Descrição de chapéu saúde mental

Doença mental agrava risco de demência; chances aumentam na terceira idade

Estudo aponta ligação entre transtornos mentais e neurológicos

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Dana G. Smith
The New York Times

Em 2021, Sharon Niederhaus, então com 77 anos, perdeu o marido com quem estava casada há mais de 50 anos. A filha, Kristin Henry, disse que sua mãe nunca mais foi a mesma depois disso.

"Sentimos como se tivéssemos perdido nossos pais ao mesmo tempo", disse Henry, referindo-se a si e ao irmão.

Niederhaus passou a beber muito após a morte do marido. Seu consumo de álcool havia aumentado, inicialmente, oito anos antes, quando ela se tornou sua cuidadora após um derrame; depois que ele morreu, piorou.

Ela começou a trocar mensagens com um golpista que afirmava ser seu antigo chefe. Ao longo de dois anos, ele a enganou e tirou dela centenas de milhares de dólares.

Duas mulheres de costas obsevam arvores e arbustos ao fundo; A mulher da esquerda é loira, jovem e está com o braço direito apoiado sobre os ombros da senhora (direita). Uma senhora acompanhada de sua cuidadora no parque
Estudos apontam ligações entre questões mentais e neurológicas - Ocskay Mark/Adobe Stock

Henry e seu irmão tentaram de tudo para ajudar a mãe: eles organizaram uma intervenção, confiscaram seu telefone, assumiram a procuração e a enviaram para reabilitação. Durante todo esse tempo, eles achavam que os problemas de Niederhaus estavam relacionados ao álcool; seus médicos disseram que ela também estava com confusão mental devido ao luto.

Quando ela foi encaminhada a um neuropsicólogo, no início de 2023, as coisas ficaram claras: além da dependência de álcool, Niederhaus também tinha demência.

As pesquisas apontam que as condições psiquiátricas, como depressão, dependência e esquizofrenia, estão intrinsecamente ligadas a distúrbios neurológicos, principalmente as diferentes formas de demência.

"Essa distinção arbitrária entre uma condição psiquiátrica e uma condição neurológica parece um pouco ultrapassada", disse Ruth Morin, neuropsicóloga clínica do Hospital Hoag, em Orange County, Califórnia, que trata Niederhaus. "Tudo acontece no cérebro."

Os cientistas estão trabalhando para entender exatamente como as duas condições estão conectadas. Evidências sugerem que ter uma doença mental, especialmente na velhice, está associado a um maior risco de desenvolver demência.

Como ocorre essa ligação?

A associação é mais estabelecida entre a depressão e a demência: uma comissão de 2020 nomeou a depressão na terceira idade (após os 65 anos) como um dos 12 principais fatores de risco para a demência.

Com base nisso, novas pesquisas sugerem que a conexão existe para praticamente qualquer transtorno de saúde mental diagnosticado mais tarde na vida.

O estudo examinou prontuários médicos de quase 800 mil pacientes na Suécia e descobriu que, em comparação com os que não tinham demência, os indivíduos com a condição apresentavam cerca de 70% mais chances de desenvolverem uma nova doença mental três anos antes do início da demência. No ano anterior ao diagnóstico, esse risco aumentou para cerca de 300%.

Os especialistas têm duas teorias principais sobre o que está por trás da conexão. Uma é que o início de uma nova condição psiquiátrica, como abuso de substâncias ou ansiedade, aos 70 ou 80 anos, pode ser um sinal precoce de demência.

Nesses casos, "a neurodegeneração no cérebro também está causando sintomas psiquiátricos", disse a médica Sara Garcia-Ptacek, neurologista e professora assistente do Karolinska Institutet, na Suécia, que liderou o estudo.

A outra teoria é que os dois diagnósticos são independentes —o de depressão mais tarde na vida, por exemplo, pode ser apenas isso—, mas o impacto que a doença mental causa desencadeia ou acelera a demência.

