Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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'Votaria em qualquer candidato para trocar esse presidente', diz Dira Paes

A atriz paraense, que se despediu da personagem Filó, de 'Pantanal', há três semanas, tem filme novo na Globoplay, outro recém-filmado em sua terra natal e um terceiro, sua estreia na direção, em fase de finalização. Nos últimos dias, foi para as ruas de megafone e camiseta vermelha pedir votos para Lula, apesar de não ser petista

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 A atriz Dira Paes em ensaio fotográfico

A atriz Dira Paes em ensaio fotográfico Leo Aversa/Divulgação

"Pessoas como eu, que têm visibilidade, não podem falar só de assuntos fúteis ou só fazer autopromoção. A gente precisa emprestar a voz, a imagem e o tempo para defender quem não tem as necessidades básicas atendidas. Quem tem fome não consegue nem pensar", diz Dira Paes à coluna em uma conversa por Zoom de seu apartamento, no Leblon, no Rio, de frente a uma janela enorme que dá vista para o mar.

A atriz age de acordo com suas convicções há muito tempo. E, nessa reta final da eleição presidencial, foi às ruas, de megafone na mão, camiseta vermelha com a imagem de Lula no peito e até uma tiara com a estrela do PT na cabeça. Sentada em um barril redondo, explicava às pessoas o que são os direitos humanos, por que isso importa, e, por fim, por que votar no candidato petista é a escolha dela.

"A gente vive num momento emergencial, em que trocar o presidente da República é uma questão de sobrevivência", afirma. "E, nesse momento, Lula é a nossa melhor saída. Eu votaria em qualquer outro candidato para mudar esse presidente. Eu não gosto de dizer o nome dele porque não quero dar Ibope para essa pessoa. Nem por um segundo".

"O Brasil precisa poder voltar a ter uma certa humanidade", continua. "A gente ainda vai conviver por muito tempo com os resultados das atitudes desse governo, que parecem tomadas de caso pensado para atropelar as pessoas".

Dira é uma das fundadoras da ONG Movimento Humanos Direitos, fundada em 2003 por um grupo de artistas, intelectuais, professores e advogados que se organizaram para lutar contra problemas sistêmicos da sociedade brasileira, como o trabalho escravo e a exploração sexual de crianças e adolescentes.

Já foi às ruas dezenas de vezes para defender suas causas e se considera uma vigilante dos direitos humanos. "Faço com o maior orgulho, me faz sentir útil e acho que isso se traduz até em beleza, é como se viesse para a pele da gente essa certeza de que você está do lado de quem precisa, de que você está agindo de acordo com o que acredita".

Ela não critica quem opta por fazer ativismo pela internet, distribuindo abaixo-assinados pelas redes sociais ou postando fotos e vídeos. "Mas não dá para esquecer que as pessoas têm um cheiro, um olhar, que passam frio, tomam chuva, andam de ônibus lotado. Para mim, ir de encontro a elas é essencial, me faz sentir cidadã."

 A atriz Dira Paes em ensaio fotográfico
A atriz Dira Paes em ensaio fotográfico - Leo Aversa/Divulgação

Dira só não consegue entender os colegas que apoiam o atual governo. "É muito difícil para mim ver pessoas de quem eu gosto ou admiro defendendo esse homem. Como se fosse possível defendê-lo de alguma maneira. Acho que essas pessoas vão acordar um dia", desabafa, sem dizer nomes.

A atriz interpretou a ex-prostituta Filó, na novela "Pantanal", que vira mulher do fazendeiro Zé Leôncio, personagem de Marcos Palmeira, e, no fim da trama, acaba como a herdeira das terras dele. Mas, durante grande parte dos 170 capítulos da trama, Filó aparecia na cozinha. "Quando eu aceitei o papel não tinha me dado conta do tanto que eu ia fazer cenas naquela cozinha. Ela deve ter sido a personagem que menos se deslocou fisicamente, era um grande desafio para mim. Tinha que ficar inventando coisa para fazer", conta.

"Acho que a novela deixou de herança para as mulheres que se identificaram com a Filó que existe uma nobreza em algum lugar na alma de quem gere uma família. Quem tem uma Filó em casa é agradecido a essa presença, porque ela provê o conforto", afirmou Dira. "Mas claro que ela era uma mulher subjugada a um mundo machista, muito machista, como é o nosso".

Assim que terminaram as gravações, Dira foi direto para Belém, sua cidade natal, onde filmou o longa-metragem "Manas", dirigido por Marianna Brennand. O filme conta a história da adolescente Marcielle, filha de uma família pobre de um vilarejo na ilha do Marajó, no Pará. Sua mãe quer que ela vá trabalhar como prostituta nas balsas que ligam Manaus a Belém para ajudar nas despesas da casa. O pai é contra, mas sua motivação é mil vezes mais perversa do que paternal.

