Ministério da Justiça prepara lei para estimular uso de câmera corporal por policiais

Proposta prevê que forças de segurança devem ter acesso a instrumento; texto passará por aval de Flávio Dino

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Brasília

Em meio às medidas para reduzir a letalidade policial, o Ministério da Justiça elaborou um projeto de lei que busca institucionalizar o uso de câmeras corporais pelas forças de segurança do país.

A ideia em debate atualmente prevê transformar o item em parte do equipamento de proteção individual dos policiais.

A primeira versão do projeto tornava obrigatório o uso das câmeras e dava o prazo de 18 meses para que os estados se adequassem à norma.

CÂMERA PEQUENA NA FARDA POLICIAL
Policial utiliza câmera corporal em Copacabana, no Rio - Divulgação/PMERJ

A Casa Civil, porém, pediu ajustes no texto, argumentando que, para tornar o equipamento obrigatório, o governo federal deveria custeá-lo.

O Ministério da Justiça, então, alterou a redação e incluiu as câmeras entre os aparatos de segurança dos policiais. A proposta deve dizer que os policiais têm o direito de acessar o equipamento —ou seja, nas entrelinhas, forçaria os estados a fornecerem o objeto.

O projeto ainda precisa passar pelo crivo do ministro Flávio Dino, que já indicou que pretende enviar a proposta sob sua gestão para deixá-la como legado. Ele deixa a pasta para assumir em fevereiro uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal).

Se for acatado, o projeto de lei vai justificar que as gravações podem servir como prova para que o próprio policial se defenda de acusações. A lei valeria para policiais militares, civis, penais, bombeiros e peritos. No âmbito nacional, seriam atingidos por elas as polícias Federal e Rodoviária Federal.

A Folha teve acesso a uma primeira minuta enviada ao Planalto, na qual Dino argumentou que cabe ao Estado propor mecanismos "que visem reduzir o mau uso da força, deixando de ser legítima, ética e técnica", diante do cenário de alta letalidade policial.

A minuta citava ainda a experiência internacional como exitosa para sugerir o uso das câmeras por forças de segurança.

Além da elaboração do projeto de lei, o secretário-executivo do ministério, Ricardo Cappelli, declarou que o governo Lula (PT) deve anunciar em fevereiro diretrizes para o uso de câmeras corporais.

Uma consulta pública foi criada em 12 dezembro, e a previsão é acabar até dia 26 de janeiro. Ela ajudará na versão final da minuta da Portaria da Diretriz Nacional sobre Câmeras Corporais em Segurança Pública.

"Processo com consulta pública e construído com a participação das polícias de todos os estados, sem exceção. Ideologizar o debate sobre segurança pública não faz bem ao Brasil", disse Cappelli nas redes sociais.

Mário Sarrubbo, que será o novo secretário nacional de Segurança Pública na futura gestão do ministro Ricardo Lewandowski, disse ser favorável à política.

"Sou entusiasta das com as câmeras corporais, vejo que elas tem inúmeras vantagens, por exemplo, diminui a letalidade policial, reduz as mortes dos policiais, ajuda na produção de provas, mas isso vai ser discutido no âmbito do ministério", disse Sarrubbo à Folha.

"Só no momento que nós estivermos [na pasta] é que vamos tomar decisões sobre eventuais políticas do incentivo do uso de câmeras", acrescentou.

Nesta sexta-feira (19), o CNPCP (Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária) aprovou uma recomendação para que forças de segurança usem câmeras nos seus uniformes. O colegiado, formado por membros da sociedade civil, é vinculado ao Ministério da Justiça. O documento aprovado será encaminhado a Dino para que ele o publique no Diário Oficial.

A recomendação sugere, além do uso em si, que os estados adotem modelos que gravem automaticamente. Aconselha ainda que sejam armazenados dados referentes ao período de três a seis meses do trabalho do policial. Hoje, quem já usa esse equipamento no Brasil tem armazenado conteúdo de um mês.

O Conselho ainda recomenda que o uso das câmeras seja aplicado também no âmbito da segurança privada e pede que a Polícia Federal discipline o tema.

Vinculada ao Ministério da Justiça, a PRF (Polícia Rodoviária Federal) disse, em nota, que tem como projeto estratégico o uso de câmeras corporais por todos os policiais que trabalham nas rodovias federais.

Após uma doação dos Estados Unidos, a pasta entregou 200 equipamentos para a PRF, que vão ser submetidos a testes técnicos ainda neste mês de janeiro. O ministério também fez a doação de 200 câmeras corporais para o estado da Bahia.

"Após esta etapa, haverá implementação experimental destas câmeras —ainda como etapa dos estudos— no Rio de Janeiro, prevista para o segundo semestre. A meta é que as câmeras corporais possam ser usadas de forma definitiva pelos agentes da PRF já no próximo ano, em 2025", disse, em nota.

A Polícia Federal não respondeu se apoia o uso de câmeras na corporação.

O uso desses equipamentos voltou ao debate após críticas do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Ele afirmou que não há nenhuma efetividade no uso das câmeras para a segurança dos cidadãos.

O governo renovou por apenas seis meses o contrato que administra o uso de câmeras corporais pela Polícia Militar de São Paulo.

No Rio, policiais militares do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) passaram a utilizar em janeiro câmeras corporais nas fardas durante operações. A medida ocorreu após decisão do STF.

Inicialmente, o governo Cláudio Castro (PL), havia recorrido da decisão do ministro Edson Fachin, do início de 2022, que determinava a implementação de câmeras em todo o efetivo policial. O recurso foi negado.

Instituições defendem o uso de câmeras corporais por policiais. Nota técnica elaborada pelo ex-gerente do programa da Polícia Militar paulista Robson Cabanas Duque e pelo Instituto Sou da Paz diz que o uso do equipamento contribui para a redução de mortes e maior profissionalização das polícias, mas precisa ser aplicado com planejamento detalhado e convencimento da tropa.

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