"Nosso produto é medalha."
Essa frase estava na resposta do diretor-geral do COB (Comitê Olímpico do Brasil), Rogério Sampaio, a uma pergunta da Folha, feita antes do início das Olimpíadas de Paris, sobre a expectativa de pódios do país para estes Jogos.
Pois o produto medalha está menos na vitrine do comitê agora do que em Tóquio-2020, a edição olímpica anterior, realizada em 2021 devido à pandemia de coronavírus.
No Japão, na melhor campanha já feita, o Brasil conquistou sete medalhas de ouro, seis de prata, oito de bronze. Na França, são três ouros, sete pratas, dez bronzes.
Não há matemática que possa mudar esse panorama, não há como não aceitar o óbvio: pioramos. Pouco no total de medalhas (21 a 20), muito na medalha mais valorizada, a dourada (7 a 3).
O COB fará neste domingo (11), na capital francesa, um balanço da participação brasileira em Paris-2024. Estarão na mesa, diante dos jornalistas, Sampaio, que chefia a delegação, e o presidente do comitê, Paulo Wanderley.
Certamente satisfeitos com o desempenho do judô (um ouro, duas pratas, um bronze, melhor resultado na história), esporte que praticaram –Sampaio, expoente olímpico, foi ouro em Barcelona-1992–, mas consideravelmente desgostosos com a performance geral.
Se estiverem contentes, não deveriam estar. Menos medalha é menos medalha. Teve declínio. Ponto final.
Mas os dirigentes possivelmente parecerão contentes aos olhares do público, em um ato teatral.
Esporte é negócio, e elogiar a campanha do Brasil faz parte de um roteiro preestabelecido, com o objetivo de não afugentar patrocinadores para o próximo ciclo olímpico, o de Los Angeles-2028.
É provável que apareça uma oratória malabarista, para contornar uma situação adversa. Argumentos pouco categóricos que indicarão que o país evoluiu.
Virão frases do tipo "chegamos a mais finais, tinham sido X, agora foram Y", "estivemos muito perto do pódio N vezes", "modalidade W teve seu melhor desempenho", "atleta K jamais competiu tão bem".
Nenhuma delas será mentirosa, haverá números e exemplos que as sustentem. Só que soarão como uma cortina de fumaça para disfarçar a oferta menor do produto medalha.
Pegará mal. Principalmente porque, nas palavras do Departamento de Comunicação do COB, "nunca o Comitê Olímpico do Brasil investiu tanto em esportes como agora".
Se o investimento financeiro tivesse diminuído, seria aceitável a redução nos pódios. Mas não. Só tem crescido, ano a ano, o dinheiro público direcionado às confederações esportivas.
Em 2023, o COB repassou R$ 201 milhões a essas entidades por meio da chamada Lei das Loterias, que direciona ao comitê uma porcentagem do arrecadado pela Caixa Econômica Federal com apostas em casas lotéricas. Acima dos R$ 165 milhões de 2022, abaixo dos R$ 225 milhões previstos para este ano.
Isso sem contar os recursos privados, também na casa dos milhões.
De acordo com o COB, sua receita com patrocínios (não informada), cresceu 240% no atual ciclo olímpico. O comitê tem duas dezenas de empresas patrocinadoras, entre as quais Vivo, Azul, Riachuelo, Kraft Heinz e Havaianas.
Contudo, mesmo após forte injeção de verba, o quadro de medalhas é peremptório. Colocação em Tóquio: 12º lugar. Colocação em Paris: 20º lugar (na melhor hipótese). Não é um tombo colossal, mas é um tombo significativo.
Mais honroso para o COB, em seu discurso, será reconhecer o declínio. Expor o que pode ter dado errado para a falta de mais medalhas e, principalmente, para a falta de mais ouros.
O comitê esperava que modalidades que nunca subiram ao pódio "medalhassem" pela primeira vez.
Não aconteceu, a não ser que o COB decida considerar a marcha atlética (prata com Caio Bonfim) uma modalidade do atletismo, o que seria como classificar o solo ou a trave, aparelhos da ginástica artística, de modalidades. Disparate.
Melhor é expor que ginástica rítmica, tiro com arco e tênis de mesa, bem cotados, não chegaram lá. Decepcionaram?
Mais: vela e natação, terceiro e quarto esportes com mais pódios na história do Brasil olímpico, 19 e 17 respectivamente, zeraram em Paris-2024. O que houve, e como mudar esse quadro?
Respostas sem rodeios, com reconhecimento e exposição de possíveis falhas e propostas concretas para impulsionar de vez o esporte nacional são desejáveis e muito bem-vindas.
Pois a caminhada para Los Angeles-2028 já começa no apagar das luzes do Stade de France, palco do encerramento de Paris-2024 na noite francesa deste domingo.
MEDALHAS E COLOCAÇÃO DO BRASIL NESTE SÉCULO NAS OLIMPÍADAS
Paris-2024: 20 (3 ouros, 7 pratas, 10 bronzes) - 20° lugar*
Tóquio-2020: 21 (7 ouros, 6 pratas, 8 bronzes) - 12º lugar
Rio-2016: 19 (7 ouros, 6 pratas, 6 bronzes) - 13º lugar
Londres-2012: 17 (3 ouros, 5 pratas, 9 bronzes) - 22º lugar
Pequim-2008: 17 (3 ouros, 4 pratas, 10 bronzes) - 23º lugar
Atenas-2004: 10 (5 ouros, 2 pratas, 3 bronzes) - 16º lugar
* Até as 19h de sábado, 10/8
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