Ricardo Melo

Jornalista e apresentador do programa 'Contraponto' na rádio Trianon de São Paulo (AM 740), foi presidente da EBC (Empresa Brasil de Comunicação).

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Senhor das armas, Bolsonaro busca o confronto para salvar a pele

Em vez da independência entre Poderes, procura-se um pacto de submissão cúmplice

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Brasília ferve. O pessoal do “deixa disso” tenta vender a ideia de que é possível uma solução com JMB (dito Bolsonaro) no Planalto. Políticos e sua turma no Judiciário combinam reuniões, colóquios, encontros de suposta pacificação. Somos o único país auto-intitulado de democracia no qual, em vez da independência entre Poderes, procura-se um pacto de submissão cúmplice. Condição: deixar o povo de fora.

JMB alimenta o blá-blá-blá e organiza sua boiada armamentista e autoritária com o apoio de generais emasculados e policiais militares. O próximo espetáculo está marcado para 7 de Setembro. A baderna fardada é geral e corre nos porões, assim como a excitação dos fanáticos com a ajuda do trumpista Steve Bannon.

Argumentando a subordinação às Forças Armadas, policiais estridentes convocam a parada antidemocrática sem constrangimento. Um ou outro governador finge resistir à sedição. Afasta um milico de baixo coturno mais insinuante e vai dormir na cama que é lugar quente.

Em primeiro plano, de costas, um militar fardado fazendo continência a Bolsonaro, que aparece no espaço estre o braço e a cabeça do militar. Ao lado dele, outros dois militares fardados
O presidente Jair Bolsonaro participa da cerimônia do Dia do Soldado, em Brasília - Marcos Corrêa - 25.Ago.2021/PR

Mas falta-lhes o poder (quando não vontade na maioria) para fazer uma limpa. Já o Exército finge que não é problema dele embora a força seja a comandante de fato das polícias militares —resquício da ditadura à qual todos eles prestam devoção.

Com tanto barulho, não se dá atenção a certos dados impressionantes. O SBT News, pequeno nicho a que foi confinado o resto de jornalismo da emissora, divulgou uma pesquisa com base na Lei do Acesso à Informação:

“Com o arsenal autorizado até o final de agosto deste ano, a soma de todos os atiradores, caçadores e colecionadores registrados hoje no Brasil chega a 409.689, ultrapassando os 335 mil integrantes da ativa do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. O número de CACs [colecionadores de armas, atiradores desportivos e caçadores] agora também pode ser comparado aos efetivos das polícias militares nos estados brasileiros —416.923, segundo dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Nos primeiros anos do governo Jair Bolsonaro (sem partido) os registros de CACs dispararam. Se em 2018, na gestão Michel Temer, foram inscritos 47.361, nos dois anos seguintes, a soma dos números chegou a 178.721. Os primeiros oito meses de 2021 já representam mais de 91% ante 2020, indicando um novo recorde até o final de dezembro. Ao longo de 10 anos, o crescimento ultrapassou os 1.178%.”

Nada pode ser descartado. A situação boliviana, guardado o contexto de que o objetivo era derrubar Evo Morales, exibiu o Exército assistir de camarote paramilitares e policiais se enfrentando com civis. Aí então resolveu agir. Não durou muito tempo, mas muito sangue escorreu.

JMB e sua tropa de asseclas certamente têm essa como uma das receitas na cabeça. Catastrofismo? Exagero? Pode ser. Mas o Brasil sempre tem surpreendido todo mundo para pior. Agora, então.

O cenário está sendo montado aos poucos. Até os porta-vozes do dinheiro graúdo já se convenceram de que JMB vale tanto quando um pote de maionese vencido. Basta ver os editoriais dos jornalões. Um deles ressalta que serão 16 meses de mais sofrimento porque a situação é “irremediável”. Ainda que o arrependimento de alguns deles naturalmente seja envergonhado, no mínimo demoraram menos de quarenta anos para reconhecer que ajudaram a colocar o Brasil no fundo do poço.

Também, chegamos ao ponto de Paulo Guedes, hoje rebaixado a frentista de postos de gasolina batizada (metáfora, tá?), dizer que não vê problema em aumentar o preço da energia. Só falta mandar a população comer brioches, usar lenha dos móveis e se virar com querosene para lamparinas.

Está tudo fora de controle. O coronavírus refestela-se com a falta de vacinas por causa das negociatas na Saúde. A economia que iria decolar rasteja. As estatísticas são uma gangorra. Um mês crescem em algum setor e agitam os colunistas oficiais de sempre; no outro despencam e os escribas se recolhem amuados.

A inflação em agosto trará nova alta. A “crise hídrica” (eufemismo para apagão e racionamento) vai devastar áreas produtivas e sacrificar ainda mais quem ainda tem uns trocados no bolso –menos o de Paulo Guedes. A fome, o desemprego e o desespero com as contas impagáveis dominam o cotidiano.

O resto todo mundo conhece. Se o impeachment é difícil com este Congresso servil (aprovou a recondução de Augusto Aras, advogado de luxo de JMB!), que os barões hoje assustados também pressionem pela renúncia de JMB. Mas seria esperar muito de uma elite acostumada a garantir o dela. No fim das contas, como sempre é o povo nas ruas que vai decidir.

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