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SP deveria decretar emergência por dengue nas próximas semanas, dizem especialistas

Infectologistas afirmam que o pior ainda está por vir; estado tem 127.978 casos e 27 mortes por dengue

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São Paulo

Mesmo com a velocidade no aumento de casos e mortes por dengue no estado de São Paulo, a gestão Tarcísio de Freitas empurra a decisão de decretar situação de emergência em saúde pública, medida tomada por pelo menos 11 cidades paulistas —Registro, Iepê, Marília, Botucatu, Jacareí, Pindamonhangaba, Pederneiras, Bariri, Guararema, Suzano e Taubaté.

De acordo com o painel de monitoramento da dengue, desenvolvido pela SES (Secretaria Estadual da Saúde), até esta sexta-feira (1º), o estado já havia confirmado 127.978 casos da doença e 27 mortes.

Alexandre Naime Barbosa, coordenador científico da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia) e professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Botucatu, explica que o estado de São Paulo já reúne as condições para a situação de emergência, como o número de casos novos e a superlotação nos serviços públicos de saúde.

Alunos da EE Almirante Barroso, no Jabaquara, na zona sul de São Paulo, durante ação de combate à dengue nesta sexta-feira (1º) - Danilo Verpa/Folhapress

"O decreto é necessário principalmente para que sejam alocados recursos. Muito provavelmente o estado de emergência vai ser decretado nas próximas semanas", comenta o infectologista.

"A principal preocupação agora é a questão do atendimento das pessoas. O pior momento da dengue ainda vai acontecer, principalmente nas últimas semanas de março e começo de abril. Então, a situação ainda vai piorar e precisa ser criada uma rede de emergência. Qual é a preocupação agora? É atender todo mundo e atender rápido. O tempo de atendimento significa a vida", afirma Barbosa.

Entre os fatores importantes numa situação de emergência, Alexandre Naime também cita o manejo, ter profissional capacitado para o momento. "Dengue é uma doença de todo médico, não é do especialista, não é do infectologista, é uma doença que qualquer médico que está na atenção básica ou na emergência precisa saber manejar. E isso demanda recursos", ressalta.

Álvaro Furtado, diretor da SPI (Sociedade Paulista de Infectologia), tem o mesmo entendimento. "O estado de São Paulo está perto de decretar emergência. Muito provavelmente, nas próximas semanas. Eu trabalho em alguns hospitais privados aqui em São Paulo. É nítido, pelo menos nas últimas semanas, o aumento percentual de pacientes internados em enfermarias com diagnóstico de dengue. Você tinha, na média, no mês de janeiro, de um a dois casos, então agora você começa a ver 30% na enfermaria do hospital privado com dengue, nos hospitais públicos também. E mais nas UPAs, nas unidades de atendimento, nos postos de atenção primária", afirma Furtado.

"A emergência é declarada quando o volume de casos está começando a sobrecarregar o serviço de saúde. É preciso montar um plano de contingência. Primeiro, para começar a atender e ter estrutura para atender esses pacientes, senão eles podem morrer. E outra coisa: você centraliza os esforços e investimentos em dinheiro para combater mosquito [Aedes aegypti]e tentar diminuir um pouco o impacto da epidemia", explica o diretor da SPI.

No dia 28 de fevereiro, a reportagem questionou a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Saúde a respeito do decreto de emergência. Em nota, o órgão disse que monitora o avanço da dengue e que no estado e o coeficiente de incidência —critério do Ministério da Saúde para a classificação da doença em relação à população— estava abaixo de 300 (nesta data, chegava a 234 casos por 100 mil habitantes). Quando a incidência supera 300 é considerado epidemia.

Para Barbosa, neste cenário, o coeficiente de incidência não é o quesito mais importante a ser observado.

"Primeiro, o coeficiente de incidência estadual não reflete situações regionais. Vários municípios já declararam a situação de emergência. Quando você dilui todas as cidades do estado de São Paulo, algumas estão precisando de alocação de recursos do governo estadual, outras não. Então esse número não é uniforme", diz Barbosa.

"Segundo, o coeficiente de incidência não reflete a falta de atendimento, tanto de capacitação quanto de vaga. Nossos hospitais já estão superlotados. Na cidade de São Paulo, ontem [quinta-feira] acabaram os testes de diagnósticos de dengue", afirma. A Secretaria Municipal da Saúde disse que adquiriu 400 mil novos tstes. Em caso de desabastecimento pontual devido à alta procura, será feito o remanejamento entre as unidades da região.

A pasta também citou a criação do COE (Centro de Operações de Emergências) e as ações do Plano de Contingência das Arboviroses Urbanas. O governo paulista repassou R$ 205 milhões para os 645 municípios paulistas combaterem as arboviroses, entre as quais, a dengue. Além disso, o Exército e a defesa civil vão atuar juntos na eliminação dos criadouros do mosquito Aedes aegypti, transmissor da doença.

"Quando observamos as ações que estão sendo feitas —e muitas delas são corretas—, elas já se assemelham muito a um decreto de situação de emergência, ou seja, nós já estamos vivendo essa situação de emergência em termos práticos, em termos de ação. Assumir esse estado de emergência é o que não foi feito ainda", explica Alexandre Naime Barbosa.

No dia 29 de fevereiro, em resposta ao novo questionamento, a secretaria afirmou que a circulação de sorotipos, a incidência de outras arboviroses, a situação epidemiológica e assistencial, e a quantidade de municípios em epidemia também eram critérios levados em consideração na decisão de decretar emergência por dengue. A gestão Tarcísio reafirmou que ainda não havia nada programado.

Três dos quatro sorotipos da dengue circulam no estado. Segundo o Painel de Monitoramento de Arboviroses do governo federal, em 2024, São Paulo teve aumento de 110,8% nos casos de chikungunya, até 29/02. Passou de 359 em 2023 para 757 neste ano.

Durante coletiva de imprensa nesta sexta, a secretária Estadual da Saúde em exercício Priscilla Perdicaris disse que a situação de emergência está sendo avaliada semana a semana pelo COE.

"Nós já temos um plano de contingência, um plano de trabalho pronto para caso seja necessário seja a decisão tomada em consenso pelo COE, nós consigamos fazer isso em um curto espaço de tempo".

Por email, a assessoria de imprensa reforçou a informação: "não houve atualização sobre a situação de emergência", diz a nota.

Na opinião de Maria Anice Mureb Sallum, professora do departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo) e coordenadora do mestrado profissional em entomologia, os municípios estão perdendo o controle e a situação se agrava com o aumento de casos, inclusive graves, mortes e comprometimento dos sistemas de saúde.

"Medidas de controle como eliminação de criadouros das fases aquáticas pode ser efetiva se existirem técnicos em entomologia de campo em número suficiente e apoio da população. A eliminação dos adultos com adulticidas também é necessária, pois o comportamento alimentar do mosquito favorece a transmissão dos arbovírus", finaliza Sallum.

A professora explica que alguns fatores devem ser considerados para decretar estado de emergência: quando a incidência permanecer em ascensão por quatro semanas consecutivas e/ou ocorra notificação de caso grave suspeito ou suspeita de óbito por dengue; quando o número de casos notificados para o ano ultrapassar os do limite máximo com transmissão sustentada de acordo com o diagrama de controle e/ou ocorra um aglomerado de óbitos suspeitos por dengue; quando o número de casos notificados para o ano ultrapassar os do limite máximo com transmissão sustentada de acordo com o diagrama de controle e de mortalidade por dengue nas últimas quatro semanas for maior ou igual a 0,06/100 mil habitantes.

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