Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães
Descrição de chapéu Mercado imobiliário

Trabalho remoto e aluguéis caros esvaziam Nova York

Mais densa metrópole americana desperdiçou chance de planejar sua reinvenção

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Lembram-se da Grande Maçã, a "cidade que nunca dorme"? Pois é, essa metrópole descobriu o privilégio de acordar mais tarde e de dispensar o metrô para trabalhar. A pandemia de Covid, que revelou a viabilidade do trabalho remoto em toda parte, mostrou-se especialmente decisiva para a cidade cuja economia tem uma dependência insalubre do recolhimento de impostos do setor imobiliário.

O número de escritórios vazios em Nova York bateu recorde no primeiro trimestre de 2023, e a ocupação presencial média oscila em 50%. O otimismo com o relaxamento das restrições da pandemia, em 2022, logo tomou o chuveiro gelado da explosão no preço de aluguéis residenciais —a média é de US$ 4.495, ou R$ 22,8 mil— e da alta nos juros de financiamento da casa própria. Não há cenário cor-de-rosa pintado pelo lobby imobiliário —muy amigo do prefeito Eric Adams– capaz de passar batom neste porco.

Pedestres em frente a prédio com anúncio de disponibilidade para aluguel, em Nova York, no bairro do Harlem
Pedestres em frente a prédio com anúncio de disponibilidade para aluguel, em Nova York, no bairro do Harlem - Shannon Stapleton - 22.fev.23/Reuters

Adams acreditou que poderia reverter uma tendência global e declarou, imperioso, logo depois de tomar posse, em janeiro de 2022, que Nova York não podia ser gerida de casa: "Vocês não podem ficar de pijama o dia todo!", reclamou. Os nova-iorquinos votaram pelo pijama, e hoje a prefeitura não consegue preencher 25 mil vagas no serviço público municipal –algumas secretarias têm déficit de 20% da força de trabalho.

Adams admite um recuo na exigência de trabalho presencial em horário integral diante da concorrência do setor privado que, cada vez mais, se vê forçado a acomodar o trabalho remoto para atrair talentos.

Historicamente, pandemias resultaram em vantagens para trabalhadores sobreviventes. O declínio do feudalismo, na Idade Média, foi apressado pelo desaparecimento de quase metade da força de trabalho europeia com a peste bubônica. Pandemias também fomentam revoltas sociais, como se viu nas manifestações que ocorreram na esteira da morte de George Floyd, em pleno lockdown de 2020. No ano passado, o ritmo de filiação a sindicatos nos EUA aumentou em 57%.

O mercado de trabalho favorável e a escassez de empregados em setores como saúde e educação facilitaram o poder de barganha –o poder de trabalhar de pijama um ou dois dias úteis. "A sexta-feira no escritório morreu para sempre", disse um executivo da Vornado, empresa com o segundo maior portfólio de propriedades comerciais de Nova York. "E a segunda-feira não vai bem das pernas."

O plano de enfrentar a escassez de moradia com a conversão de prédios comerciais em residências e o estímulo ao uso misto de bairros, como acontece no Rio de Janeiro, enfrenta em Nova York complicações de custo e legislação. O governo do estado, não o da cidade, regula os códigos de construção.

Os sinais de revolução na cultura do trabalho eram claros com poucos meses de pandemia. Estima-se que Nova York perdeu até 300 mil dos 8,7 milhões de habitantes devido à Covid, mas a população voltou a crescer. A mais densa metrópole americana, e também a que tem o mais alto custo de vida, desperdiçou uma chance de planejar sua reinvenção.

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