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Há um aspecto do sucesso da candidatura de Marta Suplicy à prefeitura de São Paulo que, embora salte aos olhos, não tem sido devidamente discutido.
A população de São Paulo só deu uma vez na história, com Luiza Erundina, em 1988, a chance de o PT (Partido dos Trabalhadores) administrar o município.
Por mais que Erundina tenha feito uma campanha eleitoral correta naquele ano, é fato que fenômenos nacionais (as mortes em Volta Redonda, principalmente) influenciaram o resultado do pleito.
Erundina tinha a cara da população mais humilde da cidade, mas sua aparência, seu sotaque e suas propostas desagradavam (e ainda desagradam) a elite social e econômica paulistana.
Não era, no entanto, apenas uma rejeição preconceituosa. Tratava-se também de uma legítima questão de interesses. O orçamento é um só e, em tese, as elites podem, se quiserem, optar por candidatos que defendam seus bairros e seus interesses e tentar impedir a democratização orçamentária espalhando sua própria ideologia para a periferia.
Não existe mágica: se um prefeito quiser urbanizar favelas e asfaltar todas as ruelas das Zonas Sul e Leste, terá de reduzir o dinheiro para os Jardins. É um cobertor curto.
Sob esse prisma, o PT só conseguiria ser eleito novamente por uma nova conjunção de fatores externos (uma nova Volta Redonda), se convencesse a maioria pobre da cidade a não dar ouvidos à direita ou se inventasse o mito do cobertor longo, prometendo defender, ao mesmo tempo, os pobres e os ricos.
É verdade que o PT foi beneficiado pelo fracasso de Celso Pitta (cuja administração fez pior estrago eleitoral que as mortes em Volta Redonda) e que basta correção administrativa para ser muito melhor que Pitta no comando. Mas isso não explica tudo.
Com Marta, o PT optou pelo mito do cobertor longo.
Vizinha de Maluf, loira, de olhos azuis e com sobrenome bonito, Marta é a viabilização, pelos Jardins, do PT em São Paulo. Ela não tem sotaque de pobre, tem marido conhecido, tem filhos loirinhos e chama pelo primeiro nome todas as ilustres personagens paulistanas que frequentam as páginas da revista Caras.
Marta, nesse aspecto, é beneficiada pelo próprio preconceito que atrapalhou a gestão de Erundina.
Pode não ser algo consciente, mas Marta parece garantir uma segurança para as elites. A candidatura de Marta traz o mito do cobertor longo e resta saber se, caso eleita, cobrirá os pés ou a cabeça.
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