Em reunião nesta sexta-feira (17), membros da Câmara Técnica do Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde exigiram mudança de posição e retratação da pasta em relação à suspensão da orientação sobre vacinar adolescentes de 12 a 17 anos contra a Covid-19.
Eles querem que a pasta diga publicamente que a câmara não foi consultada na decisão pela suspensão e que se comprometa a retomar a recomendação da vacinação dos adolescentes.
Caso não ocorra, eles disseram que pretendem entregar suas posições na câmara. O pleito teve apoio unânime entre os participantes da reunião.
O grupo é composto por professores, especialistas, representantes de sociedades de classe e conselhos de secretários estaduais e municipais de Saúde (como Conass e Conasems), e é responsável por subsidiar tecnicamente o ministério em suas decisões.
Se o ministério vai tomar decisões sem consultá-los, afirmaram, não faz sentido manter seus nomes associados às medidas tomadas pela pasta.
O ministério foi representado no encontro por Rosana Leite de Melo, secretária extraordinária de enfrentamento à Covid-19, que disse que levaria os recados ao ministro Marcelo Queiroga.
Segundo relatos dos presentes, o encontro foi tomado pelas críticas dos membros da câmara técnica, que Queiroga ignorou ao decidir pela suspensão. Em entrevistas, ele tem dito que o órgão é consultivo e que não tem a obrigação de ouvi-lo.
A perfomance de Queiroga ao longo do episódio foi descrita como desastrosa. O ministério foi criticado por suspender a vacinação devido à morte de uma adolescente que, ao que tudo indica, não teve qualquer relação com a imunização, por surpreender a câmara técnica com a publicação da nota sobre o tema e por gerar mensagens equivocadas e danosas à população em relação à eficácia da vacinação.
Publicada na noite da quarta-feira (15), a nota técnica que trata da suspensão da vacinação destaca que o ministério é subsidiado pela câmara, o que causou grande incômodo de seus membros, que enfatizaram que querem que Queiroga deixe claro que não foram consultados para tomar a medida considerada trágica.
Esses especialistas apontaram ainda que a nota técnica está repleta de erros técnicos. Ela diz que a OMS (Organização Mundial da Saúde) não recomenda a imunização de criança ou adolescente e que os benefícios da vacinação em adolescentes sem comorbidades ainda não estão claramente definidos, ambas afirmações que não correspondem à realidade, por exemplo.
A OMS diz que a vacinação de adolescentes não está no topo das prioridades, mas que todos devem se vacinar quando há disponibilidade de vacinas. A aprovação pela Anvisa da vacina da Pfizer para uso em adolescentes no Brasil fundamentou-se em estudo com 1.972 indivíduos, que apontou eficácia de 100% da vacina.
Um dos líderes de grupo com lugar na câmara técnica compara a atitude de Queiroga às falas antidemocráticas de Jair Bolsonaro por ocasião do 7 de Setembro, classificando-a como um golpe no Plano Nacional de Imunizações e uma intentona antivacina.
Nesse sentido, portanto, o ministro agora está sendo cobrado para dar a sua "Declaração à Nação" como a do presidente, ou seja, deve sinalizar que reconhece que errou ao recomendar a suspensão da vacinação e mostrar que pretende redirecionar sua conduta.
Como mostrou a Folha, Queiroga decidiu pela publicação da nota técnica após pressão de Bolsonaro e de seus aliados. O ministro nega.
Integrantes do governo e gestores do SUS que acompanharam o recuo dizem que a vontade do presidente pesou, mas também citam como decisivo o temor da Saúde de que faltem vacinas.
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