Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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Descrição de chapéu guerra comercial

Estamos diante de uma nova Guerra Fria?

Duas das mais importantes economias mundiais, EUA e China vivem momento de rivalidade

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Por muitos anos, a geopolítica deixou de ter papel preponderante no desenho das perspectivas econômicas e financeiras globais. O ano de 2022 certamente terá marcado o fim desse tempo, não só por conta da pandemia e da Guerra na Ucrânia, mas também como consequência das mudanças em curso na política chinesa.

As futuras relações de poder entre as duas mais importantes economias, EUA e China, terão impactos profundos no crescimento e na inflação globais e, potencialmente, darão origem a grandes desafios para nosso país.

A recente imposição de sanções às exportações de chips e semicondutores americanos para a China não deixa dúvidas sobre a resposta ao título do artigo. O escopo da iniciativa atual é a reação mais forte à qual assistimos desde quando a China lançou o programa Made in China 2025 com o objetivo explícito de dissociar sua cadeia de produção do Ocidente.

Líder da China, Xi Jinping, discursa no 20º Congresso do Partido Comunista Chinês, em Pequim - Noel Celis/AFP

A partir de agora, empresas de qualquer lugar do mundo cujos produtos usam a tecnologia dos EUA serão impedidas de fornecer bens e serviços para empresas chinesas sujeitas ao controle. O propósito é de bloquear a China do avanço tecnológico não só americano como também global.

Não foi à toa que o recém-concluído 20º Congresso do Partido Comunista da China (PCC), que define a cada 5 anos os rumos do país, enfatizou o objetivo da inovação nacional e da autossuficiência em tecnologia. Não ficaram dúvidas sobre o novo posicionamento do gigante asiático no que tange às relações internacionais e à geopolítica.

O evento encerra o período em que a China era vista como uma nação de renda média, que aspirava uma melhor qualidade de vida aos seus cidadãos. A partir de agora, abre-se uma próxima fase, com foco na governança e na segurança nacional.

Mais importante, o evento estabeleceu, de forma contundente o status de liderança inequívoca de Xi Jinping. Práticas até então existentes na seleção de posições partidárias centrais mudaram, com a lealdade pessoal substituindo a meritocracia como o princípio nas nomeações.

Os riscos para o crescimento da China em 2023 não são baixos. As contínuas incertezas sobre o avanço da Ômicron, a crise no setor imobiliário e a desaceleração do crescimento global são exacerbadas pela nova postura do governo.

Face ao envelhecimento populacional e ao fracasso de estimular o aumento da taxa de natalidade depois da rígida política do filho único, a China parecia querer escapar desse problema com uma estratégia clara para aumentar a produtividade: abrir o setor de serviços à participação estrangeira e aumentar o valor agregado de sua cadeia da manufatura através da incorporação de tecnologias emergentes.

No entanto, o que estávamos vendo antes da pandemia já era um claro retrocesso desse processo, com mudanças regulatórias drásticas em diversos setores. Se já não havia dúvidas de que tais ações amorteceriam o investimento estrangeiro, a nova postura do PCC coloca definitivamente a economia em segundo plano.

Dada a nova estrutura centralizada de poder e cercado de aliados com menos experiência na administração pública federal, os riscos de erros graves da política econômica aumentarão significativamente.

Para o mundo, as mudanças na política doméstica chinesa são um elemento com grande potencial de estremecer as relações diplomáticas entre países. A separação entre os países do oeste (EUA, Europa e seus aliados) e leste (China, Rússia e seus aliados) é cada vez mais nítida, colocando em risco o processo de globalização.

E como nós ficamos diante de uma nova Guerra Fria? Certamente estamos em um mundo bem diferente de 2003-2008, quando a China cresceu em média 10% ao ano, pós-ingresso na OMC. Naquele momento, a China representava menos de 4% de nossas exportações, enquanto hoje representa cerca de 15%.

Depois de uma eleição muito apertada e do aumento substancial da incerteza sobre os rumos da política econômica, iniciaremos o ano de 2023 tendo como principal desafio trazer de volta a credibilidade fiscal, contemplando demandas sociais já prometidas durante a campanha.

O mundo de juros mais altos e inflação resiliente agora traz mais um ingrediente de dificuldade: o fim do multilateralismo e o aprofundamento da separação entre aliados dos EUA e da China. Não será fácil um país dividido navegar em um mundo dividido. Vamos precisar de muita habilidade política interna e externamente.

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