Em meio a ataques de facções, mortes violentas caem 65% no Ceará

Dados da secretaria de Segurança e Defesa Social mostram queda no mês de janeiro

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Salvador

Em meio a ataques coordenados por facções criminosas e uma crise na segurança pública que completa um mês neste sábado (2), o Ceará registrou uma queda substancial no número de mortes violentas.

Dados da secretaria de Segurança e Defesa Social mostram uma queda de cerca de 65% das mortes violentas no mês de janeiro, comparado com janeiro de 2018. O dado inclui homicídios, casos de roubo seguido de morte e lesão corporal seguida de morte.

Ao todo, foram 177 mortes violentas no Ceará em janeiro de 2019 contra 496 em janeiro de 2018. O número de mortes dentro de presídios caiu de 14 para zero.

Ceará vem sendo alvo de ataques a bens públicos e privados coordenados por facções criminosas desde 2 de janeiro. Os atentados começaram após o governo do estado impor regras mais duras nos presídios, incluindo o fim da divisão dos presos por facção.

Desde então, foram registrados mais de 260 ataques criminosos em 50 dos 184 municípios cearenses. Os principais alvos foram agências bancárias, postos de combustível, viadutos, delegacias, além de carros e ônibus que foram incendiados.

Entre os casos de maior repercussão está a tentativa de implosão de uma ponte, um viaduto e uma torre de distribuição de energia em cidades do interior cearense. Após os ataques, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o governador Camilo Santana (PT) defenderam que ações deste tipo sejam tipificadas como terrorismo.

O clima de instabilidade na segurança, contudo, não se refletiu num recrudescimento das mortes violentas.

Na avaliação do governo do Ceará, a queda nos índices de assassinatos é resultado das medidas de reforço no policiamento ostensivo para combater os atos criminosos.

“A atuação constante do efetivo nas ruas e as operações de Inteligência tiveram reflexo direto numa tendência de redução de atos criminosos e índices de criminalidade como roubos, furtos e homicídios”, informou, em nota, a secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Ceará.

Além de 29 mil policiais cearenses, incluindo 1.200 da reserva que foram convocados extraordinariamente, a policiamento tem sido feito por 400 homens da Força Nacional, além de policiais que vieram de outros estados.

Na avaliação de especialistas, contudo, além do reforço do policiamento, uma trégua entre as facções criminosas durante os ataques pode ajudar a explicar uma queda tão brusca no número de assassinatos.

Para o sociólogo César Barreira, professor da Universidade Federal do Ceará, a onda de ataques fez com que a disputa por territórios e pelo controle do tráfico de drogas fosse temporariamente suspensa.

“A principal causa de mortes violentas no estado é a disputa entre as facções. Mas, neste momento, elas se uniram para combater um inimigo comum e mais forte”, afirma.

Três facções controlam o comércio de drogas no Ceará: a carioca Comando Vermelho, a paulista PCC (Primeiro Comando da Capital) e a cearense Guardiões do Estado –as duas últimas já eram aliadas.

Bombeiros e policiais atuam em uma das áreas que foi alvo da onda de violência no Ceará
Bombeiros e policiais atuam em uma das áreas que foi alvo da onda de violência no Ceará - Paulo Whitaker/Reutersa

As investigações da Polícia Civil apontam para uma aliança entre o Comando Vermelho e a Guardiões do Estado durante os ataques – membros dessas duas facções foram detidos como suspeitos pelos ataques. Até o momento, não foram presos criminosos ligados ao PCC.

Ao todo, foram detidos 466 pessoas até 7h de quinta-feira (31) por suspeita de participação nos ataques. Outros 39 presos apontados como líderes de facções foram transferidos para presídios federais.

O sociólogo César Barreira afirma que a tendência é que os ataques arrefeçam nas próximas semanas e defende uma reavaliação da política de segurança do estado.

“Controlados os ataques, será hora de fazer uma reflexão sobre a política de segurança. O governo deve buscar uma atuação ainda mais focada na prevenção”, afirma.

A secretaria de Segurança Pública informou que não há prazo para desmobilizar o efetivo empregado no policiamento ostensivo nas ruas.

Além do CE, quatro estados adotam recompensas por informações.

Principal medida legal adotada pelo governo do Ceará para o enfrentamento de ataques, a criação de um que prevê o pagamento de recompensa por informações sobre criminosos é adotada por cinco dos dez maiores estados brasileiros.

Além do Ceará, os estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Pernambuco preveem o pagamento de recompensa por informações repassadas ao disque-denúncia.

Em São Paulo, o Programa Estadual de Recompensas foi adotado em 2014 e já distribuiu R$80 mil por informações que ajudaram no esclarecimento de crimes. No Rio, a prática já é recorrente há, pelo menos duas, décadas.

O Rio Grande do Sul adotou a medida no fim de 2017 após uma crise de homicídios e latrocínios em Porto Alegre no ano anterior.

Nos demais estados, não há legislação vigente que preveja o pagamento de recompensas por informações sobre crimes. A exceção é o Paraná, que aprovou uma lei em 2016, mas ainda não constituiu um fundo para colocar a medida em prática.

No Ceará, desde a adoção da nova lei no dia 13 de janeiro, a polícia recebe, em média 275 denúncias por dia. A lei prevê pagamentos de até R$ 30 mil para o informante, de acordo com a importância da informação. 

Outras medidas tomadas pelo governo cearense são menos recorrentes nos estados. É o caso da extinção de tomadas dentro das celas, que tem como objetivo impedir que os presos tenham como carregar telefones celulares que entrem irregularmente no presídio.

Dos 10 estados ouvidos pela Folha, apenas três –Pernambuco, Pará e Minas Gerais– adotam o sistema, mas apenas em presídios novos.

Em Pernambuco, o presídio de Itaquitinga e complexo de Araçoiaba tem os seus sistemas elétrico e hidráulico projetado nas áreas externas.

Em Minas, o Complexo Penal Público Privado tem tomadas apenas nos corredores da unidade. O governador Romeu Zema (Novo) determinou que, em novos projetos de construção prisional, não haja ligação elétrica dentro das celas.

A estados que não adotam a medida argumentam as tomadas nas celas  são necessárias já que a lei de execuções penais permite que os presos tenham ventilador e televisão.

Além da Lei da Recompensa e da retirada das tomadas nas celas, o governo cearense aprovou leis que preveem a convocação de policiais da reserva e a criação de perímetros de segurança no entorno dos presídios. 

Colaboraram ESTELITA HASS CARAZZAI, de Curitiba, JULIA BARBON​, do Rio de Janeiro e JOÃO VALADARES​​, do Recife

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