Polícia procura ex-interno da Febem acusado de extorquir padre Júlio Lancelotti
Um grupo de quatro pessoas, entre eles um ex-interno da Febem (atual Fundação Casa) e sua mulher, são acusados pela Polícia Civil de São Paulo de extorquir o padre Júlio Lancelotti, um dos principais defensores dos direitos de jovens infratores e de moradores de rua de São Paulo.
Filipe Redondo/Folha Imagem |
O padre Júlio Lancelotti |
Foi o próprio padre quem procurou a polícia para denunciar o crime. Ele afirma que as extorsões começaram depois que Anderson Marcos Batista, atualmente com 25 anos, saiu da Febem. O padre chegou a pagar cerca de R$ 50 mil para o grupo, incluindo R$ 20 mil em prestações de um carro comprado em 2004.
Batista conheceu o padre em uma das visitas que Lancelotti fez à unidade da Febem onde o jovem estava internado. Depois de sair, o rapaz procurou o padre dizendo que não tinha para onde ir. "Nós o colocamos em uma frente de trabalho e pagamos seu aluguel", disse Lancelotti.
Os pedidos de dinheiro, com o tempo, se tornaram ameaças. A mudança começou quando Batista iniciou um relacionamento com Conceição Eletério. "Ela era a chefe da quadrilha", afirma o delegado André Luiz Pimentel, do SIG (Setor de Investigações Gerais) da 5ª Seccional.
Bilhete do padre a Batista "Chega, por favor, não tenho mais como" |
Os primeiros pedidos de dinheiro variavam entre R$ 800 e R$ 1.500 e eram feitos por bilhetes entregues pelos outros suspeitos --os irmãos Everson dos Santos Guimarães e Evandro dos Santos Guimarães. O padre deveria devolver o bilhete, para que não houvesse prova das ameaças, e entregar o dinheiro.
"Chegaram a dizer: 'Se o senhor está cansado de viver, eu vou resolver meu jeito'", afirmou Lancelotti. Nas últimas mensagens, o tom da quadrilha mudou, pelo menos nos bilhetes, terminando com "Deus te abençoe" ou "fique com Deus". "Eles já estavam se sentindo ameaçados", diz o padre.
Pelo telefone, no entanto, as ameaças continuaram. Em uma das conversas gravadas pela polícia, Eletério e Batista ameaçam envolver o filho dela, que acusaria o padre de abuso sexual. "O senhor fica mexendo com crianças de três anos, com meu filho (...) o meu filho tá indo pra imprensa. Pode chamar a polícia e (...) que for". Lancelotti nega qualquer abuso.
Denúncia
O padre chegou a se tornar fiador de Eletério na compra de uma Pajero --pagando dez prestações de R$ 1.000 do carro, mas diz que não agüentou mais as extorsões quando lhe pediram mais R$ 20 mil para comprar um terreno no litoral no mês passado. Orientado pela polícia, ele começou a gravar as conversas e combinou a entrega de R$ 2.000 a Everson. Quando ele recebeu o dinheiro, no Belém (zona leste de São Paulo), foi preso pela polícia.
Lancelotti afirma que demorou para denunciar porque queria tentar reverter a situação sozinho. "Esperava um resultado positivo. Esperava que parasse. Esperava que eu conseguisse tocar no coração deles."
Apenas Everson foi preso pela polícia até agora. Evandro, Conceição e Batista tiveram a prisão preventiva decretada, mas estão foragidos.
A Pajero acabou apreendida por acaso em 14 de setembro. Policiais militares localizaram o carro perto de uma favela. Estranhando a presença de um carro caro em uma área pobre, checaram os dados do carro e descobriram que havia uma queixa de roubo.
"Informamos o roubo para que o carro fosse bloqueado. Se fosse informado que era uma extorsão, ele não seria", explica o delegado Pimentel. Batista apareceu no local e disse aos PMs que na verdade o carro não havia sido roubado e que o documento estava em nome de sua mulher.
O caso foi parar no 9º DP (Carandiru, na zona norte), mas Batista percebeu que o caso poderia ter ligação com as extorsões, alegou que sua mulher estava passando mal e foi embora antes de depor, deixando o carro, sua carteira de habilitação e o documento do veículo.
Atuação
O monsenhor Júlio Lancelotti também é padre da paróquia de São Miguel Arcanjo, em São Paulo. Coordenador da Pastoral do Povo de Rua e da Pastoral do Menor, Lancelotti realiza freqüentes protestos defendendo os dois grupos. Depois do ataque contra moradores de rua no centro da cidade, em 2004.
A atuação do padre também ficou em evidência durante a última crise da antiga Febem, em 2005, e quando a Prefeitura de São Paulo instalou uma rampa anti-mendigos sob a avenida Paulista, onde moradores de rua se concentravam, sendo chamado de demagogo.
Doutor honoris causa pela PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo, o padre coordena a Casa Vida, entidade que atende 36 menores em duas unidades na zona leste da capital.
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