Rômulo Saraiva

Advogado especialista em Previdência Social, é professor, autor do livro Fraude nos Fundos de Pensão e mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP.

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Descrição de chapéu Previdência inss

INSS e o preço da rapidez das motos

Óbitos de motociclistas no Brasil equivalem a um terço da guerra da Ucrânia

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Recife

Dirigir sem capacete, na contramão, em racha ou alcoolizado são motivos que levariam qualquer seguradora negar a cobertura da apólice de um motociclista. Embora não devesse, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), espécie de seguro social, aceita todo tipo de demanda.

Por mais criminosa que seja a conduta de um motoboy, este, se tiver com seu pagamento em dia e se o acidente lhe resultar incapacidade, poderá receber o auxílio por incapacidade temporária, o auxílio-acidente ou a aposentadoria por incapacidade permanente. Com o aumento dos sinistros envolvendo motoboy no país, superlotando o Sistema Único de Saúde e depois a Previdência Social (ou a Assistência Social) já passou da hora de a legislação ser modernizada.

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Trânsito durante a manhã na Radial Leste, altura da estação Tatuapé do Metrô - Adriano Vizoni/Folhapress

Embora sempre haja controvérsia do saldo de mortos numa guerra, conforme dados da inteligência dos Estados Unidos, a da Ucrânia já matou 50 mil soldados russos e 31 mil ucranianos. Desde o conflito até hoje, uma média de 90 mortos por dia. No Brasil, são 33 motociclistas que morrem todos os dias. A maioria é homem (89%) e jovem, entre 20 e 24 anos (18% das vítimas), de baixa escolaridade, de raça negra e solteiro.

A violência do trânsito brasileiro corresponde a um terço dos mortos em conflito bélico.

Atualmente, os benefícios por incapacidade são pagos independente do motivo. Há apenas a necessidade de investigar —o que nem sempre é feito — a etiologia do adoecimento para distinguir se a causa é acidentária ou não, o que repercutirá no cálculo do benefício. Mas acaso na investigação se descubra que o condutor fez a pior estupidez da lei de trânsito a renda será paga da mesma forma.

Do mesmo jeito que a lei previdenciária foi alterada, em 2015, para proibir que filho —inválido ou menor de 21 anos— se matar o próprio pai não ganhe a pensão por morte, raciocínio similar (ou outro) deveria ser aplicado aos motoboys que dão ensejo ao "acidente".

Depois que Fernando Henrique Cardoso chancelou que o Código de Trânsito Brasileiro (art. 56) admita motociclista se espremer no espaço entre duas fileiras de carros, os números de acidentes no país não pararam de subir. Em 1996, quando isso ocorreu, morreram naquele ano 725 motociclistas. Em 2009, esse número já tinha inflado 800% com 9 mil mortes por ano. De acordo com o último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, foram 32 mil mortes no trânsito em 2023 no Brasil: uma média de 89,6 por dia, liderado por 56,7% de motociclistas.

Em 1996, a justificativa da "circulação livre" nos corredores era para não afetar a agilidade e a versatilidade das motos, embora na maior parte do mundo lugar de moto é atrás ou na frente do carro. Já passou da hora de se repensar o preço dessa rapidez. Temos uma pandemia ou uma guerra civil de motoboys falecidos. Virou caso de saúde pública.

Enquanto os corredores não são proibidos, não parece razoável a Previdência Social com tantos problemas, inclusive financeiro, arcar com este tipo de proteção social aos que não respeitam minimamente a lei de trânsito. Pelo contrário, cometem crimes assumindo o ônus na esfera criminal, civil e no trânsito. Só não há ônus na previdenciária. Ou melhor, se for acidente, ganhará mais. É preciso repensar esta proteção social.

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