Exposição dá mostras de como pessoa com deficiência visual transita em centro urbano

Diálogo no Escuro será aberta nesta quinta (4) no Unibes Cultural, na zona oeste da capital

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São Paulo

Como é não poder contar com um dos cinco sentidos? Passar 45 minutos tendo uma pequena mostra de como uma pessoa com deficiência visual transita em um centro urbano é o que propõe a exposição Diálogo no Escuro, que será aberta ao público nesta quinta-feira (4) no Unibes Cultural, ao lado do metrô Sumaré, na zona oeste da capital paulista.

Antes de entrar na instalação, grupos com até oito visitantes são instruídos e cada pessoa recebe uma bengala, para realizar o percurso totalmente no escuro. O grupo é conduzido por um guia com deficiência visual, em uma inversão de papéis, e caminha por salas escuras e estruturadas para que tenham as sensações de cheiro, temperatura, som e textura como se estivesse passando por parques, ruas, bares, entre outros ambientes do cotidiano.

"Não é uma simulação de cegueira, mas uma pausa na visão de quem enxerga para explorar os outros sentidos. É uma troca muito grande. A pessoa acaba refletindo sobre a capacidade de superar barreiras, pensando sobre o dia a dia de um deficiente visual", diz André Ferreira, 46, guia do grupo e que revela ser cego apenas na conversa que tivemos ainda no escuro, no final do itinerário.

Cerca de dez pessoas estão sentadas e segurando bengalas. Elas estão reunidas em um espaço com quase nenhuma iluminação. No centro, entre elas, há uma barra de ferro, provavelmente para servir de apoio e guia ao se levantarem 

Em cima, na foto, está escrito Diálogo no Escuro e a tradução em braile
Grupo conversa no escuro dentro da exposição - Divulgação

A ideia é despertar no público a empatia e o respeito. E como não se colocar não apenas no lugar de um deficiente visual, mas também no de um cadeirante, por exemplo, diante de obstáculos e da falta de acessibilidade que estão em toda parte? São reproduzidos sons de carros, buzinas, pessoas falando, além de desafios, que parecem corriqueiros, como atravessar a rua. Aliás, é importante saber se a pessoa quer mesmo ser ajudada. Pergunte.

"O objetivo do projeto é mostrar ao ser humano que o impossível não existe e que determinamos nossos próprios limites. Depois da experiência, o público certamente passará a notar ao seu redor, a acessibilidade de espaços e serviços onde vive", diz Andrea Calina, curadora e realizadora da exposição.

Calina afirma que o filósofo alemão Andreas Heinecke criou o projeto Diálogo no Escuro em 1989, após contratar um estagiário com deficiência visual. "Primeiro ele sentiu pena e, depois, surgiu a preocupação que ele fosse ser dependente para tudo. Porém, percebeu que o estagiário era autônomo e independente. Aprendeu mais do que ensinou."

A exposição está em exibição há mais de 30 anos e passou por 40 países, sendo visitada por quase 10 milhões de pessoas, incluindo workshops em empresas.

Dialogando no escuro

Na última etapa da instalação, o guia André Ferreira pede para nos sentarmos e, em um bate-papo, ainda no escuro, relata que perdeu a visão em 2003, aos 27 anos, após descobrir repentinamente que tinha um tumor cerebral. "Fiz a tomografia em uma sexta-feira, recebi o diagnóstico e, na segunda, já não enxergava nada."

Homem com mais de 40 anos, de cabelo curto, preto, posa para foto em frente a um painel com o alfabeto em braille. Ele veste camiseta preta com estampa escrita Diálogo no Escuro, calça jeans, calça tênis preto e está com um máscara preta no rosto
André Ferreira, 46, é um dos guias da exposição Diálogo no Escuro - Havolene Valinhos/Folhapress

Foi necessário que ele passasse por um processo de reabilitação na Fundação Dorina Nowill para Cegos para retomar sua independência. Ele diz que a família e os amigos continuaram o tratando normalmente, o que considera primordial para a adaptação à nova fase da vida. "Meus amigos me chamavam para tomar cerveja no bar. E eu queria negar, mas faziam eu ir. Sou o mesmo André de sempre. Minha mãe foi superprotetora no início, o que é natural, mas isso passou."

Ferreira diz que atuou como vigilante, ajudante de eletricista e na área administrativa, mas tinha o desejo de trabalhar com comunicação. Somente após perder a visão é que passou a comentar futebol na rádio Transamérica e, atualmente, apresenta, com outros colegas com deficiência visual, um programa esportivo na rádio ONCB (Organização Nacional de Cegos do Brasil) e outro de música na rádio WebConectados.

"É uma busca constante por quebrar barreiras. A maioria das pessoas tem preconceito por falta de conhecimento. Temos capacidade de exercer vários cargos, só precisamos de oportunidades", conclui.

Serviço

Diálogos no Escuro – Exposição e workshops

Quando: a partir de 4 de agosto

Onde: Unibes Cultural, rua Oscar Freire, 2.500 - Sumaré (ao lado do metrô Sumaré)

Dias e Horários: quinta a domingo, das 12h às 19h (sessões com 45 minutos de duração e grupos com até oito pessoas)

Ingressos: R$ 30 | R$ 15 (meia-entrada)

Crianças a partir dos oito anos e, até os 12, acompanhadas dos pais.

Às quintas-feiras a entrada é gratuita, mas é necessário fazer agendamento via Sympla.

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