Ross Douthat

Colunista do New York Times, é autor de 'To Change the Church: Pope Francis and the Future of Catholicism' e ex-editor na revista The Atlantic

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Envelhecimento pode ser desafio tão definidor do século 21 quanto crise climática

Colunista lista cinco regras para o mundo se preparar para a era da decadência demográfica

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The New York Times

Existem dois tipos de pessoas no mundo: as que acreditam que o desafio definidor do século 21 será a mudança climática e as que sabem que será a redução dos nascimentos, o declínio da população, a velhice do mundo.

Começar assim uma coluna é se tornar refém da sorte. Se eu estiver errado, ela poderá ser citada com descaso ou zombaria em futuras reportagens relatando Nova York submersa e o Texas inabitável.

Homem brinca com criança na frente de loja decorada para o Ano-Novo lunar, em Pequim - Tingshu Wang - 15.jan.23/Reuters

Mas é importante que as pessoas estranhas mais obcecadas pela demografia do que pelo clima continuem martelando, porque qualquer que seja o verdadeiro equilíbrio de risco entre os dois, o relativo está mudando. Nos últimos 15 anos, alguns dos piores cenários para a mudança climática se tornaram menos prováveis do que antes. Ao mesmo tempo, várias forças, especialmente a crise da Covid, reduziram as taxas de natalidade mais depressa, fazendo avançar rapidamente a era da velhice.

A evidência mais recente são notícias vindas na semana passada da China, de que a população diminuiu pela primeira vez desde o Grande Salto Adiante, há mais de 60 anos. Uma tendência ao declínio era prevista havia muito tempo, mas até recentemente não se esperava que chegasse antes da década de 2030 –no entanto, aqui está ela, com a taxa de natalidade chinesa atingindo um piso histórico em 2022.

Isso significa que, exatamente enquanto a China emerge como uma quase superpotência, ela está olhando para um futuro sombrio onde envelhece e fica estagnada antes de terminar de enriquecer.

Enquanto isso, variações dessa sombra pairam hoje sobre a maioria das nações ricas e muitas de renda média —ameaçando a esclerose geral, uma perda de dinamismo e inovação e uma luta de empate entre uma população de aposentados inchada e os jovens sobrecarregados. (Os protestos em massa na França contra a proposta de Emmanuel Macron de aumentar a idade de aposentadoria de 62 para 64 anos foram uma prévia desse futuro.)

Portanto, vale a pena pensar em algumas regras para a era da decadência demográfica —tendências a se observar, princípios que separarão vencedores e perdedores, diretrizes para quem busca dinamismo em um mundo estagnado.

Regra 1: O mundo rico precisará de uma redistribuição dos velhos para os jovens

Nas últimas décadas, vimos muitos casos de tecnocratas que se mostraram errados em suas suposições –desde a crença generalizada de que precisávamos reduzir o déficit quase imediatamente após a crise financeira até o otimismo imprudente sobre os efeitos do livre comércio com a China.

Mas em um mundo que envelhece o desejo tecnocrático de reformar os direitos dos idosos se tornará cada vez mais essencial e correto –desde que as economias possam ser usadas para tornar mais fácil para os jovens começar uma família, abrir um negócio, possuir uma casa.

E os países que encontrarem uma maneira de fazer essa transferência com sucesso acabarão muito à frente daqueles que simplesmente afundarem na gerontocracia.

Regra 2: A inovação não é suficiente; o desafio será a implementação e a adoção

Se você deseja crescer em um mundo que envelhece, precisa de avanços tecnológicos. Mas, como observou o economista Eli Dourado em um artigo recente sobre os efeitos da nova tecnologia de inteligência artificial, os grandes gargalos nem sempre estão na invenção em si —estão nos testes, na infraestrutura, na implantação, nos obstáculos regulatórios.

E, como as sociedades envelhecidas e estabelecidas podem ser mais inclinadas a deixar as novas invenções na prateleira, eliminar esses gargalos pode se tornar o principal desafio do inovador.

Regra 3: A guerra terrestre irá contra os limites populacionais

Você pode ver essa dinâmica já na Guerra da Ucrânia. Os esforços de mobilização do presidente russo, Vladimir Putin, não são o que presumivelmente seriam se seu império tivesse mais jovens. A Ucrânia, com taxas de natalidade mais baixas que as da Rússia, enfrentará um aprofundamento de sua crise demográfica se a guerra se arrastar por anos.

A mesma questão se aplica a Taiwan e a outros locais críticos: mesmo onde as ambições estratégicas militam a favor da guerra, a dor de cada baixa será dramaticamente agravada.

Regra 4: No reino dos idosos, um pouco mais de juventude e vitalidade terá grande importância

Isso é verdade internacionalmente: países que conseguirem manter ou aumentar suas taxas de natalidade próximo do nível de reposição terão uma vantagem a longo prazo sobre países que mergulham numa fertilidade ao estilo sul-coreano, com metade do nível de reposição.

E será verdade também dentro das sociedades: para prever quais estados e cidades serão mais dinâmicos nos EUA, quais tradições e ideologias religiosas são mais influentes, procure lugares e grupos que sejam mais amigáveis não apenas para os jovens, mas também para os jovens com filhos. (Além disso, espere ter muito mais vizinhos amish.)

Regra 5: A diáspora africana irá remodelar o mundo

Quanto mais rápido o envelhecimento ocorre no mundo rico e de renda média, mais importante é o fato de que a população da África ainda está a caminho de atingir 2,5 bilhões em 2050 e chegar a 4 bilhões em 2100.

O movimento de uma mera fração dessa população provavelmente será a transformação global mais significativa do século 21. E o equilíbrio entre assimilação bem-sucedida por um lado e desestabilização e reação negativa por outro ajudará a decidir se a era do declínio demográfico terminará em revitalização ou colapso.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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