O bilionário Elon Musk, dono do X (ex-Twitter), se reuniu virtualmente com representantes do governo brasileiro em janeiro de 2023.
A conversa ocorreu dias depois de golpistas invadirem as sedes do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 8 de janeiro para tentar derrubar Lula (PT) da Presidência da República.
O governo pressionava o Twitter a cumprir os protocolos da própria rede para a remoção de conteúdo que ameaça, glorifica e incita a violência.
As postagens elencadas pelo Ministério da Justiça eram claramente golpistas. Uma delas dizia: "Agora é guerra. Vamos ocupar o Palácio do Planalto, o STF e o Congresso! Intervenção militar!". No vídeo postado junto ao texto um homem afirmava que os manifestantes já tinham rompido o cordão de isolamento da Praça dos Três Poderes e incitava: "Vamo pra guerra, porra".
Musk apareceu de surpresa na reunião, realizada por Zoom e da qual participaram outros executivos do Twitter espalhados pelo mundo, já que não havia representante da empresa no Brasil. Musk, por exemplo, estava nos EUA. Um de seus executivos estava no México.
A advogada Estela Aranha, que assumiria a Secretaria de Direitos Digitais do Ministério da Justiça naquele mês, participou do encontro, que foi relatado em setembro pela Folha.
Ela se recorda que Musk falou mal do ministro do STF Alexandre de Moraes, disse que o Twitter, antes de ser adquirido por ele, favorecia a esquerda nas eleições brasileiras, prometeu evitar a disseminação de discursos de ódio, forneceu seu e-mail direto —mas nada fez de concreto além de bater aquele papo com os brasileiros.
"Me lembro bem que o Musk criticou as decisões do Alexandre de Moraes", diz ela, referindo-se ao ministro do STF.
A advogada, que já deixou o governo, afirma ainda que, na reunião, "Musk deu a entender que algo seria feito em relação aos conteúdos que incentivavam a violência. Mas nada foi feito".
A impressão que dava, diz ela, era a de que o bilionário entrou de surpresa na reunião virtual apenas para tentar esfriar a fervura. "Algo como 'vou dar atenção e solucionar esse problema', como se simplesmente nos dar atenção em uma conversa fosse resolver as coisas", segue Estela Aranha.
Ao ouvir dos representantes brasileiros que era necessário seguir a mesma moderação de conteúdo que o Twitter adotara na invasão do Capitólio, nos EUA, em 2021, o bilionário, segundo ela, respondia com afirmações como "sim, claro", "não vai acontecer de novo".
"Mas não sentimos firmeza", diz Estela.
"Insistimos que os conteúdos eram ilegais, que desrespeitavam a lei brasileira e os próprios termos de uso do Twitter", afirma a advogada.
Além dela, participaram da reunião assessores da Presidência da República e integrantes da Secretaria de Comunicação (Secom).
Musk afirmou a todos que poderiam acioná-lo diretamente em caso de novas queixas. E forneceu seu email pessoal. "Nunca ninguém mandou mensagem para o email dele. Ninguém botou fé ou ficou seduzido, achando que ele resolveria alguma coisa. Seguimos nos comunicando com o Twitter pelos canais institucionais", relembra Estela.
Mas nada disso funcionou. Apenas as decisões judiciais de Alexandre de Moraes, que determinou que Facebook, TikTok e Twitter deveriam bloquear uma série de canais, perfis e contas golpistas, foram, até hoje, obedecidas.
com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH
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