Descrição de chapéu Chuvas no Sul

Saques, assaltos e abusos geram medo em meio à crise das enchentes no RS

Governo estadual anuncia reforço de policiamento e reformas em abrigos após denúncias de estupro

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Porto Alegre, São Paulo, Brasília e Curitiba

O vaivém de barcos de resgate às vítimas da enchente sob um viaduto na avenida Cairu, via comercial da zona norte de Porto Alegre transformada em rio pela cheia histórica, começou a diminuir pouco antes das 18h de terça-feira (7), assim que o sol se pôs na capital gaúcha.

Os relatos de saques a lojas e casas e ataques a embarcações de resgate na área fizeram com que voluntários desistissem de incursões de socorro à noite.

"Estamos deixando de fazer o trabalho por causa disso. De noite, só com escolta, porque o risco está ficando insustentável", disse o voluntário Lauro Strogulski Júnior, 50 anos, que presenciou a prisão de um homem no domingo (5), após um saque a um supermercado no bairro Humaitá.

Homens carregam combustível em estrada na região de Eldorado do Sul (RS); voluntários estão com medo de resgates à noite por causa da violência - Amanda Perobelli/Reuters

Dezenas de policiais civis e militares foram acionados para o monitoramento do local, que também tinha carros da Polícia Federal e da Força Nacional. Uma equipe do Batalhão de Choque patrulhava as águas em um barco, e ao menos um agente acompanhava, em jet ski, os socorristas que ainda saíam para resgates.

"À noite está bem complicado. Estão passando endereços errados de resgate para assaltar", contou Fabiano Vargas, 42 anos, antes de embarcar para um socorro noturno.

Os relatos de roubos adicionaram insegurança ao trabalho de voluntários e medo aos moradores, que resistem em deixar suas casas pelo temor de furtos. Há relatos de ocorrências não só na capital, mas também em Canoas, Eldorado do Sul, Novo Hamburgo e São Leopoldo. O policiamento em pontos de socorro tem sido reforçado.

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), pediu ao Ministério da Justiça mais homens da Força Nacional, e o seu efetivo no estado deve ultrapassar 400. O governo federal também enviou agentes da Polícia Federal. Leite ainda cancelou férias e licenças de policiais, liberou horas extras e convocou militares da reserva para ampliar o patrulhamento nas cidades arrasadas pelos alagamentos.

"Manteremos a ordem no estado e vamos prender e dar consequência para todos aqueles que usam um momento dramático como esse para aplicar golpes ou praticar crimes", afirmou ele à imprensa.

O secretário de Segurança do Rio Grande do Sul, Sandro Caron, disse que a situação de "catástrofe" dificulta a identificação de um número exato de saques e roubos ocorridos em meio às enchentes que devastaram cidades e levaram a pelo menos 100 mortes.

Segundo ele, 30 pessoas já foram presas por terem aproveitado a situação de calamidade para entrar em residências e comércios para saquear bens. O secretário disse acreditar que o momento de maior insegurança já passou.

Ele afirma que as forças policiais foram deslocadas para ajudar nos resgates nos três primeiros dias e que, agora, retomaram o trabalho de policiamento ostensivo, o que deve coibir casos de violência.

"Momento de catástrofe, obviamente ninguém fez registro policial, mas acompanhamos as notícias chegando, os relatos. Em situação normal, o cidadão faz registro e tem conhecimento, ali era catástrofe. A gente acompanhou, fatos aconteceram sim, mas como não houve registro formal, não consigo dizer o número de fatos", afirma.

Ele diz ainda que as enchentes dificultaram a ida a delegacias e que muitas pessoas ficaram sem internet para fazer um boletim de ocorrência online.

Seis pessoas foram presas sob suspeita de cometerem crime de estupro nesses abrigos para vítimas das enchentes. As prisões foram confirmadas nesta quinta pela secretaria da Segurança Pública, que não deu mais detalhes. Os casos são investigados.

Um dos crimes teria sido praticado contra uma criança no município de Viamão, a cerca de 20 km de Porto Alegre. Segundo a Polícia Civil, um suspeito foi preso preventivamente por crime de estupro de vulnerável.

Na manhã desta quarta-feira (8), a Polícia Civil prendeu um homem em Viamão pelo estupro de uma menina de 6 anos que havia sido resgatada sem os pais. Voluntários pedem que pessoas que atuam nos locais de acolhimento dos desabrigados monitorem os banheiros 24 horas por dia e solicitam o reforço de segurança masculina nos locais.

Questionado sobre o tema em entrevista na tarde desta quinta, Leite afirmou que entre os casos investigados há suspeita de envolvimento de parentes das vítimas.

"O que a gente observou foi justamente casos que, em princípio, lamentavelmente, envolvem familiares das crianças também, o que sinaliza a possibilidade desses abusos acontecerem anteriormente, e os abrigos tenham escancarado isso, revelado isso, e dado oportunidade inclusive de ação do poder público", afirmou o governador.

Leite também disse que pediu à Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos que verificasse condições para a abertura de abrigos dedicados a situações especiais, "para quem se sinta em uma situação vulnerável".

O governador também anunciou que os mais de 400 abrigos onde estão acolhidas as vítimas devem ganhar reforço de policiamento e reformas para garantir a privacidade dos acolhidos.

A previsão é de um investimento de R$ 217 milhões no reforço imediato no policiamento em todo estado e de R$ 2 bilhões nas reformas de moradias provisórias. Os valores fazem parte do plano de R$ 19 bilhões para reconstrução do estado, que registra mais de cem mortes em decorrência das chuvas.

O governo estadual está convocando policiais civis e militares da reserva para atuarem no policiamento nos abrigos. A intenção é concluir o cadastro dos profissionais até esta sexta (10) para que eles já possam trabalhar no fim de semana, segundo o governador.

Também há casos de outros distúrbios, como presos que tentaram formar facções dentro de um dos abrigos em Guaíba, controlando o acesso a banheiros e alimentos, segundo relato do prefeito do município, Marcelo Manata, ao ministro da Comunicação Social, Paulo Pimenta.

"Não é possível a gente assistir isso tudo calado. É preciso que tenha um reforço para poder de forma exemplar identificar e responsabilizar quem está cometendo crime, seja ele digital, seja ele no dia a dia", disse Pimenta a repórteres.

Os criminosos têm se aproveitado do breu nas cidades sem energia elétrica e do esvaziamento de bairros inteiros para cometer furtos. Inúmeros vídeos nas redes sociais capturaram casos de violência. Um deles, no bairro Mathias Velho, em Canoas, registrou barulhos de tiros no bairro Mathias Velho, em Canoas, na noite de domingo.

Policiais disseram à Reuters que boatos compartilhados nas redes sociais e no boca a boca têm agravado a insegurança da população. Um deles diz que falsos agentes da Defesa Civil estão batendo em casas e apartamentos no bairro Petrópolis, em Porto Alegre, para assaltá-los; suspeita descartada pelo batalhão responsável pela área.

(Com informações da Reuters)

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