Descrição de chapéu Todo mundo lê junto

Matemática permite saber alguma coisa ainda que tudo seja incerto

Área chamada probabilidade ajuda a estimar tempo de casa até a escola ou resultado do futebol

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São Paulo

Qual é a chance de alguém ganhar na loteria? Como descobrir se um remédio de fato consegue tratar uma doença? De que maneira é possível saber quem está na frente em uma eleição, sem ter que perguntar para todo mundo?

Quando não há certeza do resultado de eventos como estes, existe uma ciência para ajudar quem busca a resposta: ela se chama probabilidade, e é uma das áreas da matemática.

Probabilidade Folhinha
Área da matemática, probabilidade ajuda a encontrar respostas - Catarina Pignato

Os conhecimentos de probabilidade são essenciais para a humanidade, já que muitas vezes não é possível saber ao certo o que vai acontecer, seja a definição do ganhador de um jogo de futebol, ou qual o tempo exato que vai levar o trajeto entre sua casa e a escola.

Para tentar entender e se aprofundar nessas questões, os matemáticos se baseiam, por exemplo, em eventos passados. No caso do futebol, é possível usar o histórico recente de vitórias, empates e derrotas de um time.

E, para estimar a ida ao colégio, dá para se valer do conhecimento sobre os fatores que influenciam um fenômeno, como a presença ou a ausência de chuva, e a quantidade de ladeiras no caminho.

Existem matemáticos, como Roberto Imbuzeiro Oliveira, 43, que se dedicam ao estudo de questões que envolvem probabilidade. Ele trabalha no Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), no Rio de Janeiro.

Um dos problemas regados de incertezas que ele tem estudado envolve redes sociais, que são aplicativos como o Instagram e o Facebook.

Se você ainda não está acostumado com eles, pode pensar que, nesta explicação, estamos falando da sua família e seus amigos, que são pessoas conectadas a você, e que existem os parentes e amigos destas pessoas, que não estão ligadas a você necessariamente.

Pois Roberto, às vezes, precisa saber como pensam as pessoas de uma rede social específica, sem ter que conhecê-la inteira, ou seja, sem ter a informação completa. Como será que ele faz?

Probabilidade Folhinha
Conhecimentos sobre probabilidade são essenciais para a humanidade - Catarina Pignato

Vale lembrar aqui que não existe um grande catálogo público de usuários das redes sociais, onde estejam presentes todas as informações a respeito de cada um deles. E que também não haveria memória de computador suficiente, nem tempo hábil, para processar tanta informação.

Por isso, não seria possível fazer como acontece com pesquisas eleitorais, quando os cientistas fazem uma espécie de sorteio e escolhem 3.000 pessoas para perguntar como elas pensam, e depois tiram as conclusões necessárias.

“A questão é como você se aproveita da estrutura da rede para descobrir informações sobre o todo, sem ter que visitar bilhões de páginas de cada usuário”, detalha o pesquisador sobre essa dinâmica que ele usa em seu trabalho.

Um caminho para Roberto e todos que estudam as redes sociais é investigar os amigos dos amigos, e depois os amigos dos amigos dos amigos.

“Mas não é algo óbvio. Se eu começo pelos meus amigos do Rio de Janeiro, talvez eu conclua que 30% das pessoas torcem para o Flamengo. Depois que eu parto para os amigos dos amigos, com mais gente de fora do Rio, ainda não tem pessoas da Índia ali, mas certamente a qualidade da informação, em uma perspectiva global, vai melhorando.”

Como cada pessoa é, pensa e age de um jeito, o desafio é entender exatamente como fazer esse “passeio”, e, em meio à incerteza, entender a variabilidade, que é a natureza que algo tem de variar. Depois, tirar conclusões com grande probabilidade de estarem certas.

Com a ajuda desta área da matemática, é possível entender o que as pessoas gostam de fazer, quem admiram, em quem tem mais chance de votar, para quem vale a pena oferecer um produto etc.

Quando criança, Roberto pensava em ser astronauta, talvez por alguma influência do avô astrônomo. Sua avó adorava matemática, e a família era recheada de professoras —ambiente perfeito para florescer o amor pelas ciências exatas.

Ele gostava tanto de resolver problemas que participou, em 1991, da Olimpíada Brasileira de Matemática, quando obteve menção honrosa. “Era uma prova difícil”, lembra.

Não foi desde sempre que Roberto soube que faria da matemática uma profissão. “Eu via uma beleza no assunto, sabia que tinha conexão com tudo, mas não sabia como era fazer matemática. Por um lado, ela é quase uma arte, também tem filosofia e ciência, e representa uma verdade sobre o mundo.”

Já no mestrado, que é uma das etapas da formação de pesquisadores, nos anos 1999 e 2000, ele precisava escolher uma área para se especializar.

Uma das influências para a decisão final foi o matemático e ex-mágico Persi Diaconis, um professor da Universidade de Stanford conhecido pelo trabalho na área de probabilidade e randomização.

Ele estudou, por exemplo, como embaralhar tão bem uma sequência de cartas de baralho até que a ordem delas não tivesse nada a ver com a sequência original.

Uma das coisas mais legais de probabilidade é que ela aparece em um montão de problemas, não só os de matemática. Um deles, por exemplo, é na hora de testar novos medicamentos.

O que importa neste caso não é se uma pessoa melhora ou não com o novo tratamento, mas qual a chance de, se você estiver recebendo esse remédio, conseguir realmente melhorar, em comparação a quem recebe só placebo —o placebo é uma espécie de remédio de mentirinha que os médicos oferecem em estudos, porque sabem que somente o fato de um paciente achar que está tomando algo pode gerar nele um efeito positivo.

Entendendo um pouco de probabilidade e de proporções a gente cai menos em algumas ciladas. Como quando alguém diz que um país ou cidade está entre os que têm mais pessoas doentes com o novo coronavírus, a exemplo do que às vezes mostra o noticiário. Essa informação, sozinha, não ajuda a entender a gravidade da situação.

É preciso considerar o tamanho da população para isso ficar claro. Falar que 500 pessoas estão doentes dentro de uma cidade com 10.000 habitantes é bem diferente de dizer que 500 pessoas estão doentes em uma cidade com 1 milhão de habitantes.

São os famosos “números relativos”, em oposição aos “números absolutos”.

Para aqueles que gostam de matemática, Roberto deixa um recado: “Bem-vindos! A matemática é uma coisa bonita e se conecta com uma boa parte de todo o conhecimento humano, até mesmo com a medicina e com as ciências sociais, que dependem cada vez mais da análise de dados. Ninguém perde tempo ao estudar matemática.”

Para quem ainda não é fã da disciplina, ele acha que vale arriscar. “A matemática pode ser como um jogo de tabuleiro baseado em lógica, números e formas, e intimamente relacionado à realidade, com descobertas, tentativa e erro, e onde você pode ser criativo ao ponto de pensar o que ninguém nunca pensou e ver o que ninguém nunca viu”, encoraja.

“Com a matemática, a gente consegue satisfazer e atiçar a curiosidade, e portas se abrem. Seja ela o centro da sua vida ou mesmo secundária, certamente vai ser útil”.

TODO MUNDO LÊ JUNTO

Texto com este selo é indicado para ser lido por responsáveis e educadores com a criança

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