Em filme vencedor do Oscar, Michelle Yeoh mostra ao mundo o poder do kung fu

'Quando praticamos uma arte que nos ajuda a conhecer nosso corpo e a nossa força, parece que passamos a ter voz', diz instrutora

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São Paulo

A atriz Michelle Yeoh, vencedora do Oscar de melhor atriz, estrela várias fotos de divulgação do filme "Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo". Em algumas delas, ela está com as mãos espalmadas, em uma posição típica da arte marcial que ela pratica há muitos anos: o kung fu.

Nascida há cerca de 6.000 anos na China, essa arte marcial tinha como objetivo ensinar a defesa pessoal às pessoas. Com o passar dos anos, foram sendo acrescentadas ao kung fu técnicas meditativas, ou seja, que falam de concentração, e princípios filosóficos, que são ensinamentos sobre maneiras de nos comportarmos.

Cena do filme 'Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo'
Cena do filme 'Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo' - David Bornfriend/Divulgação

"Para as crianças, o kung fu promove saúde, disciplina e desenvolvimento de habilidades motoras, sociais e foco", enumera o psicólogo e mestre de kung fu sifu [instrutor] Balestrini, praticante de artes marciais desde os 9 anos e fundador da Escola de Kung Fu Lung Fu.

O kung fu tem várias linhagens, também chamadas de estilos. A primeira divisão deles é a que separa os estilos do sul e do norte da China. "Os do norte são mais acrobáticos, porque os praticantes costumavam lutar em montanhas, e tinha muita batalha usando cavalos", explica o sifu.

"Os estilos do sul são menos acrobáticos porque as lutas costumavam acontecer em becos, em lugares muito fechados e até em barcos, então não adiantava ficar pulando porque se perderia o equilíbrio."

As subdivisões desses estilos são baseadas em animais. Há, por exemplo, o estilo louva-deus, o macaco e o serpente, em que os praticantes vão imitar os movimentos desses bichos.

"Na nossa escola o estilo é o Choy Lay Fut, que é baseado no movimento de cinco animais: tigre, pantera, dragão serpente e garça. O praticante aprende todos", diz o sifu. Ele conta que recebe alunos a partir dos 4 anos de idade, e que já teve quem começasse a praticar aos 65.

A malaia Michelle Yeoh, a atriz de "Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo", tem 60 anos, e fez um discurso poderoso ao receber o Oscar no último domingo (12). "Não deixe que ninguém fale que você passou da idade", disse, direcionando suas palavras às mulheres.

"Acho que Michelle pratica kung fu desde sempre, porque me lembro de assistir aos filmes dela quando eu ainda era um adolescente. Ela é superboa, um ídolo. Eu a acho incrível", elogia sifu Balestrini.

Além do novo filme, que ganhou o Oscar este ano, Michelle também já apareceu praticando kung fu em outras produções, sendo a mais famosa "O Tigre e o Dragão: A Espada do Destino" (2016). Ela também deu voz à cabra Fala Macia de "Kung Fu Panda 2" (2011).

"Isso é legal na cultura do cinema chinês, porque sempre houve mulheres nos filmes praticando artes marciais", diz o sifu.

"Eu super recomendo o kung fu para meninas e mulheres. Além da parte do desenvolvimento motor, que ajuda no entendimento do nosso corpo, tem uma coisa riquíssima que é a confiança em nós", comenta a sijeh [instrutora] Manu Balestrini.

Ela pratica o kung fu desde os 22 anos —hoje tem 37. Costumava assistir aos treinos de amigos e achava que nunca conseguiria fazer tudo que eles faziam. Até que um dia fez uma aula experimental e não parou nunca mais.

"Nem sempre o mundo em que somos criadas nos trata como merecemos, e assim vamos 'encolhendo', nos escondendo, diminuindo e aprendendo a nos calar. Quando praticamos uma arte que nos ajuda a conhecer nosso corpo e a nossa força, e ensina a transpor barreiras, parece que passamos a ter voz e não aceitamos menos do que um lugar em que possamos nos expressar", resume a sijeh.

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O sifu Balestrini e a sijeh Manu Balestrini - Arquivo Pessoal

Alguns dos filmes que retratam a cultura e a prática do kung fu mostram movimentos clássicos da arte, mas também os combinam com um pouco de dança. Isso acontece porque eles fazem referência a um momento em que o kung fu foi banido da China continental, e o que sobrou dele foi incorporado de um jeito, digamos, disfarçado em peças de teatro.

"O governo achava perigosa a prática. Suponha que cada escola tivesse uma centena de alunos: era como se fosse um pequeno exército, e isso na visão deles ameaçava a situação política local", ensina o sifu Balestrini. O kung fu retomou sua posição tradicional nos últimos 50 anos.

A quem se interessar em praticar a arte, o sifu recomenda começar treinando duas vezes por semana. O aluno começa com uma faixa básica, e vai subindo na hierarquia até conquistar a faixa preta, que é a décima primeira delas.

O sifu garante que é uma prática para todos, independentemente do gênero, idade ou forma física. E explica que, como os alunos não fazem combates entre si, exceto no exame para a faixa preta, é raro que alguém se machuque.

"Tudo é feito de maneira controlada. É mais fácil ver pessoas se machucando ao jogar futebol do que praticando o kung fu", diz.

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