber mais uma onda de refugiados.

Líderes europeus também estão observando a situação atentamente, especialmente os líderes de países que já abrigam grande número de migrantes sírios. Seja qual for sua opinião da selvageria de Assad, eles sabem que a reconstrução da Síria não poderá começar enquanto o ditador sírio não retomar o controle firme de seu país. Sabem que os sírios na Europa que podem se dispor a voltar a seu país não o farão enquanto não puderem retornar em segurança.

A administração Trump está atenta para se certificar de que Assad não volte a usar armas químicas. Há avisos dignos de crédito de Washington de que, se esse limite for atravessado novamente, poderá provocar represálias contra o exército de Assad, desta vez mais fortes.

Finalmente, a outra parte interessada é formada pelas Nações Unidas e outros organismos humanitários que querem ajudar os civis encurralados em Idlib. A esperança deles é que seja criado um corredor de retirada que permita ao maior número possível dessas pessoas partir em direção a áreas mais seguras antes do início de quaisquer combates.

Enquanto o impasse em torno de Idlib continua, esses são os interesses em jogo.

Tradução de Clara Allain

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