Descrição de chapéu drogas senado

Senado começa votar PEC das Drogas e governo Lula não se posiciona

Proposta inclui na Constituição criminalização de porte de drogas e é vista como contra-ataque ao STF; gestão evita embate

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Brasília

O Senado deve votar nesta terça-feira (16) a proposta que criminaliza o porte e a posse de drogas, vista como um contra-ataque ao julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) que pode descriminalizar a maconha para uso pessoal.

Patrocinada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a PEC (proposta de emenda à Constituição) deve ser aprovada em primeiro turno sem grandes dificuldades, como ocorreu na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) no mês passado.

Aliados de Lula (PT) admitem não ter força para influenciar o debate na Casa e sinalizam que o governo deve liberar a base para votar como quiser. Até esta segunda à noite (15), véspera da votação, o martelo ainda não estava batido.

Plantação caseira de maconha em bairro da zona norte do Rio
Plantação caseira de maconha em bairro da zona norte do Rio - Ricardo Borges - 17.ago.2015/Folhapress

Integrantes da base afirmam, reservadamente, que o governo tem tentado não se envolver com o tema, afeito ao Congresso, para não estimular uma eventual crise entre os Poderes.

Além de ser uma resposta ao STF, a criminalização do porte de drogas tratada na PEC é um dos itens da chamada pauta de costumes, que inflama a oposição. Por outro lado, a agenda desafia o governo Lula diante da cobrança de setores progressistas da sociedade.

Outro receio é de que a PEC seja declarada inconstitucional pelo Supremo no futuro por alterar uma das cláusulas pétreas da Constituição Federal —o que adicionaria um novo capítulo à disputa entre Legislativo e Judiciário.

O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), afirmou que o apoio ou não à PEC depende da "consciência" de cada um dos parlamentares e que não adianta o governo pedir para que a base vote de maneira oposta à orientação partidária.

"Esse tipo de matéria que, eu diria assim, é de consciência, nem sempre você consegue fazer uma orientação. Porque também não adianta orientar se a maioria dos partidos, individualmente, orienta o contrário. Até porque a orientação de governo sempre é a última a ser tomada em plenário", disse.

"Evidentemente que nós entendemos que o que está na lei já é suficiente. A lei está aí desde 2006; [a PEC] é quase uma reprodução do tema. A tentativa de constitucionalização foi uma espécie de reação ao fato do julgamento em caso concreto do Supremo", completou.

O líder do PT, Beto Faro (PA), vai orientar voto contra a PEC. Já a bancada da União Brasil —partido do relator do texto, senador Efraim Filho (PB)— deve votar em peso a favor da PEC. Outros partidos da base, como o MDB e o PSD, devem liberar os senadores para votarem como quiserem.

Pacheco informou aos líderes que vai respeitar o intervalo obrigatório entre os dois turnos de votação —quebrado, na maioria das vezes, por acordo entre os parlamentares— e que haverá apenas a votação em primeiro turno nesta terça.

Com o interstício, o segundo turno deve ocorrer entre o final de abril e o início de maio. Para ser aprovada no Senado, a proposta precisa de, no mínimo, 49 dos 81 votos em dois turnos. Se for aprovada pelos senadores, a PEC será enviada à Câmara dos Deputados.

Nesta segunda, Wagner conduziu uma sessão de debates no plenário do Senado ao longo de quase três horas. Parte dos especialistas ressaltou que a PEC pode ser declarada inconstitucional por alterar o artigo 5º da Constituição, que enumera direitos e garantias individuais.

"O artigo 5º traz para nós direitos inegociáveis, duramente conquistados após o período da Ditadura: o direito à liberdade, o direito à vida. Não é nesse artigo que se insere uma reprimenda, uma restrição. É flagrantemente inconstitucional inserir, no artigo 5º, a criminalização do usuário", disse a presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB, Silvia Souza.

A Constituição diz no artigo 60 que "não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir", entre outros pontos, "os direitos e garantias individuais".

A professora da UnB (Universidade de Brasília) Andrea Galassi afirmou que a PEC deve dificultar pesquisas científicas e a prescrição de Cannabis para fins medicinais: "Por mais que o texto desta PEC contemple o uso medicinal, imaginem prescrever um medicamento em que a conduta de quem porta drogas é crime".

A favor da PEC das Drogas, o psiquiatra Sérgio de Paula Ramos disse, por outro lado, que a proibição contribui para desencorajar o uso de drogas: "Quais são as respostas de um adolescente que não usa droga sobre por que ele não usa? As respostas são sempre as mesmas: porque faz mal e é proibido".

A proposta foi aprovada na CCJ no mês passado de forma simbólica, sem a contagem de votos. Apenas Wagner, Marcelo Castro (MDB-PI), Humberto Costa (PT-PE) e Fabiano Contarato (PT-ES) registraram voto contra.

O principal argumento de Pacheco e do grupo favorável à PEC é o de que a decisão do Supremo pode liberar o que chamam de "tráfico em pequenas quantidades".

No caso da maconha, parte dos ministros defende um limite em gramas para diferenciar o usuário do traficante —como 10 gramas, 25 gramas ou 60 gramas. A PEC, por outro lado, não define critérios objetivos para a distinção e mantém a Lei Antidrogas, de 2006.

O placar no STF está em cinco votos a três pela descriminalização do porte de maconha. O julgamento no STF foi novamente suspenso depois que o ministro Dias Toffoli pediu vista (mais tempo para analisar o processo).

Colaboraram Luisa Ikemoto e Ana Pompeu, de Brasília

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