"A depressão vai reduzir nossa capacidade cognitiva. Isso significa que talvez um processo biológico que ocorre há vários anos, de repente vem à tona", disse Garcia-Ptacek.

Nem todas as pessoas que desenvolvem um transtorno psiquiátrico mais tarde na vida também terão demência, mas dada a frequência com que as duas condições ocorrem juntas, Garcia-Ptacek aconselhou que os médicos solicitem testes cognitivos para adultos mais velhos com novos sintomas psiquiátricos, como precaução.

Qual o impacto da doença na juventude ou vida adulta?

A conexão entre a saúde psiquiátrica e a neurológica é menos clara quando uma pessoa é diagnosticada mais cedo com doença mental. Há algumas evidências de que um episódio de saúde mental, especialmente a depressão, aos 30, 40 ou 50 anos está relacionado a um maior risco de desenvolver demência no futuro, mas nem todos os estudos mostram isso.

Por exemplo, um estudo publicado em 2017 acompanhou durante 30 anos mais de 10 mil adultos de 35 a 55 anos e descobriu que altas pontuações em um teste que avalia sintomas de depressão —não um diagnóstico formal— não estavam associadas a um aumento do risco de demência se ocorressem mais cedo na vida. No entanto, houve um aumento do risco se os sintomas de depressão aparecessem na idade adulta tardia, aproximadamente uma década antes do diagnóstico de demência.

Uma meta-análise de 2022 descobriu que episódios depressivos após os 60 anos quase dobraram o risco de demência. Se ocorressem antes, esse risco aumentaria em 17%. Uma grande ressalva é que doenças mentais graves —por exemplo, aquelas que requerem hospitalização— no início ou meia-idade parecem estar associadas a um risco substancialmente maior de demência.

Um estudo publicado no ano passado, que analisou 30 anos de registros de saúde de 1,7 milhão de pessoas na Nova Zelândia, descobriu que aqueles que foram hospitalizados por um transtorno de saúde mental em algum momento da vida adulta tinham de três a quatro vezes mais chances de serem diagnosticados com demência posteriormente.

Uma maneira de explicar a possível associação entre transtornos mentais mais cedo na vida e transtornos neurológicos mais tarde é que pode haver uma ligação direta no cérebro entre as duas condições.

Por exemplo, tanto a doença de Alzheimer quanto o transtorno depressivo maior estão associados a uma diminuição do volume em uma área do cérebro chamada hipocampo, que está envolvida tanto na memória quanto no humor.

A conexão também pode ser atribuída a comportamentos associados a doenças mentais que aumentam o risco de uma doença neurodegenerativa, disse Terrie Moffitt, professora de psicologia da Universidade Duke, que liderou o estudo na Nova Zelândia.

Por exemplo, pessoas com transtornos psiquiátricos tendem a ser mais isoladas, não dormir bem, ter menos saúde física e apresentar taxas mais altas de doenças crônicas como as cardíacas e diabetes —que aumentam o risco de demência.

"É realmente difícil dizer o que está impulsionando a associação", disse Morin. "Mas acho que a mensagem principal é que você deve levar isso a sério, porque sabemos que há uma associação."

No entanto, os especialistas também enfatizaram que ter uma condição psiquiátrica de forma alguma garante que você vá desenvolver demência, e há coisas que você pode fazer para reduzir seu risco.

A primeira prioridade deve ser buscar tratamento para qualquer transtorno psiquiátrico, disse Morin. Isso ajudará a limitar a gravidade da condição, o que pode mitigar o risco de desenvolver demência.

Cuidar da sua saúde física também pode reduzir o risco de demência. "Atividade física, alimentação saudável, manter conexões sociais, ter estímulos mentais —tudo isso é ótimo", disse Garcia-Ptacek.

Esses são "fatores que estão dentro do controle das pessoas", disse Morin, e eles "podem ter um efeito realmente drástico" no futuro.

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