Sergio Firpo

Professor de economia e coordenador do Centro de Ciência de Dados do Insper

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Sergio Firpo
Descrição de chapéu mercado de trabalho

Violação e desistência de direitos trabalhistas são consequência da legislação existente

Novas leis trabalhistas deveriam levar em conta os incentivos que trabalhadores e firmas terão para cumpri-las

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A chapa Lula-Alckmin protocolou junto ao TSE seu programa de governo. De acordo com o parágrafo 13 desse documento, eles se comprometem, se eleitos, a propor, "a partir de um amplo debate e negociação, uma nova legislação trabalhista de extensa proteção social a todas as formas de ocupação, de emprego e de relação de trabalho, com especial atenção aos autônomos, aos que trabalham por conta própria, aos trabalhadores e trabalhadoras domésticas, ao teletrabalho e aos trabalhadores em home office, mediados por aplicativos e plataformas, revogando os marcos regressivos da atual legislação trabalhista, agravados pela última reforma e reestabelecendo o acesso gratuito à Justiça do Trabalho."

Uma nova legislação trabalhista é, de fato, algo de que precisamos urgentemente. A nossa legislação atual, mesmo com todos os remendos recentes, não protege a maior parte dos trabalhadores, como os autônomos e os empregados sem carteira. Eles estão desprotegidos porque o sistema de regras trabalhistas, tributárias, previdenciárias e assistenciais existente hoje cria incentivos para que relações informais de trabalho sejam preponderantes.

A redução da informalidade passa pela elaboração de regras que alinhem os incentivos de trabalhadores e firmas a estabelecerem relações formais entre si. Regras que se distanciem muito desse preceito precisarão de fiscalização contínua para que sejam cumpridas. Em um país em que há milhões de pequenas empresas, é inviável um programa de fiscalização do trabalho com a cobertura adequada.

Ambulantes da rua Oriente, no Brás, durante a pandemia de Covid em São Paulo
Ambulantes da rua Oriente, no Brás, durante a pandemia de Covid em São Paulo - Ronny Santos/Folhapress

Um ponto relevante, mas muitas vezes esquecido, é que a atual legislação gera incentivos para que o próprio empregado queira migrar para a informalidade. Por exemplo, o trabalhador que tem uma relação frágil com o mercado formal de trabalho, aquele que entra e sai diversas vezes do emprego com carteira assinada ao longo de sua vida laboral, é tributado ao contribuir para Previdência. A contribuição que ele e seu empregador pagam todo mês enquanto ele estiver em um emprego com carteira pode nunca se transformar em benefício previdenciário, pois há um tempo mínimo durante o qual ele deve contribuir. O que era para ser contribuição, torna-se um imposto na perspectiva do trabalhador.

Ao mesmo tempo, se esse trabalhador chegar pobre à idade mínima da elegibilidade para o programa não contributivo de previdência, o BPC, terá direito um salário mínimo mensalmente. Qual incentivo ele tem para contribuir para a Previdência nesse caso?

O trabalhador jovem e de baixa qualificação tem chances maiores de se empregar, se ele anuir em ter um vínculo informal com a empresa. Um salário mínimo bruto mensal que o trabalhador receba, quando se adicionam encargos e direitos, quase que dobra da perspectiva de custos da empresa. O trabalhador jovem e de baixa qualificação se torna, dada a sua produtividade, excessivamente caro para uma firma pequena, em setores muito competitivos e empregando tecnologias defasadas.

Como nossos programas de transferência de renda não são ágeis o suficiente para monitorar famílias que entram e saem da pobreza com frequência, um trabalhador informal tem mais chances de preservar seus benefícios assistenciais ao omitir a renda do trabalho do que o formal.

Óbvio que as contribuições ao INSS não cobrem apenas aposentadoria e pensão, mas permitem que o trabalhador disponha de um seguro nos casos de doença e acidentes, bem como de cobertura e proteção à licença-maternidade. Mas ao se imputar a probabilidade de esses eventos ocorrerem, pode-se descobrir que o custo da formalização é alto demais.

Não se esgota a lista dos incentivos perversos com os exemplos acima. Custos de demissão, impostos e contribuições obrigatórias sobre folha, financiamento do seguro-desemprego, remuneração do FGTS, regras de saque do FGTS, regimes especiais de tributação, salário mínimo e outros itens fazem parte de uma lista mais extensa de fatores que contribuem para que tenhamos uma fração relevante de trabalhadores informais. A proposição de uma nova legislação trabalhista, a partir de um amplo debate e negociação, deveria levar em conta a forma como trabalhadores e firmas reagirão a ela, uma vez em vigor.

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