Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Negacionistas das eleições também são negacionistas da economia

Lideranças da Câmara dos Deputados dos EUA pelos próximos dois anos acreditam em várias coisas falsas

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The New York Times

As pessoas que vão liderar a Câmara dos Deputados dos Estados Unidos nos próximos dois anos –um grupo que, pelo que se sabe, não inclui Kevin McCarthy, que parece ser o presidente apenas no nome– acreditam em várias coisas falsas.

Muitas, talvez a maioria, acreditam que a eleição de 2020 foi roubada, ou pelo menos que Joe Biden de alguma forma não é o presidente legítimo.

Muitas acreditam que as vacinas contra a Covid fazem mais mal do que bem, uma crença que contribuiu para milhares de mortes a mais entre os partidários republicanos.

O presidente eleito da Câmara dos EUA, Kevin McCarthy, sorri com o martelo que simboliza o cargo - Evelyn Hockstein/Reuters

Muitas assinam embaixo, ou pelo menos são simpáticas às crenças do culto QAnon, que afirma que o mundo é governado por uma vasta conspiração de pedófilos.

E quase todas elas, até onde posso dizer, acreditam que a economia dos Estados Unidos está em péssimo estado, com o governo federal correndo grande risco de ir à falência.

Você provavelmente já leu muito sobre as ilusões políticas dos extremistas republicanos –e hoje em dia a grande maioria dos republicanos na Câmara são extremistas ou oportunistas dispostos a concordar com o que os extremistas quiserem. É importante, no entanto, perceber que as ideias econômicas do Partido Republicano são quase tão divorciadas da realidade quanto suas fantasias políticas.

Vamos falar primeiro sobre o estado atual da economia dos EUA.

Os republicanos passaram grande parte do ano passado gritando sobre uma "recessão Biden". E, para ser justo, muitos analistas privados esperam que os recentes aumentos das taxas de juros causem desaceleração do crescimento e aumento do desemprego este ano –embora eu esteja ouvindo falar cada vez mais sobre a possibilidade de um "pouso suave" que poderia violar a regra Sahm para recessões (um aumento de 0,5 ponto na taxa de desemprego), mas não parecerá uma queda severa.

Uma coisa é certa, no entanto: não houve recessão em 2022. De fato, a economia dos EUA encerrou o ano com um forte crescimento contínuo do emprego e a taxa de desemprego voltando ao que era antes da Covid.

E a inflação? O aumento de preços de 2021-22, após décadas de inflação baixa, foi um choque desagradável, e não quero minimizar o tamanho desse choque ou a medida em que muitos economistas, inclusive eu, falharam em prever isso. Os republicanos, nem é preciso dizer, tentaram fazer da inflação, que eles atribuíam ao excesso de gastos federais, um tema central das eleições de meio de mandato.

Mas eles perceberam que a inflação está caindo? Algum republicano proeminente reconheceu a mudança de situação?

Os números são realmente impressionantes. Durante o ano encerrado em novembro (os dados mais recentes disponíveis), o Índice de Preços ao Consumidor subiu 7,1%. Mas a inflação atingiu uma taxa anual de apenas 4,8% nos últimos seis meses, 3,6% nos últimos três meses e 1,2% em novembro.

É verdade que a inflação foi contida em parte por fatos que provavelmente não se repetirão, como a queda dos preços da gasolina no segundo semestre de 2022. Por outro lado, há boas razões para se acreditar que a inflação imobiliária –que é responsável por cerca de um terço do Índice de Preços ao Consumidor– caiu drasticamente, mas esse declínio ainda não está refletido nas estatísticas oficiais.

Adicione os dados mais recentes sobre salários, que foram muito encorajadores, e uma estimativa razoável é que recuperamos o pleno emprego com inflação subjacente apenas 1 ou 2 pontos acima dos níveis pré-pandêmicos. Essa não é uma situação perfeita, e espremer a inflação restante pode ser difícil (ou não!), mas dificilmente é uma imagem de catástrofe.

Seja como for, os mercados financeiros basicamente declararam o fim da ameaça de inflação: eles estão prevendo implicitamente cerca de 2% de inflação até onde a vista alcança. Eles também estão dispostos a comprar dívida federal a taxas de juros um pouco altas, mas ainda baixas para os padrões históricos, sem mostrar nenhum sinal de preocupação com a solvência dos EUA.

Ainda assim, os republicanos estão determinados a ver um desastre econômico e fiscal e insistem, como sempre quando os democratas estão na Casa Branca, que devemos tomar medidas drásticas para equilibrar o orçamento.

Isto é, depois de lidarmos com sua primeira prioridade: privar a Receita Federal dos recursos necessários para perseguir os ricos que sonegam impostos.

De qualquer forma, como de costume, o Partido Republicano está insistindo que o orçamento pode e deve ser totalmente equilibrado com cortes de gastos. E, como sempre, essa insistência se choca com a realidade de que cortes de gastos tão grandes seriam politicamente impossíveis. Na verdade, é provável que eles fossem politicamente impossíveis mesmo que os republicanos conseguissem destruir completamente a democracia, o que alguns deles parecem querer.

Pois o governo federal, como diz uma velha frase, é basicamente uma companhia de seguros com um exército. Além dos gastos militares –dos quais apenas uma pequena fração, mesmo agora, vai para a defesa da democracia na Ucrânia–, os dólares federais vão principalmente para programas de aposentadoria e saúde dos quais dezenas de milhões de americanos dependem, incluindo muitos republicanos.

Portanto, a nova maioria da Câmara está vivendo em um mundo de fantasia, insistindo em uma solução totalmente impraticável para uma crise amplamente imaginária. Infelizmente, como aprendemos em 6 de janeiro de 2021, as fantasias políticas podem ter consequências terríveis no mundo real.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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