Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu seis Olimpíadas, Copa e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Descrição de chapéu tênis

Título de Raducanu no US Open reacende debate sobre imigração no Reino Unido

Tenista é exemplo da diversidade britânica? Depende do ponto de vista

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O feito da menina de 18 anos de idade que venceu o US Open e virou uma estrela é a história dos sonhos. Carismática e talentosa, Emma Raducanu foi a primeira britânica a levar um Grand Slam desde 1977.

Veio da fase qualificatória, saltou da 150ª para a 23ª posição do ranking mundial, tornou-se número um do país, foi capa de todos os jornais, ganhou parabéns das Spice Girls e da Rainha Elizabeth 2ª.

Jürgen Klopp, técnico do Liverpool, vai passar a ver mais o tênis feminino por causa dela. Mas tem um lado incômodo nesse conto de fadas: ela tem um passado que parte dos britânicos despreza.

Emma Raducanu celebra a conquista do US Open - Elsa - 11.set.21/AFP

Raducanu é imigrante. Nasceu no Canadá, filha de mãe chinesa e pai romeno. A família veio para a Inglaterra quando ela tinha dois anos de idade. Imigração e nacionalismo deram o tom na campanha do Brexit. Romenos que moravam no país foram acusados de tirar o emprego dos locais.

Até o ano passado, cidadãos do bloco —incluindo a Romênia— podiam viver e trabalhar livremente no Reino Unido. Como o divórcio com a União Europeia entrou em vigor em 1º de janeiro, a mudança dos pais dela não aconteceria hoje.

Por isso, muitos acharam irônico o primeiro-ministro Boris Johnson, que sempre foi a favor do Brexit, ter se desmanchado em elogios à tenista.

Antes da final do torneio, a foto de Raducanu na capa de um tablóide estava ao lado da notícia de que barcos com migrantes que tentassem entrar no país pelo Canal da Mancha seriam levados de volta para a França. Já Sadiq Khan, prefeito da capital inglesa e desafeto de Johnson, tuitou: “a história de Raducanu é a mesma de Londres [...] uma cidade onde celebra-se a diversidade".

No Reino Unido, política, esporte e nacionalismo se misturam o tempo todo. Antes dos Jogos Olímpicos de Londres de 2012, o Daily Mail cunhou o termo “britânicos de plástico” para se referir aos atletas da delegação que nasceram em outro país. Tiffany Porter, do atletismo, filha de mãe britânica e nascida nos Estados Unidos, foi uma das mais atacadas.

Em uma coletiva de imprensa, um repórter do jornal teve a deselegância de pedir que Porter cantasse "God Save The Queen." Ela se recusou.

Nas Olimpíadas, a tentativa de montar uma seleção de futebol com jogadores de Inglaterra, País de Gales, Escócia e Irlanda do Norte foi polêmica. O sucesso dos escoceses virou plataforma para políticos pedirem a independência do país.

É claro que o crédito da conquista no US Open precisa ser dado ao sistema esportivo britânico, dentro do qual Raducanu aprendeu a jogar e se desenvolveu. O Reino Unido investe pesado, leva o esporte a sério e colhe os frutos, mas o sucesso também vem da variedade de talentos.

Vários jogadores da Inglaterra finalistas da Eurocopa têm pais ou avós imigrantes. Ben Stokes, astro da seleção inglesa de críquete, nasceu na Nova Zelândia.

Raducanu parece ter orgulho das próprias origens. Suas contas nas redes sociais têm a descrição: "Londres/Toronto/Bucareste/Shenyang." Quando ganhou o US Open, agradeceu em mandarim o apoio dos chineses.

Novo fenômeno do esporte, a jovem ainda é notícia todos os dias no Reino Unido. Onde começou a jogar? O que gosta de usar? Vai se tornar bilionária? Ganhar mais títulos? Qual é o próximo?

Sem querer, também virou símbolo da tal diversidade britânica, rótulo que a maioria celebra, mas alguns ainda rejeitam. Desta vez, até os barulhentos defensores do Brexit se curvaram ao talento dela.

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