A personagem de Dira, baseada em uma pessoa que existe de verdade, assim como o pano de fundo da trama central, é uma delegada que provê algum amparo a essas garotas da balsa e, investigando a história de Marcielle, acaba deflagrando uma rede de prostituição infantil.

"Acho muito poético quando uma obra de arte trata de um tema tão difícil de traduzir em palavras. Pode ser um filme, um livro, uma fotografia, um poema. Essa também é uma função da arte", afirma Dira.

As filmagens de "Manas" foram encerradas no último dia 22, e ele deve levar alguns meses ainda para ficar pronto. A previsão é que seja um lançamento do segundo semestre do ano que vem.

Mas Dira tem outro filme prontinho e disponível para streaming na Globoplay. É "Pureza", que conta a história real e comovente de uma mulher chamada Pureza, personagem que ela interpreta.

Nos anos 1990, depois de um mês sem notícias do filho caçula, que foi embora de casa, no interior do Maranhão, para trabalhar no garimpo, na Amazônia, ela decide ir atrás do menino. Com a roupa do corpo e uma bolsa, Pureza deixou a olaria de que cuidava para trás e passou três anos em busca do filho.

Trabalhando como cozinheira em fazendas de gado no sul do Pará, Pureza tomou conhecimento da maneira cruel e covarde como os fazendeiros tratavam seus empregados. Com os documentos confiscados, os trabalhadores acabavam em dívida com seus patrões, que cobravam deles o transporte, o alimento, as roupas e até os remédios.

Pureza conquistou a confiança de seus colegas e fez fotos de tudo o que viu. No processo, acabou sendo a primeira pessoa a fazer imagens do trabalho análogo à escravidão no Brasil.

"Ela é uma heroína brasileira", afirma a atriz. "Me senti convocada a fazer esse papel e tenho recebido muito carinho por conta dele. Não é todo filme brasileiro que tem esse alcance, mas eu tenho uma sorte danada e alguém sempre faz um comentário dos filmes que eu faço. Mesmo os que pouca gente viu. É lindo isso".

O próximo desafio de Dira Paes é passar para o lado de trás das câmeras. Na verdade, seu trabalho de estreia na direção já está concluído. Agora, o filme "Passárgada", que fez junto com o marido, o diretor de arte Pablo Baião, de "Tropa de Elite" e "On the Road", está em processo de finalização, e deve ficar pronto, pronto, mesmo, no começo do ano que vem.

Dira atua e dirige, e prefere guardar surpresa a respeito do resto do elenco. Mas dá um spoiler. "Tem um cara no filme, o Wilson Gonçalves, o Cissa, que interpreta ele mesmo e é maravilhoso, absolutamente cinematográfico", afirma.

"A câmera elege as pessoas que se destacam, a cinegenia é uma coisa real", afirma a atriz, referindo-se à qualidade do que fica bem no cinema. É como a fotogenia, mas para a tela grande e em movimento.

E essa qualidade ela sabe que tem, de sobra, desde sua estreia no cinema, aos 15 anos de idade. Cinegenia e telegenia, termo que se refere a quem se sai bem na tela da TV. Dira é contratada da TV Globo há 18 anos. "Eu cheguei na televisão depois de 20 anos de cinema", diz.

Sua estreia no cinema foi em grande estilo, no filme americano "Floresta das Esmeraldas" (1985), dirigido por John Boorman. Aos 15 anos, sem nenhuma formação como atriz, Dira passou em um teste com mais de 400 meninas para interpretar a indígena Kachiri, a mocinha da história.

"Foi uma experiência cinderelesca. Eu era uma garota e tive um supercontrato que me deu muita independência financeira. Fui tratada como uma rainha. Eu e minha mãe, que me acompanhou, ficamos um mês e meio hospedadas no (hotel) Copacabana Palace", lembra.

"E o cinema me embalou durante os últimos 38 anos, que eu nem vi passar. Parece que passei minha vida toda no set e agora estou aqui", brinca a atriz, que sai de férias no próximo dia 1º, "para dar uma trégua nos personagens e ser a Dira um pouco".

"A gente tem que ficar atento para perceber essas boas ondas na vida, e essa minha foi uma boa onda para surfar", conclui. "Agora, meu coração me diz que a população brasileira quer mudanças profundas. E elas virão por meio de um governo democrático, não por um governo tirânico. Estou muito confiante".

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