Descrição de chapéu saúde mental

'Celular não é vilão': uso em excesso movimenta escolas e famílias e vira tema de livro

Sumir com um problema impede a reflexão sobre ele, e cada grupo deve decidir o que é melhor para si, diz psicóloga

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São Paulo

Pendurador de celular ao lado da lousa, pochete que tranca os aparelhos na primeira aula e só libera na última, carta das famílias pedindo que as crianças sejam proibidas de usar seus telefones tanto nas aulas quanto nos intervalos e no recreio —a vigilância dos colégios anda dura sobre a forma como os alunos usam seus celulares.

Ilustração do livro 'Larga Esse Celular' - Divulgação

Todas essas medidas listadas acima aconteceram nos últimos dias em escolas de São Paulo (Alef Peretz, Escola da Vila e Vera Cruz). Mas, mesmo naquelas que ainda não decidiram mudar nada até agora em relação ao tema, as conversas sobre o uso em excesso do celular e os problemas que ele poderia causar na saúde de crianças e jovens vêm acontecendo nos corredores e grupos de responsáveis no WhatsApp.

Isabela V. L., do 6º ano do Vera Cruz, escreveu para a Folha comentando a decisão do seu colégio. "Eu concordo com os pais. Deviam proibir o celular no recreio porque as crianças estão brincando bem menos e ficam mexendo no celular. As crianças se reúnem para assistir vídeos no Youtube. Quem não tem celular, assiste com quem tem", disse Isabela em seu email.

"Eu queria que todos só lanchassem, conversassem e brincassem. Eu acho que até na entrada, saída, no almoço, na espera do inglês, o celular devia ser proibido. Eu acho que as crianças deviam conversar mais e poderiam fazer lição juntas etc."

A Folhinha conversou com Isabela também por WhatsApp. Ela complementou sua opinião dizendo que os aplicativos das redes sociais, como TikTok e Instagram, além do Youtube, são o grande problema dos celulares na escola.

Ela mesma até tem um aparelho, mas diz que só o utiliza para ligar para seus pais. "Em casa, eu uso pra assistir vídeos e ver mensagens no WhatsApp e no Teams", afirma. Ela diz que até encoraja a família toda a deixar o telefone um pouco de lado, mas que nem sempre eles conseguem.

O celular não é um vilão, mas um recurso a ser usado com cuidado. Quem faz essa afirmação é a psicóloga Alice Munguba, do núcleo infantojuvenil da clínica de saúde Holiste, em Salvador, Bahia.

"O telefone pode ser muito bacana quando usado de forma segura e direcionada pela família. É importante que os pais ensinem as crianças a usar essa ferramenta, como eles ensinam a usar tesouras, facas etc. Ambos podem ajudar e podem ferir. Se essa ferramenta chamada celular for usada de maneira excessivamente passiva, pode causar prejuízos", diz.

Se todos forem sinceros, vão admitir que, já que usar o celular é tão legal, deixá-lo de lado não é mesmo a coisa mais fácil do mundo. Alice explica que qualquer dispositivo que tenha imagens em sequência, muitas cores e informações sempre atrai a curiosidade e o interesse das pessoas de todas as idades.

"O celular acaba preenchendo uma lacuna em momentos de tédio porque encontramos nele um conteúdo já pronto para o entretenimento. E, assim como ele pode abrir novas janelas de conhecimento e comunicação, com o excesso também pode deixar as pessoas nessa posição de só ficar esperando que as coisas venham elas", diz a psicóloga.

"Eu mando minha mãe sair do celular para me ajudar na lição de casa, para ficar um pouco comigo ou na hora de dormir, mas muitas vezes eu mando e ela não sai", se queixa Isabela, a aluna do Vera Cruz. Essa situação acontece também em um livro recém-lançado, chamado "Larga Esse Celular" (Caminho Suave Edições, R$ 54,90, 44 páginas).

Os autores Phuong Tam e Hoang Giang são do Vietnã, e criaram juntos a história de Ana, uma menina que sempre ouve dos responsáveis que precisa sair do celular. Ela não quer comer, não quer dormir, nunca responde quando a chamam… Acontece que a mãe, o pai e a avó de Ana também não largam seus aparelhos. Um dia, todos na casa começam a passar mal, e a reviravolta acontece.

"É comum que os adultos não se deem conta do excesso ou da dependência do celular", diz a psicóloga Alice. "Antigamente todo mundo se sentava de frente pra TV e talvez não conversassem. A TV não acabou com a comunicação das famílias, e o celular também não vai acabar com ela. Mas pode ser que ele a atrapalhe."

Para ela, é "delicado" impor uma regra geral para todas as famílias, escolas e grupos. "Ao dizer 'Está difícil lidar com esse problema, vamos sumir com ele', impedimos as pessoas de refletir sobre as coisas. E cada família deve decidir o que funciona melhor para ela", afirma.

TODO MUNDO LÊ JUNTO

Texto com este selo é indicado para ser lido por responsáveis e educadores com a criança

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