Ross Douthat

Colunista do New York Times, é autor de 'To Change the Church: Pope Francis and the Future of Catholicism' e ex-editor na revista The Atlantic

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Ross Douthat
Descrição de chapéu The New York Times

Uma lista da minha estante para quem gosta de romances de fantasia

Você pode tirar uma folga da política e pensar nessas recomendações como inspiração para essa perfeição imaginada

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The New York Times

Depois de enviar a coluna da semana passada comparando "Succession" a uma obra de fantasia no estilo "Game of Thrones", gravei um episódio de podcast com Razib Khan no qual conversamos sobre nossa afeição por verdadeiros romances de fantasia, nossa experiência como adeptos precoces de George R.R. Martin e outros assuntos de profundo interesse nerd.

Cena da oitava temporada de "Game of Thrones"
Cena da oitava temporada de "Game of Thrones" - Divulgação

Foi uma conversa abrangente, mas que ficou principalmente com os grandes nomes do gênero –Martin, J.R.R. Tolkien, alguns outros–, em vez de oferecer uma lista detalhada de recomendações de leitura.

Então, como estamos entrando num fim de semana de feriado (nos EUA) e todo mundo precisa de uma folga da política, pensei em oferecer uma pequena lista de romances para qualquer pessoa interessada nos tipos de coisas que a fantasia faz bem e procurando entretenimento para o verão que se aproxima.

Não é uma lista dos meus favoritos de todos os tempos ou mesmo uma lista de "romances de fantasia que deveriam ser adaptados para a TV em vez de fazerem mais temporadas de 'Os Anéis do Poder'".

É só eu dando uma olhada na minha estante. Mas uma coisa que disse a Khan é que a grande saga de fantasia do século 21 ainda está para ser escrita –uma que usa a arquitetura de vários e grossos volumes que se desenvolveu imitando Tolkien para acomodar ideias e personagens diferentes e experimentos em uma estrutura épica; um que alcança o que Martin estava almejando com "As Crônicas de Gelo e Fogo", mas em um nível mais alto de habilidade literária e sem seu bloqueio de escritor mediado pela HBO.

Você pode pensar nessa lista, talvez, como várias inspirações para essa perfeição imaginada.

'The Goblin Emperor' [o imperador goblin], de Katherine Addison
Este é um romance autônomo impressionante, escrito num estilo controlado, quase de um Kazuo Ishiguro, sobre um príncipe meio goblin subitamente elevado ao trono de um império élfico altamente culto. Um romance puro de política da corte, em que o jogo dos tronos mal sai do palácio. Sua principal imperfeição é que seu jovem imperador protagonista se torna um jogador poderoso e de sucesso com muita facilidade e sem muito custo moral. Mas o estilo, o cenário e a linguagem da corte ficam com você; isso é uma bela conquista. (As sequências mais curtas e mais parecidas com novelas de Addison, apresentando um detetive elfo gay operando em outro lugar no mesmo império, ainda são mais do estilo Ishiguro.)

'Farseer' [vidente], trilogia de Robin Hobb
Esta é outra história enraizada na política da corte que apresenta um descendente real indesejado, mas mais expansiva e mais próxima da arquitetura padrão da alta fantasia –vários livros, guerra mágica, rumores de apocalipse e assim por diante. O herói de Hobb, Fitz, é um dos exemplos mais bem-sucedidos de construção de personagem e interioridade atraente na fantasia recente. O mundo ao seu redor é construído de forma mais desigual, com algumas ideias centrais brilhantes cercadas por uma certa quantidade de esboços superficiais e vilões estereotipados para uma narrativa com foco psicológico. Mas li não só a trilogia inicial, como também os outros seis livros, o que para o meu "eu" adolescente não teria significado muito, mas nesta fase da minha vida de leitor conta como o endosso mais forte possível.

