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Escassez de oxigênio trava a abertura de novos leitos em Manaus e prejudica transferências no interior

Na espera pela abertura de novos leitos, pacientes recorrem ao home care para tratamento em casa

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Manaus

No momento em que vive uma explosão de casos novos de Covid-19, com mais de 15 mil casos registrados nos últimos cinco dias, Manaus não consegue ampliar a sua rede de atendimento hospitalar diante da falta de oxigênio hospitalar, outros insumos e profissionais para atuar na linha de frente.

O cenário aumenta a pressão sobre os hospitais públicos, que operam acima da capacidade desde 14 de janeiro, quando o desabastecimento de oxigênio provocou um colapso da rede.

No dia em que a crise de abastecimento de oxigênio chegou ao ápice, a taxa de ocupação dos leitos clínicos para pacientes adultos chegou a 110%. Desde então, permanece acima de 100%, segundo dados do boletim epidemiológico da Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas.

O pico de superlotação na rede pública foi registrado no dia 16 de janeiro, quando a taxa de ocupação dos leitos clínicos chegou a 126% e, das UTIs, a 107%. Ou seja, havia mais pacientes internados do que leitos disponíveis, além de pessoas internadas em poltronas e macas de ambulâncias do Samu.

No último domingo (24) a taxa de ocupação dos leitos clínicos era de 117% e não havia nenhum leito livre. Já entre os leitos de UTI a taxa de ocupação era de 99%, com apenas um leito livre para pacientes adultos.

Apesar das altas taxas de ocupação nos hospitais e do aumento no número de casos da doença, o registro de novas hospitalizações sofreu uma queda brusca a partir de 15 de janeiro, um dia depois do abastecimento de oxigênio entrar em colapso. Isso porque nem todos os hospitais conseguiram recuperar sua capacidade plena de atendimento.

Manaus começou a registrar picos de novas hospitalizações na última semana de 2020. A partir do 31 de dezembro a capital amazonense registrou uma sequência de novos recordes de internações, até chegar a 254 hospitalizações em 24 horas no dia 14 de janeiro.

No dia seguinte (15), quando a escassez de oxigênio começou a atingir também outras unidades, como serviços de pronto-atendimento e maternidades, o número de novas hospitalizações diárias caiu para 166 e depois para 112.

No último domingo (24) foram 114 internações. Apesar do número menor, a taxa de ocupação se mantém elevada.

Sem oxigênio para atender nem os pacientes já internados, muitas unidades de saúde da rede pública e também da rede privada bloquearam leitos e chegaram a fechar as portas para novos pacientes temporariamente.

A Prefeitura de Manaus informou que 200 leitos do hospital privado Nilton Lins credenciados pelo Ministério da Saúde estão aguardando apenas o abastecimento de oxigênio para serem desbloqueados, o que não tem previsão para acontecer.

“Quando a gente ia abrir, acabou o oxigênio”, justificou o prefeito de Manaus, David Almeida (Avante).

A enfermaria de campanha montada pelo exército em frente ao hospital Delphina Aziz também não começou a funcionar pelo menos motivo. Neste caso, a instalação de uma usina própria de oxigênio pode garantir o início dos atendimentos até o fim da semana, estima a secretaria estadual de saúde.

Segundo o prefeito, o abastecimento de oxigênio em Manaus estabilizou por alguns dias, mas não está resolvido. “Temos uma calma momentânea”, avaliou.

De acordo com a prefeitura, o fornecimento que chegou nos últimos dias garante o funcionamento das ambulâncias do Samu por três dias e os atendimentos da maternidade Moura Tapajós por quatro dias.

Médicos e outros profissionais que atuam nos hospitais de referência para Covid-19 em Manaus relataram que o abastecimento que vem sendo garantido pelo governo estadual, Ministério da Saúde, implantações de miniusinas e também pelas doações de ações voluntárias, empresas e até outros governos garantiu a manutenção dos atendimentos aos pacientes internados.

Contudo, o fornecimento ainda não foi normalizado e há receio de um novo desabastecimento.

Sem conseguir leito, vem aumentando o número de pessoas que aderem ao home care não por opção, mas diante da falta dela. É o caso do aposentado Luiz Amorim, de 87 anos, que não conseguiu encontrar um leito de UTI disponível nas unidades de saúde e acabou voltando para casa sem atendimento.

Sem equipamentos nem oxigênio suficiente, a família e amigos dele fazem apelos nas redes sociais em busca de ajuda para montar um leito domiciliar. Faltam cilindros de oxigênio, um aparelho Bipap (compressor de ar usado no tratamento de doenças pulmonares) e um concentrador de ar.

“Não conseguimos leito, ele está em casa e precisa disso para viver”, diz o filho dele, Arthur Amorim.

Voluntários que estão ajudando a arrecadar e distribuir oxigênio para pacientes em domicílio também relataram que, desde o dia 15 de janeiro, mais que dobrou a procura por ajuda por quem não consegue leito nos hospitais nem pode pagar até R$ 6.000 por um cilindro de oxigênio, disputado em longas filas que se formam diariamente em frente às empresas fornecedoras na capital.

Boa parte das pessoas que pedem ajuda dos voluntários relata que não conseguiu leito nem na rede pública nem na privada por falta de oxigênio.

Com isso, cresceu o número de óbitos em domicílio em Manaus de uma média diária de cinco antes da pandemia para 30. A prefeitura aumentou de um para três o número de equipes de verificação de óbito em domicílio.

O problema se reflete também no interior, onde não há leitos de UTI e 92 pacientes aguardam por uma transferência para os hospitais – já superlotados – da capital, 43 deles à espera de um leito de UTI. Parte dessas pessoas morre antes mesmo de ser transferida, como vem acontecendo em Itacoatiara, segundo o defensor público Murilo Monte.

Enquanto isso, o abastecimento de oxigênio para as prefeituras segue irregular, segundo o Tribunal de Justiça do Amazonas, que na última sexta (22) intimou o secretário de saúde do estado, Marcellus Campêlo, para prestar esclarecimentos.

O Ministério Público do Amazonas instaurou um procedimento para investigar a conduta e a responsabilidade de gestores e de fornecedores nas mortes de 31 pacientes por falta de oxigênio em todo o estado.

Em manifestação junto ao TJ-AM, os órgãos de controle do Amazonas informaram que “não estão sendo adotadas as medidas para melhoria da distribuição do oxigênio aos municípios do interior” e “não está havendo a ágil transferência de pacientes para leitos”.

Uma das regiões que mais preocupam é a do médio rio Solimões. O município de Tefé, que recebe pacientes de outros municípios no entorno, é onde o estoque de oxigênio é mais crítico. Lá, o abastecimento diário mal garante a demanda, aponta a Defensoria Pública do Amazonas.

“Tefé está sempre em colapso iminente. Se der problema em um barco, se atrasar um avião, a gente corre o risco de ficar sem oxigênio”, contou a defensora pública Márcia Mileni.

A Secretaria de Saúde do Amazonas informou que cilindros de oxigênio são enviados diariamente para os municípios e que usinas de oxigênio estão sendo instaladas em cidades pólo do interior e em unidades de saúde da capital.

Além disso, o número de leitos mais que triplicou desde o início da pandemia, mas a capacidade de atendimento da rede está limitada pela capacidade de produção de oxigênio das fornecedoras do estado.

Para reduzir a demanda, mais de 200 pacientes foram transferidos para hospitais universitários de outros estados.

O governo do Amazonas também publicou decreto estendendo o toque de recolher, que agora é de 24 horas, permitindo apenas a circulação de profissionais de serviços essenciais e de um membro familiar por vez para compras de itens essenciais.

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