Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Mathias Alencastro
Descrição de chapéu Governo Trump

Estados Unidos vivem o seu junho de 2013

Eleições americanas serão divisor de águas para as democracias liberais

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A história do assassinato de George Floyd é o retrato da crise sanitária americana.

Afro-americano, natural da Carolina do Norte, Floyd fazia parte da categoria social mais exposta ao coronavírus. Vinte e três por cento das vítimas da Covid-19 são afro-americanas, embora eles representem apenas 13% da população.

Ele também fazia parte dos 40 milhões de norte-americanos expelidos para o desemprego nos últimos três meses.

Antes de ser sadicamente assassinado por um policial em Minneapolis, Floyd alegadamente tentava comprar alimentos com uma nota forjada de US$ 20.

Dias antes, o pai de uma menina de seis anos havia perdido o seu posto de segurança de boate.

O fim de semana deixou claro que esses protestos seriam diferentes. Os movimentos afro-americanos viram jovens de classe média, brancos e estudantes se juntarem espontaneamente às manifestações.

Numa escalada acelerada que lembra as jornadas de junho de 2013 no Brasil, o protesto contra a violência racial de Estado, um acontecimento tristemente banal na vida política norte-americana, evoluiu para uma insurreição contra a violência econômica do Estado em plena pandemia.

A violência tomou conta de cidades de todos os estados, litorâneas e rurais, abastadas e empobrecidas, confinadas e desconfinadas.

Outro fator determinante é a responsabilidade direta do presidente na explosão social. Assessorado por gurus dos movimentos supremacistas brancos, como Steve Bannon e Stephen Miller, Donald Trump dedicou grande parte do seu mandato ao acirramento das tensões raciais.

Em 2017, ele recusou-se a condenar a cerimônia de Charlottesville, um momento libertador para os movimentos racistas. Deste então, os discursos e a estética extremista invadiram as instituições e a esfera pública norte-americana.

Na sexta-feira, num momento de irresponsabilidade absoluta, que levou a uma censura do Twitter, Trump incentivou as forças policiais a atirarem contra os manifestantes.

Pela primeira vez na sua história moderna, os Estados Unidos entram em convulsão social com um pirômano na Casa Branca.

Os próximos dias devem definir o tom das eleições presidenciais de novembro. Maio de 2020 deve levar Joseph Biden a escolher uma afro-americana para formar a chapa presidencial, um feito inédito na história nacional.

Ele tem a vantagem de poder escolher entre duas lideranças com perfis distintos. Kamala Harris, senadora da Califórnia, é uma ex-procuradora conhecida por ser firme na lei. Stacey Abrams, da Geórgia, é uma excepcional oradora próxima ao movimento de Bernie Sanders.

Os últimos acontecimentos também devem obrigar Barack Obama, o último grande mediador da sociedade norte-americana, a atuar ainda mais intensamente.

Mas maio de 2020 também permitirá a Donald Trump reforçar a agenda de lei e ordem. O caos social tem o poder de legitimar os impulsos mais autoritários de um presidente disposto a violar todas as normas do pacto republicano para permanecer no poder.

Já não restam dúvidas de que as eleições americanas serão um divisor de águas para as democracias liberais.

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