Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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Descrição de chapéu Folhajus

Justiça condena homem que escalpelou mulher por danos existenciais e a indenização de R$ 105 mil

Defensoria Pública de SP sustentou que projeto de vida foi danificado após episódio violento; ainda cabe recurso

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A comarca de São José dos Campos do Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu que uma mulher teve seu projeto de vida danificado após ser agredida por um ex-companheiro, que agora terá de indenizá-la em R$ 105 mil. A decisão, que aplica a chamada teoria do dano existencial a um caso de violência doméstica, é apontada como inédita pela Defensoria Pública paulista, que atuou no caso.

O episódio ocorreu em 2016. Naquele ano, ela suspeitou estar grávida, e ele sugeriu um aborto. Após a negativa, o homem chamou sua então companheira para uma festa, mas, no caminho para o evento, fez com que descesse do carro e desferiu inúmeros golpes contra ela —os primeiros deles, usando uma barra de ferro.

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Sala do júri do Tribunal de Justiça de São Paulo, no prédio do Palácio da Justiça, no centro da capital - Eduardo Knapp - 11.out.2019/Folhapress

Abandonada, ela só foi encontrada e socorrida na manhã do dia seguinte. Segundo consta nos autos, o homem pisoteou sua cabeça por diversas vezes enquanto a ameaçava de morte. Uma perícia apontou que ela teve suas costelas quebradas, foi escalpelada a ponto de ossos de seu crânio ficarem expostos e apresentou um inchaço generalizado em toda a região da cabeça e do tronco após as agressões.

Durante o atendimento, também foi constatado que ela nem sequer estava grávida.

Por meio da Defensoria Pública de São Paulo, a mulher foi à Justiça cobrar uma indenização por danos estéticos, morais, materiais e existenciais do ex-companheiro, que foi condenado a mais de 17 anos de prisão, em regime fechado, por tentativa de assassinato.

Ela apresentou despesas médico-hospitalares e outros gastos decorrentes dos tratamentos dos quais precisou após o episódio e apontou cirurgias reparadoras que ainda terá de fazer por causa da fratura no crânio. Danos psicológicos e sociais gerados pela agressão foram apontados.

"[A vítima foi submetida] aos danos existenciais, vez que não apenas perdeu a perspectiva de sua vida presente, pois as agressões foram bastantes a lhe fazer perder o sentido da própria vida, mas ainda lhe foi retirada qualquer perspectiva futura a curto e médio prazo, pois suas lesões cranianas lhe são impeditivos ao convívio social e interpessoal saudáveis", afirma a juíza Márcia Faria Mathey Loureiro em sua decisão.

De acordo com a magistrada, o dano existencial é imaterial e atinge a qualidade de vida de um indivíduo, causando dificuldades ou impossibilitando a realização de atividades cotidianas no âmbito social, pessoal e profissional.

"O dano existencial se consubstancia pela lesão a direitos que ferem a própria existência da pessoa, ou seja, a própria dignidade da pessoa humana, gerando assim o que se define como 'vazio existencial'", afirma Loureiro.

Ao contestar o pedido de indenização, a defesa do homem afirmou que não havia comprovação dos danos materiais, estéticos ou mesmo de abalo psicológico, sugerindo "se tratar de mero aborrecimento" por parte da vítima.

Para a juíza, no entanto, "restou clara" a responsabilização cível do agressor. "As lesões causadas pelo requerido foram extensas e, por que não, brutais", diz na decisão.

"O dissabor experimentado pela requerente, segundo a narrativa da ação penal, foi a humilhação ao se ver espancada, arrastada e pisoteada quase às raias da morte, tendo sido abandonada em via pública por volta das 21h30, ali permanecendo por uma noite inteira até ser encontrada por popular que a socorreu e chamou pelo serviço de emergência aos primeiros raios do amanhecer, às 5h30 do dia seguinte", destaca a magistrada.

O defensor público Júlio Camargo de Azevedo, responsável pelo caso, afirma que o ordenamento jurídico brasileiro garante proteção à vida, à saúde, à capacidade laboral, à personalidade e ao projeto existencial de vida. E que, no caso da mulher violentada, todos esses direitos foram "fartamente violados".

"Ele frustrou o projeto de vida e o livre desenvolvimento de sua personalidade. A tentativa de homicídio causou-lhe sérias lesões da esfera existencial e prejudicou a expectativa de uma vida longa digna, sem violência e traumas. Dificilmente, portanto, conseguirá confiar e relacionar-se afetivamente com outras pessoas", diz.

"O seu cotidiano desenvolve-se em função de cirurgias, tratamentos médico-hospitalares, atendimentos psiquiátricos visando a reabilitação da saúde e, em função da busca de reparação e justiça por meio de longo processo legal. Portanto, é manifesto que a crueldade dele transformou integralmente o seu projeto de vida", afirma ainda.

O agressor foi condenado pela comarca de São José dos Campos do Tribunal de Justiça paulista a pagar R$ 50 mil por danos existenciais, R$ 25 mil por danos estéticos, R$ 25 mil por danos morais e R$ 5.000 por danos materiais. Ainda cabe recurso.

À MESA

O cardiologista Roberto Kalil Filho participou do jantar beneficente da Sociedade Brasileira de Trombose e Hemostasia, na semana passada, no Hotel Rosewood, na capital paulista. A modelo Isabella Fiorentino e a apresentadora Eliana prestigiaram o evento. A empresária Flora Gil e a publicitária Bia Aydar também passaram por lá.

com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH

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