A AGU (Advocacia-Geral da União) apresentou nesta quinta-feira (5) uma ação judicial contra o Telegram em que reivindica a remoção definitiva de grupos que vendem passaportes de vacinação fraudulentos.
O órgão ainda pede que a rede social seja obrigada a informar os dados pessoais de administradores, gestores e vendedores de cerca de cem canais que estariam envolvidos na atividade criminosa.
A medida ocorre após uma reportagem da organização Aos Fatos revelar a existência de grupos que inserem dados falsos de imunização junto ao sistema do SUS (Sistema de Saúde Único).
O serviço, usualmente contratado por pessoas que se recusam a se vacinar, tem como objetivo burlar a fiscalização de empregadores, escolas e até mesmo de ligas esportivas que exigem o comprovante vacinal, diz a AGU, comandada por Jorge Messias.
Na ação apresentada junto à Seção Judiciária da Justiça Federal no Amazonas, o órgão cita o caso de um grupo que promete o registro imediato de vacinas listadas no Programa Nacional de Imunização (PNI) junto ao sistema ConecteSUS, exigindo o pagamento apenas após a confirmação da operação. Em outro canal, foram identificados comentários elogiosos sobre os serviços prestados por um dos usuários.
A AGU pontua que os grupos não apenas são usados para a prática de ilícitos, como também para a disseminação de desinformação e de "curas milagrosas" que se enquadrariam nos crimes de curandeirismo e charlatanismo.
Um do canais, por exemplo, indica substâncias que compõem a água sanitária para que a pessoa possa se "desintoxicar" após ser vacinada, dispondo até mesmo de um site para a sua venda.
"Infelizmente, os ilícitos praticados por meio do Telegram frequentemente deixam de receber a adequada atenção daquela empresa, que, salvo exceções pontuais, aparentemente tolera toda sorte de uso para o serviço por ela disponibilizado, a pretexto de proteção à liberdade de expressão", diz a AGU na ação.
A prática do crime de estelionato também é aventada. De acordo com o órgão, ao propagar informações falsas e conspiratórias, os canais instigam seus inscritos a não se vacinarem e a adquirir produtos e serviços específicos, apresentados de forma criminosa como uma alternativa à imunização.
"O caminho natural para a apuração destes ilícitos é a obtenção dos dados dos referidos usuários junto ao Telegram, já que são praticados ali, e naturalmente a empresa é detentora destas informações", afirma.
O órgão pondera, no entanto, que a rede social tem "uma estruturação abusiva" e o costume de dificultar o cumprimento de ordens judiciais, citando ocasiões em que o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes ameaçou tirar o Telegram do ar no Brasil para que decisões fossem acatadas.
"A empresa comemora nunca ter fornecido nenhuma informação, jamais, a qualquer governo no mundo: 'Até hoje, divulgamos 0 bytes de dados de usuários para terceiros, incluindo governos'", diz a AGU. "De maneira pública e notória, trata com descaso os órgãos do poder Judiciário brasileiro."
A AGU afirma que a teia de desinformação criada na rede social tem sido usada para causar prejuízos à política de imunização vacinal conduzida pela União, o que implica na queda da taxa de cobertura vacinal no país e pode provocar o retorno de doenças que até pouco tempo eram consideradas erradicadas.
"Não apenas a União passa a ter de redobrar os seus esforços para alcançar a população faltante, como também precisa investir em campanhas de informação para combater as percepções falsas difundidas sobre a nocividade das vacinas", diz, citando ainda os custos causados ao SUS com o tratamento de doenças que podem ser evitadas.
Na peça, a AGU afirma ter escolhido a Justiça Federal no Amazonas para apresentar a ação contra o Telegram por causa do simbolismo da cidade de Manaus em relação aos danos causados por iniciativas antivacina. Em 2021, durante a pandemia de Covid-19, a capital enfrentou uma crise de oxigênio sem precedentes.
"Os registros concernentes aos anos de 2019 a 2023 revelam uma diminuição vertiginosa da taxa no Brasil, que na região Norte se apresenta no pior nível do país: 45,01% da população daquela região, apenas, é alcançada pela cobertura vacinal", afirma o órgão.
A ação é assinada pelos advogados da União Raimundo Rômulo Monte da Silva, Priscilla Rolim de Almeida, Natália Ribeiro Machado Vilar e Marcelo Eugênio Feitosa Almeida.
com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH
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