Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Luciana Coelho
Descrição de chapéu Maratona

'Traição' quebra promessa, patina no absurdo e esgota a paciência do público

Série do roteirista de 'Ponte dos Espiões' é passatempo para maratona na Netflix, mas não é memorável nem no dia seguinte

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Imagine um agente secreto que esconde segredos. Que coisa estranha, não?

É com esse premissa cretina que começa "Traição", um suspense para o qual a Netflix reuniu um elenco de peso, contou com a assinatura de um roteirista premiado e escolheu um formato decente (cinco episódios de 40 minutos, uma minissérie).

Charlie Cox encostado em uma parede
Charlie Cox em cena de 'Traição', série da Netflix - Divulgação/Netflix

E, apesar da promessa, o que se desenrola na tela é um amontoado de clichês amarrados de forma canhestra, da espiã russa bonitona (Olga Kurylenko) que ressurge na vida do protagonista (Charlie Cox, de "Demolidor") ao chefe vilanesco com interesses espúrios (o veterano Ciarán Hinds, de "Belfast"), tudo é encampado.

Não falta nem a mulher que parece sonsa quando na verdade é praticamente uma ninja (Oona Chaplin) ou os filhos pré-adolescentes fadados a se meterem em confusão.

Até aí tudo bem, há obras que constroem sua graça justamente de reunir e subverter clichês, ou de explorá-los tão bem que o produto final, ainda que não leve grande mérito criativo, é muito divertido (saudades de "24 Horas").

Não espere nada disso aqui, sob pena de dormir no primeiro episódio. Caso o supere, os seguintes oferecem algumas cenas boas de ação e um passatempo razoável consumível em uma maratona, sem nada capaz de se prender à memória até o dia seguinte.

O que temos é a história do jovem agente Adam, que ascendeu ao posto de número dois da principal agência de espionagem internacional britânica, embora sua esposa inexplicavelmente se irrite com o fato de ele, à frente do serviço secreto, ter de interromper a rotina familiar em horários esdrúxulos.

Adam, sabemos logo, teve a carreira catapultada por Martin Angelis (Hinds), o chefe da agência que começa a série sofrendo uma tentativa de assassinato, e resguardado por informações fornecidas por Kara (Kurylenko), uma espiã russa desgarrada.

Estabelecidas essas relações, não há mais roteiro: elas se cruzam e descruzam a serviço de cenas de perseguição e momentos de suspense aniquilados por desfechos mirabolantes. Pessoas surgem, morrem ou mudam de caráter a esmo. Adam precisa sempre obter alguma coisa ou desmascarar alguém para proteger sua família, mas nunca fica claro o quê —trata-se apenas de pretextos para mais revelações randômicas.

É uma pena. Matt Charman, o criador da série, teve seu trabalho reconhecido em "Ponte dos Espiões", um filme na mesma temática que trazia o inefável Tom Hanks no papel principal.

Cox é um ator competente que caiu nas graças dos fãs do herói cego que viveu na série anterior, e Hinds coleciona performances memoráveis como a de Júlio César em "Roma" e a do chefe dos selvagens, Mance Rayder, em "Game of Thrones". Em "Traição", ambos estão no automático.

É difícil entender como uma produção que envolve tantos bons nomes pode dar tão errado. Uma sequência de clipes de situações de perseguição não fazem uma série, mas os roteiristas parecem não se importar com isso. Nem a plataforma, cuja escala mastodôntica de produção parece ter minado a qualidade de muitos de seus lançamentos.

A respeito do Globo de Ouro, que anunciou seus vencedores na terça e tenta emergir da irrevelevância após uma série de escândalos, houve escolhas acertadas nas categorias cômicas.

"Abbott Elementary", a premiada do ano, é a coisa mais esperta do gênero no ano que passou, e Quinta Brunson, sua roteirista e protagonista, merecia há tempos um troféu. Sim, "O Urso" é melhor, mas a produção errou ao inscrevê-la como comédia. E, ainda que não seja a preferida desta coluna, "The White Lotus" era o favorito entre as minisséries.

Já preterir "Ruptura", "Ozark" e "Better Call Saul" por "A Casa do Dragão", drama bacana mas muito menos engenhoso, é mais um exemplo do porquê de essa premiação não ser levada a sério.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.