Será revertido para a criação da nova sede do Instituto Itaú Cultural o dinheiro a ser arrecadado com a venda da "Aranha", da artista Louise Bourgeois (1911-2010), que esteve em exposição na sala de vidro do MAM de São Paulo, na histórica marquise do Ibirapuera, entre 1997 e 2018.
A notícia causou consternação em setores do meio artístico e cultural. Muitos questionaram o leilão, entre outros motivos, pela hipótese de que o valor a ser levantado na Sotheby’s (possivelmente, especula-se, perto de R$ 400 milhões) viesse a ser destinado à operação corrente do instituto, o que não faria sentido.
A obra pertence na realidade à Fundação Itaú, à qual estão conectados o Itaú Cultural e os braços institucionais das áreas educacional e social. Esses ramos de atuação não são ligados diretamente ao banco, mas mantidos pela fundação, entidade jurídica que conta para isso com um fundo específico.
O "endowment" gera recursos que asseguram um orçamento anual em torno de R$ 100 milhões para o Itaú Cultural e de aproximadamente R$ 200 milhões para as outras áreas. Comparações levantadas com a venda, em 2019, da pintura de Pollock pelo MAM-RJ precisam respeitar matizes e proporções.
Há tempos cogita-se a criação de uma nova sede para o Itaú Cultural. É um consenso que o atual edifício, na avenida Paulista, não reúne as condições adequadas de um espaço expositivo de excelência. O pé direito baixo e as dimensões relativamente acanhadas do prédio também já não suportam o projeto de expansão do instituto, que, além das artes plásticas, abriga estúdios, teatro e múltiplas atividades.
As alternativas, por ora, são duas. O plano A é a aquisição e a reforma de um edifício na própria avenida Paulista –de onde o Itaú Cultural não quer se mudar. A Paulista virou o "Museum Mile" de São Paulo, e depois de passarela do café e do mundo financeiro, representa hoje uma vocação de economia criativa e do conhecimento que aponta para o futuro da Pauliceia.
O Plano B é uma intervenção arquitetônica radical na atual sede, com o efeito colateral de uma interdição por alongado período de tempo.
A destinação do dinheiro provindo do leilão, que provavelmente não vai pagar todo o investimento na futura sede, não deixa de aplacar a frustrante despedida da obra, que se tornou um índice cosmopolita da cidade de São Paulo –e com diversificado apelo popular, dada sua localização que permitia a visão de fora do museu, no maior parque da cidade.
Infelizmente a "Aranha", uma das seis criadas pela artista francesa, já há algum tempo não estava mais ali onde nos habituamos a vê-la graças a uma negociação de Milu Vilella, acionista do Itaú e então presidente do MAM, com o comprador da escultura, o banqueiro Olavo Setúbal. Sem essa aranha, São Paulo perde. Com a nova sede, esperemos que ganhe, e que esse papo não vire qualquer coisa e vá até de manhã.
Marcos Augusto Gonçalves passa a assinar coluna quinzenal, às terças, na plataforma digital da Folha.
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