Caminhada silenciosa, sem músicas ou podcasts, ajuda a organizar a mente

Especialistas afirmam que a prática pode melhorar o desempenho em tarefas diárias

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Christina Caron
The New York Times

Em um vídeo do TikTok que agora acumula quase 500 mil visualizações, a influenciadora Mady Maio descreve uma caminhada. Mas não uma caminhada qualquer: é uma silenciosa.

Para ela, o passeio de 30 minutos foi revelador. Sem podcasts, sem música. Apenas "eu, eu mesma e eu".

Ela resistiu no começo. (Foi ideia do namorado dela.) "Minha ansiedade nunca permitiria", diz ela no vídeo.

Maio descreveu os primeiros dois minutos como um "caos" mental que eventualmente deu lugar a um "estado de fluxo". A névoa mental se dissipou. Ideias começaram a surgir em sua cabeça porque ela estava "dando espaço para elas entrarem".

ilustração de pessoa caminhando
A caminhada silenciosa pode ajudar na saúde mental - Hoi Chan/The New York Times

A caminhada silenciosa é a mais recente obsessão de bem-estar do TikTok, uma combinação de meditação e exercício que visa melhorar a saúde mental. Ao contrário da tendência similar da "hot girl walk", uma odisseia de mais de 6 km que requer estabelecimento de metas e agradecimentos, a caminhada silenciosa não envolve multitarefa. Não há outra agenda além de dar um passo à frente e observar o mundo ao seu redor.

Caminhar em silêncio é uma tradição antiga enraizada no mindfulness, uma forma de meditação que ajuda as pessoas a se concentrarem nas sensações físicas, pensamentos e emoções do momento presente, sem julgamento.

O fato de a caminhada silenciosa não ser algo novo atraiu uma série de críticas: "A geração Z pensa que inventou a caminhada", dizem eles.

Diante disso, Arielle Lorre, 38, criadora de conteúdo em Los Angeles, teve que rir.

"Há 15 ou 20 anos, isso nem mesmo seria uma conversa", diz Lorre, que várias vezes discutiu os benefícios das caminhadas silenciosas, mais recentemente em seu podcast e no TikTok. Mas a ténica parece relevante agora porque muitos de nós nos tornamos dependentes de nossos dispositivos eletrônicos, acrescenta.

A questão então se torna: "Como podemos contrariar isso?", questiona.

Caminhar é um bálsamo bem estabelecido para a mente e para o corpo. Pesquisas mostraram que caminhar apenas 10 minutos a mais por dia pode levar a uma vida mais longa. E um estudo de 2020 no Journal of Environmental Psychology descobriu que uma caminhada de 30 minutos em um parque urbano reduziu o tempo que as pessoas dedicaram a pensamentos negativos. Caminhar também tem sido apontado como forma de melhorar a criatividade e ajudar a combater a depressão.

Lorre, que caminha em silêncio por pelo menos 45 minutos aproximadamente quatro vezes por semana, diz que desde que começou essa prática cerca de um ano atrás, agora dorme melhor, se sente mais calma e tem energia mais consistente ao longo do dia.

Mas, para algumas pessoas, a ideia de uma caminhada silenciosa pode parecer torturante. Um estudo de 2014 mostrou que, se não tivessem outra opção, as pessoas prefeririam levar um choque em vez de ficar sozinhas com seus pensamentos.

"A maioria das pessoas parece preferir estar fazendo algo coisa em vez de nada, mesmo que seja negativo", escreveram os autores do estudo.

No entanto, a caminhada pode tornar mais agradável o tempo que passamos com nós mesmos, dizem os especialistas.

Erin C. Westgate, professora assistente de psicologia na Universidade da Flórida em Gainesville, que estuda o tédio, descobriu em sua pesquisa que estar em trânsito, o que incluía caminhar ou andar de transporte público, era uma das vezes em que as pessoas mais frequentemente relatavam ter pensamentos agradáveis.

Caminhar "não é tão exigente a ponto de realmente ocupar muita de sua capacidade mental", pontua Westgate, o que "nos dá permissão e licença para sonhar acordado".

Se a ideia de sonhar acordado parece luxuosa, pode ser porque nossa capacidade de atenção encolheu ao longo das últimas duas décadas.

Agora passamos em média cerca de 47 segundos em um conteúdo de frente para a tela antes de passar para outro conteúdo, de acordo com pesquisas lideradas por Gloria Mark, professora de informática na Universidade da Califórnia, Irvine, e autora de "Attention Span". Em 2004, no entanto, Mark descobriu que as pessoas podiam passar em média dois minutos e meio em um e-mail antes de passar para outra tarefa de trabalho.

Mudar continuamente nossa atenção de uma tarefa para outra é cansativo, diz Mark. Mas uma caminhada silenciosa pode ajudar a repor nosso "tanque" para que tenhamos uma reserva maior de energia mental, acrescenta ela. Em outras palavras, desconectar por um tempo pode realmente nos ajudar a ter um melhor desempenho.

Mark sugere fazer pausas digitais em outros momentos, não apenas quando estamos caminhando, e que pensemos em um objetivo emocional para o dia, não apenas em uma lista de tarefas.

Por exemplo, se seu objetivo é se sentir calmo, você pode escrever isso em um post-it e voltar a ele quando pensar em como passará seu pequeno tempo livre naquele dia.

"Tantos de nós sentem que estamos sempre atrasados e correndo para alcançar algo", diz David M. Levy, professor da Escola de Informação da Universidade de Washington em Seattle e autor de "Mindful Tech". Isso pode levar a um estado de "tanta distração que não estamos presentes de forma alguma".

Mas, em uma sociedade orientada para o futuro, precisamos de oportunidades para nos satisfazer com o aqui e agora, pontua Levy, e abandonar a pressão de ser produtivo.

"Há uma grande beleza e vivacidade no mundo fora do que quer que estejamos fazendo em nossos dispositivos eletrônicos", diz ele.

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