O atentado a uma pizzaria em Kramatorsk, na Ucrânia, no último dia 27, que matou a escritora Victoria Amelina e outras dez pessoas, fez o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, abandonar a posição de certa neutralidade no conflito e atacar duramente a Rússia.
Isso porque, entre os 56 feridos estavam dois colombianos: o escritor Hector Abad Faciolince e Sergio Jaramillo, aquele que foi chefe da Comissão de Paz que negociou o fim do conflito entre o Estado colombiano e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
Em conversa com a Folha em Bogotá, Jaramillo afirmou que a América Latina não pode ficar neutra na Guerra da Ucrânia porque conhece a violência brutal da qual pode ser vítima uma população.
"Se sei algo, é sobre negociações de paz. Fiz isso na Colômbia e agora me dedico a assessorar outras negociações difíceis. Essa guerra não termina enquanto [Vladimir] Putin souber que tem aliados pelo mundo."
No conflito colombiano com as Farc, morreram 500 mil pessoas entre 1964 e 2016, sem contar as vítimas dos embates entre Forças Armadas e outras guerrilhas, além de paramilitares e cartéis de narcotráfico. Naquele período, mais de 1 milhão de colombianos emigraram.
Um dos atentados mais conhecidos, por ter ocorrido em Bogotá e não no interior, onde eram mais comuns, foi o do luxuoso clube El Nogal, numa das áreas nobres da capital, em 2003, deixando 36 mortos após as Farc levarem um caminhão com mais de 200 kg de explosivos até o interior do clube. Além das vítimas, o ataque deixou a sensação de que a guerra estava já fora do controle e muito perto dos centros de poder.
"El Nogal é um exemplo de quantas insurgências recorreram ao terror na América Latina. Também tivemos os montoneros colocando suas bombas nos anos 1970 na Argentina e os atentados no Chile nos anos 1980. É por isso que a América Latina, se possui valores e coragem, deveria estar protestando contra a invasão", diz Jaramillo.
A escritora ucraniana morta no atentado à pizzaria em junho passado havia abandonado a ficção para registrar crimes de guerra e também ajudava familiares de vítimas e animais abandonados nas cidades desertas pela fuga desesperada de seus moradores.
No início do ano, Victoria Amelina esteve no Hay Festival, de Cartagena, onde ficou amiga de vários autores latino-americanos e fez o pedido de que ajudassem seu país. Foi lá que Jaramillo a conheceu e lhe contou de sua campanha "Aguanta Ucrânia", da qual participam, por meio de vídeos, vários autores e artistas, incluindo os brasileiros Luiz e Lilia Schwarcz, Michel Laub e Milton Hatoum.
A escritora chilena Isabel Allende é outra que participa e faz um relato sobre os anos da ditadura chilena e o horror de viver com o peso das bombas e da repressão no cotidiano.
Com a voz embargada e lágrimas nos olhos, Jaramillo pede que o Brasil condene abertamente a Putin e a invasão russa da Ucrânia.
"O que o Brasil e outros países da nossa região estão fazendo é dar oxigênio a Putin. Essa posição de países da América Latina convence Putin de que tem pelo menos um bloco de países amigos e ratifica suas teorias delirantes nas quais vê o Ocidente como o problema."
"Isso alarga a guerra e faz com que a paz seja impossível."
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