Sandro Macedo

Formado em jornalismo, começou a escrever na Folha em 2001. Passou por diversas editorias no jornal e atualmente assina o blog Copo Cheio, sobre o cenário cervejeiro, e uma coluna em Esporte

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Herói da Libertadores, Deyverson é o melhor ator da América

Que Ricardo Darín me perdoe, mas o palmeirense foi shakespeareano no Uruguai

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O mundo do cinema já perdeu vários talentos para esse tal de futebol ao longo dos anos.

Pense em Maradona. Genialidade à parte, era praticamente um filho de Ésquilo em campo pelo jeito que gesticulava com juízes, sempre acusando faltas e supostos erros –Ésquilo é considerado o pai da tragédia grega. Sem falar na mãozinha boba usada com sutileza para ludibriar um estádio inteiro.

E Rivaldo, na Copa de 2002? Que homem, após uma bolada no corpo, levou as mãos ao rosto como se tivesse levado uma pedrada na testa? O juiz, espectador na primeira fileira, quase chorou com a atuação e não teve outra saída a não ser expulsar o vilão turco.

Deyverson emocionado após marcar contra o Flamengo na final da Libertadores
Deyverson emocionado após marcar contra o Flamengo na final da Libertadores - Juan Mabromata - 27.nov.2021/AFP

Até outro dia, nosso melhor ator era também nosso principal jogador no mundo, Neymar, conhecido em algumas rodas como "o menino Ney". Para começar, precisa ser excelente ator para ser chamado de menino aos 29 anos. É praticamente um Tom Cruise fazendo "Missão: Impossível"... Interminável.

Nosso Ney seria um ator de mão cheia. Pode fazer drama (e faz) quase toda semana. Faz lances dignos de efeitos especiais, quando quer, usando apenas uma bola. Pode fazer musicais também: já viu quantas piruetas no chão ele consegue dar ao ser derrubado? Contra o México, na Copa do Mundo de 2018, há quem diga que estabeleceu um novo recorde mundial de giros na grama.

Também pode fazer ação/policial, com suas repetidas brigas dentro de campo contra amiguinhos de camisa diferente. E se precisar de uma ponta em "Grey’s Anatomy", "House", "Plantão Médico" ou "The Good Doctor", pode contar com Ney, sempre disposto a encarar uma enfermaria –como machuca. Aliás, fica a dica para os poderosos do streaming, que tal uma série documental intitulada "NeyMédico"?

Menino Ney só tem um problema enquanto ator. Não foi talhado para ser coadjuvante. Gosta de ser sempre a estrela principal da companhia. Já largou até a Espanha por causa disso.

Mas agora temos Deyverson. Reza a lenda que todo bom ator de comédia daria um ótimo ator dramático, e que o contrário não é verdadeiro. Deyverson, que já fez muita cena de pastelão, confirma a regra entre os jogadores-atores. Não há jogador-ator do mundo com o timing de improvisação do atacante palmeirense.

Em Montevidéu, em apenas meia hora de jogo (um episódio de série), Deyverson foi shakespeareano.

Assim que rouba a bola de Andreas (que ladrão, hein), ele balança o corpo para ludibriar o goleiro e fazer o gol do título. Sai correndo com os olhos arregalados, em uma expressão de suspense, quase como se ele mesmo não acreditasse no que fez. Ainda na mesma cena, cai no choro, emocionado. E teve cabeça fria para fazer coraçãozinho com a mão para a torcida, que romântico.

Mas nada, nada, nada supera sua performance nos acréscimos, quando olha sorridente para o juiz e, após um leve toque nas costas, desaba no gramado como se tivesse sido atingido pelo martelo de Thor –sim, ele não percebeu que foi o próprio juiz que "encostou" nele. O lance foi tão especial que nem o pobre árbitro argentino Néstor Pitana, acostumado a milongueiros, soube o que fazer. Mais um pouco e ele se dava um cartão amarelo pela falta.

Que os outros jogadores-atores me perdoem, que Ricardo Darín me perdoe, mas Deyverson é o melhor ator da América.

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