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Governo aposta em Senado e STF para tentar frear marco temporal e pressão de ruralistas

Presidente da Câmara acelerou votação após inclusão de julgamento na pauta do Supremo

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Brasília

Após ser derrotado na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (30), o governo do presidente Lula (PT) aposta no Senado e no STF (Supremo Tribunal Federal) para tentar frear a aprovação da tese do marco temporal para terras indígenas.

A expectativa é que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), dê à pauta tramitação lenta, passando por comissões temáticas e novas análises técnicas.

Assim, ele não seria apreciado antes do retorno do julgamento do Supremo sobre o tema —marcado para o próximo dia 7 de junho.

Sonia Guajajara, com um cocar azul, sentada ao lado de Rodrigo Pacheco, de terno preto, ambos em um sofá atigo, grande e preta
Sonia Guajajara com Rodrigo Pacheco em reunião na presidência do Senado sobre o marco temporal e o PL dos defensivos agrícolas - Pedro Gontijo/Presidência do Senado

Como mostrou a Folha, texto avançou na Câmara como uma estratégia do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e da bancada ruralista para se antecipar à apreciação do STF, uma vez que a tendência na corte é que o marco seja derrubado.

A tese do marco temporal, defendida pela FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), determina que as terras indígenas devem se restringir à área ocupada pelos povos na data da promulgação da Constituição Federal de 1988. O principal argumento a favor da medida é o de garantir segurança júridica.

Os indígenas refutam a ideia e argumentam que, pela Constituição, têm direito a seus territórios originais, não limitados por uma determinada data.

Horas antes da votação na Câmara, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, se reuniu com Pacheco para debater o tema.

No encontro, o presidente do Senado afirmou que, dentre outras coisas, analisará a constitucionalidade do projeto —ponto questionado por parlamentares que se opõe ao texto— e garantiu que a tramitação passará por comissões, à exemplo dos projetos do licenciamento ambiental e da regularização fundiária.

A interlocutores, Pacheco tem dado como exemplo a tramitação do projeto de lei dos defensivos agrícolas —apelidado por críticos de PL do Veneno—, que libera o uso de novos agrotóxicos no país e foi enviado recentemente à Comissão de Meio Ambiente da Casa, mesmo estando pronto para votação no plenário.

A estratégia do governo, agora, é esperar que o julgamento do caso seja mais rápido no Supremo. A votação está 1 a 1 e foi suspensa após pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.

"A ideia é repetir [a estratégia do PL dos agrotóxicos]. Chamar todos [para debater]. Há o compromisso do presidente Rodrigo Pacheco em relação à política ambiental. Ele sempre deixou muito claro que todo trâmite ele vai levar em consideração", afirma a senadora Eliziane Gama (PSD-MA).

"Vamos passar a fazer o debate à altura que deve fazer. Passar nas várias comissões e tentar construir acordos. Agora, do jeito que foi na Câmara eu tenho a segurança de te dizer que aqui no Senado não será assim", completa a senadora, que é coordenadora da bancada ambientalista do Senado.

Mesmo senadores da bancada ruralista esperam que a tramitação na Casa seja mais lenta que na Câmara e admitem que, caso o texto seja julgado inconstitucional pelo STF, o projeto de lei perde seu objeto e pode cair.

O entendimento, no entanto, é que, ao demonstrar que o projeto está caminhando no âmbito do Legislativo, ministros do Supremo se sintam desconfortáveis em decidir sobre o tema.

"Aqui a Casa é um pouco diferente, a dinâmica. Nós temos que ter um pouco mais de calma. O PL vai exigir bastante energia aqui porque não é um tema que os senadores estão [familiarizados]", afirma a senadora Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura de Jair Bolsonaro (PL) e líder do PP no Senado.

"O lugar para essa discussão é aqui. Câmara e Senado", completa a ex-ministra, reiterando que espera que os ministros do Supremo deixem o tema ser decidido pelos parlamentares.

Tanto o projeto dos agrotóxicos quanto o marco temporal são pautas que dividem o governo e opõem Sonia Guajajara e o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, que apoia as duas pautas publicamente.

"Defendo a pacificação. Compreendo que os povos indígenas precisam em alguns pontos de uma atenção especial, de um pedaço maior de terra, mas isso não pode ser em detrimento de produtores que estão há centenas de anos com propriedades tituladas. Então precisamos achar um bom termo. Acredito que isso vai acontecer com moderação", afirmou Fávaro no Senado nesta terça.

Fávaro esteve na Casa para debater também o projeto dos agrotóxicos junto a Pacheco, Tereza Cristina e o líder do PT, Fabiano Contarato (PT-ES) —que é relator da proposta na Comissão de Meio Ambiente.

Na Câmara, o acordo feito entre Lira e a FPA foi que, tão logo o STF marcasse a data para a votação, o texto do marco temporal seria pautado. Assim, a bancada ruralista espera pressionar o Judiciário a deixar que o Legislativo decida dobre a tese.

Por isso, o projeto foi eleito como prioridade da frente nas últimas semanas, após a vitória no relatório da medida provisória dos ministérios —que desidratou as pastas de Marina Silva (Meio Ambiente) e Sonia Guajajara (Povos Indígenas).

Na reunião de líderes da Câmara antes da votação, Lira disse que retiraria o marco temporal da pauta caso o STF desmarcasse o julgamento da próxima semana. Integrantes do governo Lula tentaram adiar a votação, mas sem sucesso.

Por outro lado, integrantes do próprio Ministério dos Povos Indígenas conversaram com o ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais) dizendo que não interessa à pasta que o STF retire o julgamento da pauta. Por isso, pediram cautela à articulação política.

A proposta alternativa do governo era a criação de um grupo entre o Palácio do Planalto, Congresso e Supremo. Líderes da bancada ruralista acreditam que essa ideia até poderia funcionar para criar consenso na disputa, mas desde que não adiasse a discussão do projeto no plenário.

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