"Ninguém é mais arrogante em relação às mulheres, mais agressivo ou desdenhoso do que o homem que duvida de sua virilidade". Simone de Beauvoir não só entrega a melhor introdução para este texto como um macete surpreendentemente simples para enfrentar o patriarcado: a consciência de que ele atua como um teatrinho de sombras, que confunde fragilidade e força o tempo todo.
É irônico que o assunto da coluna de hoje seja um movimento encampado por homens frustrados e acuados, conhecido como red pill. A pílula vermelha, uma referência ao filme "Matrix", remete ao momento em que o protagonista opta por despertar de uma falsa realidade, na qual só enxergava sombras e simulacros.
Os integrantes do movimento red pill acreditam que são capazes de encarar a realidade que ninguém ao seu redor consegue ver: o fato de que mulheres são manipuladoras e interesseiras por natureza e os avanços do movimento feminista são uma conspiração para oprimir o gênero masculino.
Perpetuado como um conhecimento moderno e privilegiadíssimo, o discurso é uma versão repaginada de postulados misóginos, como os escritos por Aristóteles nos anos 300 a.C., que buscavam legitimar a inferioridade biológica das mulheres e reduzi-las à única função de procriar.
O grupo é composto por homens jovens e ressentidos por rejeições afetivas e/ou sexuais, que sentem saudades do que não viveram: um tempo em que as mulheres eram submissas e exigiam menos de seus parceiros. Com a autoestima em frangalhos, compram misoginia com embalagem de autoajuda e acabam se vitimizando ainda mais, enquanto acusam as mulheres de vitimismo.
É tão absurdo que chega a ser engraçado. Recentemente, a atriz e roteirista Livia La Gatto publicou uma sátira hilária de falas constrangedoras do "coach de relacionamentos e masculinidade" Thiago Schutz. E, no sábado passado (25), o influenciador red pill foi denunciado pela humorista por ameaçá-la de morte, tentando coagi-la a deletar o conteúdo de suas redes.
Apesar de já ter declarado que não se deve generalizar os integrantes do red pill, Schutz escancara a realidade de um movimento articulado por um discurso de ódio que, além de patético, é criminoso.
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