A família do jornalista Luiz Eduardo Merlino afirma ter recebido com indignação a decisão da 4ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) de rejeitar uma ação de danos morais contra o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra em razão de tortura.
Merlino foi torturado e morto no DOI-Codi do 2º Exército, em São Paulo, um dos órgãos atuantes na repressão política na ditadura militar (1964-1985). Na época, o centro era comandado por Ustra.
Os herdeiros de Merlino afirmam que vão recorrer "até a última instância".
"É muito revoltante. Mas nós não vamos desistir. Vamos continuar lutando até que a justiça seja feita", diz Tatiana Merlino, sobrinha do jornalista.
A maioria dos ministros seguiu o voto da ministra Isabel Gallotti, que entendeu que o caso está prescrito. Além disso, ela diz que a ação deveria ter sido ajuizada contra o Estado, e não a um agente da repressão. Foram 3 votos a 2 contra o pedido de indenização por danos morais.
A defesa dos familiares do jornalista argumenta que já existe jurisdição no direito internacional de que crimes de lesa humanidade como a tortura, o desaparecimento forçado e as execuções sumárias são imprescritíveis.
Esse foi o mesmo entendimento do ministro Marco Buzzi, relator da matéria, que foi acompanhado pelo ministro Antonio Carlos Ferreira.
"Como vamos fortalecer a nossa democracia se não conseguimos nem responsabilizar os agentes da ditadura?", questiona Tatiana. "Essa decisão nos entristece, mas não tira a nossa força", acrescenta.
A ação foi apresentada em 2010 por Regina Merlino e Angela Mendes de Almeida, irmã e companheira de Merlino, respectivamente. Em primeira instância, Ustra foi condenado a pagar uma indenização de R$ 50 mil por danos morais a cada uma delas. Mas, em 2018, o Tribunal de Justiça de São Paulo reverteu a decisão.
Elas recorreram ao STJ, que começou a julgar o processo em agosto.
A defesa dos herdeiros de Merlino afirma que a responsabilidade de Ustra se deve não só por ter sido comandante do DOI-Codi, mas porque o militar teria participado pessoalmente das sessões de tortura contra o jornalista. Nos autos, a defesa do militar negou a autoria das torturas.
A versão oficial do Exército diz que o jornalista teria cometido suicídio durante translado para o Rio Grande do Sul, quando teria se jogado na frente de um veículo na rodovia.
Em julho, os familiares de Merlino enviaram uma carta à Comissão Interamericana de Direitos Humanos pedindo que o órgão internacional monitorasse o julgamento do caso.
"É evidente que o projeto de vida das mulheres da família Merlino foi modificado para sempre pelas violações perpetradas por agentes estatais da ditadura, especialmente por Carlos Alberto Brilhante Ustra, e que o sofrimento se perpetua diante da ausência de respostas oficiais e do prolongamento excessivo de um processo judicial que já dura 13 anos", dizia um trecho do documento.
"Essa luta começou com a minha avó, que entrou com uma primeira representação judicial em 1979. Ela já morreu, e agora segue comigo, com a minha mãe [Regina], que tem 79 anos, e com a minha tia [Angela], de 84 anos", diz Tatiana.
Ustra morreu em 2015. Em caso de condenação, seu espólio responderá pelo pagamento às familiares da vítima.
com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH
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