Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Rumo a 2022

Ao festejar mil edições do seu programa, Huck expõe o roteiro de um candidato

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Se confirmar a sua candidatura presidencial em 2022, Luciano Huck estará seguindo um roteiro cujo ponto de partida é sempre idêntico: a tentativa de converter a popularidade alcançada na televisão ou no cinema em capital político.

Essa história já foi encenada no mundo todo por artistas, jornalistas, apresentadores, humoristas e participantes de realities. A ambição varia em cada caso, de vereador a presidente, assim como os resultados.

Huck festejou no penúltimo sábado (5) a milésima edição de seu programa na Globo, lançado em abril de 2000. O roteiro deste episódio dá pistas sobre as ambições do apresentador.

O Caldeirão do Huck número mil começou com um episódio do quadro X Mil, que estimula gentileza. O programa encena uma situação qualquer em um local público (um motorista com dificuldade para estacionar o carro numa vaga, por exemplo) e a primeira pessoa que se prontifica a ajudar é premiada com mil vezes o valor em moedas que estiver portando.

A tarefa era acordar um passageiro no trem (o próprio Huck disfarçado) que portava um cartaz pedindo para ser despertado em determinada estação. A vencedora, Isabel, tinha R$ 4,25 em moedas e ganhou R$ 4.250. “Não é uma fortuna, mas espero que ajude na reforma da casa”, disse o apresentador.

Em seguida, por 30 minutos, Huck apresentou um episódio do gameshow de perguntas e respostas Quem Quer Ser um Milionário, patrocinado por uma marca de produtos de limpeza. A candidata Luciana ficou pelo meio do caminho, mas faturou R$ 50 mil.

Ela disse que pretende usar o dinheiro em sua formação acadêmica. “Espero que você consiga chegar em Stanford e que você vire uma bela engenheira mecânica. E que você aplique o seu conhecimento no Brasil.”

Na sequência, veio um novo episódio do Lar Doce Lar. Trata-se de um dos quadros mais tradicionais, no qual Huck pratica assistencialismo elementar, com o apoio de patrocinadores, ajudando alguma
família a reformar a sua casa.

Por 60 minutos, o apresentador contou a história do pipoqueiro Pelé, de Lagoa da Prata (MG). O vendedor ambulante, disse Huck, foi selecionado em resposta a um abaixo-assinado que teve adesão de 
mais de 10% da população da cidade, de 65 mil habitantes.

A certa altura, Huck promoveu o encontro de Pelé com o youtuber AD Júnior, conhecido militante contra o racismo. Dirigindo-se ao pipoqueiro, o apresentador observou: “Duas coisas me chamaram muito a atenção na sua história. A primeira, de um homem que trabalha desde os seis anos e não conseguiu comprar porta nem privada para a casa”.

E acrescentou: “E a segunda, é a primeira vez que alguém chegou para mim e falou: ‘Então, meu avô era escravo aqui...’ E começa a me contar uma história sobre escravidão tão próxima e tão à flor da pele, de um jeitão tão coloquial e simples que eu falei: ‘Peraí! Preciso apertar um pouquinho essa história, preciso entender isso um pouquinho mais”’.

Na sequência, Huck fez a grande revelação do dia. “Quando eu conto uma história de alguém, como é o seu caso, pra mim tanto faz a cor, eu não enxergo a cor. Aí o AD falou pra mim: ‘Você tem que enxergar a cor’. E aí ele me explicou por quê. E eu mudei a minha opinião. Obrigado.”

No encerramento, ao fazer um balanço das mil edições, Huck recorreu ao plural majestático para festejar “a oportunidade de conhecer um outro Brasil, um Brasil profundo, um Brasil bem diferente daquele que a gente conhecia”.

E encerrou dizendo: “Nossa vocação é divertir, é emocionar, mas é, principalmente, inspirar, usar o alcance da TV aberta no Brasil para inspirar as pessoas”. Mais candidato, impossível.

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