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Gildo
Jorge Roberto tem 18 anos. Jerry Adriani Santos de Jesus, 24. Ambos
são índios e ficaram no centro dos eventos em comemoração aos 500
anos do Brasil. Viraram símbolos do que era para ser uma festa de
plástico e se transformou em protesto, confronto e lamento.
As imagens de Gildo enfrentando de joelhos a tropa de choque foram
transmitidas para todo o mundo. Nelas ele suplica, chora e acaba deitando
no asfalto. Os soldados passam por cima. Depois, ele conta, bateram.
Gildo nasceu em uma aldeia no Mato Grosso do Sul, mas passou 15 anos
"debaixo de uma lona" na periferia de Rondonópolis (MT). Com a família,
participou de invasões de terra, de expulsões. Agora eles ocupam uma
franja de propriedade onde plantam abóbora.
Sua trajetória é a de um pária. Mas, com o gesto de sábado, ele passou
seu recado: "Parece o começo da história, quando os portugueses e
bandeirantes acabaram com a gente".
Jerry Adriani também estava na pancadaria. Mas só foi aparecer com
destaque no dia da missa, na quarta. Com um pano preto enorme, os
índios invadiram o lugar e conquistaram o direito de falar. Foi a
vez dele, um professor de aldeia.
Firme, leu seu discurso. "Quinhentos anos de sofrimento, de massacre,
de exclusão, de preconceito, de exploração, de extermínio de nossos
parentes, aculturamento, estupro de nossas mulheres, devastação de
nossas terras, de nossas matas, que nos tomaram com a invasão".
Mais uma bofetada na festa de plástico. O gesto de Gildo e o discurso
de Jerry ficarão gravados. O restante foram atos constrangedores,
nau quebrada, discursos empolados e pedidos de desculpas.
Espere. Mais uma cena chamou atenção na missa. Assistindo calado a
tudo, um mulato segurava um guarda-sol para proteger uma autoridade.
Parecia uma tela de Debret dos primórdios do Brasil. Então está tudo
igual? Os dois jovens índios indicam que não.
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