Igor Patrick

Jornalista, mestre em Estudos da China pela Academia Yenching (Universidade de Pequim) e em Assuntos Globais pela Universidade Tsinghua

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Descrição de chapéu China

Participação da China na Assembleia-Geral da ONU será histórica

Bandeiras teóricas pensadas por Xi Jinping serão postas à prova em reunião marcada por guerra, golpes e crise do clima

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Depois de praticamente ignorar o G20 em Nova Déli, a delegação chinesa chega a Nova York neste fim de semana também com uma equipe de menos prestígio. Ao contrário do que seus diplomatas sinalizaram por semanas, o chanceler Wang Yi não vai à Assembleia-Geral da ONU, e a missão chinesa será liderada pelo vice de Xi Jinping, Han Zheng.

Han Zheng, vice de Xi Jinping, após ser eleito para o cargo durante Congresso Nacional do Povo, reunião legislativa anual da China, em Pequim
Han Zheng, vice de Xi Jinping, após ser eleito para o cargo durante Congresso Nacional do Povo, reunião legislativa anual da China, em Pequim - Noel Celis - 10.mar.23/AFP

Han já ocupou cargos importantes na hierarquia do Partido Comunista. Foi prefeito de Xangai, membro do Comitê Permanente do Politburo ao longo do segundo mandato de Xi, vice-premiê e um dos responsáveis por coordenar politicamente a dura resposta da China continental aos protestos pró-democracia em Hong Kong. Sempre foi visto, porém, como um protegido do ex-líder Jiang Zemin e membro da facção do PC Chinês conhecida como "Gangue de Xangai".

Será, então, uma participação mais cerimonial que prática.

Han provavelmente não conta com as credenciais, o prestígio e o poder para negociar nada de substancial em nome da China. Sua presença em Nova York mais tem a ver com evitar que Wang Yi receba questionamentos constrangedores acerca da misteriosa remoção do então chanceler Qin Gang e do desaparecimento recente do ministro da Defesa, Li Shangfu, ambos supostamente envolvidos em casos de corrupção e falhas éticas.

Isso não significa, porém, que Pequim ignore a principal reunião do calendário da diplomacia mundial. A Assembleia-Geral da ONU ainda mantém o status de fórum para discutir questões globais prementes e acontece este ano num contexto de guerra na Europa, golpes de Estado na África, endividamento de países em desenvolvimento e a cada vez mais urgente agenda de reversão do aquecimento do planeta.

Vale a pena prestar a atenção em qual será o discurso acerca das três principais bandeiras teóricas da diplomacia chinesa atual: a Iniciativa de Desenvolvimento Global, a Iniciativa de Segurança Global e a Iniciativa de Civilização Global. Os conceitos, codificados em lei pela primeira vez em julho, baseiam-se em uma visão de Xi que deve nortear a forma como Pequim pensa o engajamento com o resto do mundo.

Destacam-se, entre outros temas, a defesa da soberania, da não ingerência em assuntos domésticos, da necessidade de financiamento de países ricos para ações de infraestrutura e resiliência climática em nações em desenvolvimento e da promoção de agendas como o combate à pobreza.

São bandeiras bonitas no papel, mas intencionalmente carentes de substância. Também trazem pontos problemáticos, como a noção de que direitos humanos não são pauta universal e devem estar submetidos aos interesses soberanos de cada país.

As três iniciativas são à primeira vista uma forma de solidificar alianças com o Sul Global e consolidam a China como a líder do mundo em desenvolvimento. É uma estratégia bem calculada para moldar agendas e amplificar a voz chinesa na ONU, articulando um bloco robusto que dê força às aspirações globais dos chineses. Não chega a ser surpresa que sejam recebidas pelo Ocidente como planos revisionistas da ordem global que, embora tenha trazido um período de histórica estabilidade e prosperidade para o mundo, notavelmente beneficiou muito mais os países ricos e desenvolvidos.

A Assembleia-Geral colocará esses conceitos à prova e testará a resposta de outros cantos do mundo à perspectiva chinesa. Junto com a expansão do Brics, o fortalecimento de bancos de desenvolvimento como o AIIB e o NDB e os acordos celebrados à égide da Iniciativa de Cinturão e Rota, ajudam a entender como a China jogará nos próximos anos ou décadas. Com ou sem Wang Yi, são importantes o suficiente para tornar a participação chinesa em 2023 histórica.

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