SP tem menor quadro de fiscais de rua dos últimos 20 anos e demandas se acumulam

Capital tem 279 agentes para fiscalizar mais de 800 regras, como lei do Psiu; OUTRO LADO: prefeitura diz que pode contratar até 700 profissionais

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São Paulo

Localizada no centro histórico de São Paulo, a divisão de Silêncio Urbano da prefeitura tem a inglória tarefa de fiscalizar a poluição sonora na capital. A dimensão do problema, que levou a quase 20 mil denúncias de moradores no primeiro semestre deste ano, contrasta com o efetivo de profissionais para atendê-las: atualmente, apenas dez agentes são responsáveis pela fiscalização do Psiu em toda a cidade.

A falta de pessoal, que resulta nessa sobrecarga de trabalho, atinge todo o setor de fiscalização. O município tem hoje 279 fiscais em trabalho operacional, equivalente a 1 agente para cada 41 mil habitantes. Ao todo são 325, o menor efetivo da carreira nos últimos 20 anos –em 2003, eram 803.

Distribuídos nas 32 subprefeituras da capital, os profissionais são responsáveis por verificar o cumprimento de mais de 800 normas do município, como código de obras, zoneamento, acessibilidade e regras do comércio —trabalho descrito como "enxugar gelo" por alguns servidores.

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Obra de edifício de luxo construído sem alvará no Itaim Bibi, em São Paulo, embargada após denúncia - Zanone Fraissat/Folhapress

Desguarnecido, o setor acumula longa fila. Cerca de 48 mil solicitações foram recebidas no primeiro semestre deste ano, enquanto 20 mil foram atendidas. Segundo a prefeitura, as principais demandas estão relacionadas a excesso de ruído, limpeza urbana, obras particulares e em via pública, MPL (muro, passeio e limpeza) e atividades comerciais.

Por decreto, solicitações de autoridades têm que vir na frente. "A prioridade da fiscalização acaba sendo atender as demandas do MP [Ministério Público], da Câmara e da Ouvidoria. O trabalho preventivo, quando o fiscal circula pelas ruas e observa se há irregularidades, não ocorre mais. É praticamente impossível com tão pouca gente", diz Mário Roberto Fortunato, presidente do Savim (Sindicato dos Fiscais de Posturas Municipais e Agentes Vistores do Município de São Paulo).

Como consequência, algumas regras municipais passam a receber menos atenção. Um exemplo é a Lei Cidade Limpa, que tem sido menos fiscalizada, enquanto a publicidade irregular ganha espaço nas ruas da capital. Em quatro anos, o número de multas caiu 78%.

As equipes de fiscalização também têm entre suas atribuições o acompanhamento do processo de verticalização da cidade, mas vistorias em obras são cada vez mais raras e só ocorrem quando há denúncia de irregularidade.

Recentemente, a procuradoria do município pediu na Justiça a demolição de um prédio de luxo erguido sem alvará no Itaim Bibi. O Ministério Público também investiga outros três edifícios construídos sem as devidas licenças em outras regiões da cidade. Nos quatro casos, a prefeitura só tomou ciência das irregularidades após denúncias, com as obras já em estágio avançado.

A tendência é que o trabalho de fiscalização ganhe ainda mais importância após a revisão da lei de zoneamento do município, que deve impulsionar a construção de ainda mais prédios na capital.

Segundo Fortunato, além das demandas de autoridades, cada subprefeitura tem sua própria prioridade, seguindo orientação do titular da administração regional —em alguns casos há influência de vereadores, principalmente em áreas periféricas da capital. O Savim defende a criação de uma agência centralizada para regulação das demandas de fiscalização.

A distribuição dos agentes pela cidade também ocorre de forma desigual. Enquanto a subprefeitura Sé tem 20 fiscais em atividade operacional, a região de Pirituba, na zona norte, conta com apenas dois agentes. "O cidadão faz a reclamação no 156, mas dificilmente ela é atendida no prazo. Aí a pessoa fica brava e aciona a Ouvidoria ou o Ministério Público, e só então a fiscalização consegue atender", diz Fortunato.

Vagas de concurso são insuficientes, diz sindicato

O último concurso público para contratação de novos fiscais de posturas municipais ocorreu em 2002, ainda durante a gestão Marta Suplicy –na época os profissionais eram chamados de agentes vistores.

No ano seguinte, o efetivo atingiu o maior patamar da história, com 803 fiscais em atuação. Desde então, o número vem caindo de forma contínua, na medida em que servidores se aposentam ou desistem da carreira.

Dos 325 fiscais, 46 estão em funções administrativas e não participam de operações na rua. O déficit no efetivo foi alvo de processos do Ministério Público e do TCM (Tribunal de Contas do Município) e, pressionada, a prefeitura abriu recentemente um concurso público com 175 vagas. Cerca de 12 mil candidatos se inscreveram, e as provas estão marcadas para 27 de agosto.

De acordo com o Savim, o número de vagas é insuficiente para resolver o déficit, já que muitos servidores têm condições de se aposentar atualmente.

O sindicato defende que 800 agentes seriam o bastante para manter as fiscalizações em dia. O número ainda é inferior ao quadro de 1.200 previsto em lei quando a carreira foi criada, na década de 1980, mas hoje as equipes contam com sistema informatizado que agiliza o trabalho.

"Hoje essa fiscalização conta com ferramentas de tecnologia da informação, que garantem o cruzamento de dados e tornam os processos fiscalizatórios mais eficientes. Uma dessas plataformas é o Geoinfra, capaz de identificar de forma instantânea se uma obra é de uma empresa concessionária ou da prefeitura. Antes do sistema, era necessário que um fiscal comparecesse ao local para fazer a análise", diz nota enviada pela Secretaria Municipal de Subprefeituras.

A gestão Ricardo Nunes (MDB) diz que até 700 fiscais poderão ser contratados a partir do concurso que está em andamento, "dependendo da disponibilidade orçamentária", mas não informou se deve incluir recursos para mais contratações no orçamento do ano que vem.

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