'The Crystal Cave' [a caverna de cristal] e 'The Hollow Hills' [os morros vazios], de Mary Stewart
Não sou um obcecado por mitos arturianos, e há muitos romances de fantasia que trabalham nessa costura específica sem se diferenciarem. Os romances de Stewart sobre Merlin, da década de 1970, são exceções, ou talvez sejam apenas melhores por serem um ponto de origem para tentativas posteriores de uma "arthuriana" historicamente fundamentada –com os elementos místicos especialmente bem renderizados e, do mesmo modo, a história da construção do reino após a decadência de Roma.

As partes subsequentes, "The Last Enchantment" e, em seguida, "The Wicked Day", com foco em Mordred, vacilam um pouco ao tentar encaixar muitos mitos numa linha do tempo plausível da Grã-Bretanha no final da Antiguidade. Mas os dois primeiros livros, que trazem a história da infância de Merlin por meio de Tintagel até a ascensão de Arthur ao trono, eram meus favoritos quando adolescente e continuaram favoritos quando voltei a eles mais recentemente.

'The Heroes' [os heróis], de Joe Abercrombie
Abercrombie escreveu muitos romances que oferecem o que Martin é acusado de entregar: um mundo de fantasia governado quase todo por cinismo e violência, todos os tropos românticos desconstruídos, todas as devoções minadas. Ele tem um estilo picaresco que faz isso de forma mais divertida do que essa descrição pode sugerir –embora eventualmente com retornos decrescentes. Mas seu trabalho mais interessante é uma tentativa de mistura de gêneros, um trio de livros que fazem, respectivamente, um faroeste, uma trama de vingança no estilo "O Conde de Monte Cristo" e um romance de batalha no estilo de "The Killer Angels" de Michael Shaara. "The Heroes" é o livro de batalha única, um mundo de fantasia Antietam contado por meio de várias perspectivas de campo de batalha, e é provavelmente o seu melhor.

'Spinning Silver' [prata girando] e 'Uprooted' [desenraizado], de Naomi Novik
São romances independentes, mas irmãos espirituais, tentativas de brincar com o clima, o cenário e os ritmos de um conto de fadas em um cenário eslavo. "Uprooted" tem o personagem principal e o romance com mais vencedores; "Spinning Silver" tem o enredo mais bem-sucedido e a dose mais completa de conto de fadas. Este último também tem um forte componente judaico, criticado por Michael Weingrad, autor do divertido ensaio "Por que não há Nárnia judaica". Acho que sua acusação de liberalismo anacrônico contra os personagens medievais de Novik tem alguma força, mas essas fraquezas são equilibradas por outras virtudes narrativas, um senso dos mistérios das fadas acima de tudo.

'A Saga do Novo Sol', de Gene Wolfe
Este é apenas um clássico neste ponto, mais que uma recomendação contemporânea, mas o estou incluindo como uma desculpa para observar o excelente ensaio de Brian Phillips sobre Wolfe, que vende seu trabalho melhor do que eu poderia fazer.

'Memory, Sorrow and Thorn' [memória, tristeza e espinho], de Tad Williams
A trilogia de Williams é a saga de fantasia moderna que recomendo a aspirantes a adaptadores de fantasias na HBO ou na Amazon. Tem os elementos clássicos do gênero —a política da corte e o cenário sobrenatural, o mundo pairando entre a modernidade e a magia, até mesmo o plebeu apaixonado por uma princesa–, mantidos juntos e equilibrados com mais sucesso do que em quase qualquer concorrente.

É realista e brinca com as expectativas tolkienianas sem ser sombrio ou tediosamente desconstrucionista; tem mentalidade política sem ser engolido por suas intrigas; é derivado do mundo medieval, mas autoconsciente sobre a dívida de sua subcriação para com a nossa realidade. E, mais importante, é bem escrito e termina sem se perder em delongas de construção de mundo.

Williams encerrou o romance final quando Robert Jordan estava no auge e Martin avançava, e você pode sentir em seu último livro (grande o suficiente para ser dividido em dois para brochuras) as tentações expansionistas que impediram esses dois autores de terminar suas sagas –mas também um forte impulso de recolhimento, uma consciência de "vou até aí e não mais", puxando sua história para dentro e de volta a um final bem-sucedido. Que todos tenhamos essa sabedoria. Feliz Dia da Memória.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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