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Em 'Sem Amor', equipe de busca e resgate é metáfora para a psicanálise

Sessão aberta ao público seguida de debate abriu novo módulo do Ciclo de Cinema e Psicanálise

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São Paulo

Depressão infantil, suicídio, assassinato e amor —ou a ausência dele— foram temas presentes no debate que se seguiu à exibição gratuita de “Sem Amor” (2017). O filme russo conta a história de um casal que, em meio a um conflituoso processo de divórcio, precisa se unir para tentar solucionar o desaparecimento do filho de 12 anos.

Diante da ausência do Estado, representada pela negligência da polícia em relação ao sumiço da criança, os pais recorrem a uma equipe de voluntários que ajudam a investigar várias possibilidades. As ações incluem buscas em florestas e prédios abandonados, perguntas ao único amigo do garoto na escola e uma jornada entre hospitais e necrotérios.

Para a psiquiatra e psicanalista infantil Regina Elisabeth Lordello Coimbra, a equipe de buscadores é um representante metafórico da psicanálise. Ela explica que a psicanálise faz “a busca e o resgate de estados mentais” que ficaram marcados ou reprimidos. “Esse é o papel mais encantador da psicanálise enquanto lugar de investigação”, afirma.

Além de Coimbra, o repórter da Ilustríssima Walter Porto participou do debate, mediado por Luciana Saddi, diretora de Cultura e Comunidade da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). A exibição de “Sem Amor” foi a sessão de abertura do módulo “Mal-estar na civilização e infância”, do Ciclo de Cinema e Psicanálise, organizado pelo Museu da Imagem e do Som (MIS) com o apoio da Folha.

Mesmo diante do desaparecimento de Alyosha (Matvey Novikov), seus pais não conseguem ter uma aproximação saudável. A mãe Zhenya (Maryana Spivak) e o pai Boris (Aleksey Rozin) estão em conflito constante e não se dão uma trégua nem quando são confrontados com a possibilidade da morte do filho. As cenas levantaram dúvidas entre o público que compareceu à sessão sobre um possível assassinato de Alyosha pelos pais.

“Quando há uma impossibilidade de que, num grupo familiar, as funções geracionais se instalem dentro de uma perspectiva em que prevaleça um vínculo amoroso, [o crime familiar] pode acontecer”, afirma Coimbra.

Sob a ótica do ensaio que dá nome ao ciclo de cinema, Luciana Saddi falou sobre como Sigmund Freud (1856-1939) destacava a importância do amor como um fator de civilização. “Freud ressalta principalmente o amor da mãe pelos filhos, como um fator de ligação tão importante que vai formar a família, abrandar a agressividade masculina e trazer ternura para as relações humanas", explica Saddi.

Walter Porto analisou “Sem Amor” com um viés político. “O filme é sobre o sumiço do futuro e sobre o peso de morar na Rússia com todas as questões que o país tem em termos de aparato do Estado e burocracia”, analisa Porto. Para ele, o pessimismo do diretor Andrey Zvyagintsev, presente em outras obras como “Leviatã” e “O Retorno”, fica evidente no enredo e na estética do filme. “Não é um pessimismo que diz ‘era bom e agora está ruim’, mas diz ‘tudo sempre foi uma porcaria e não vai melhorar’”, afirmou.

“Sem Amor” foi o vencedor do prêmio do júri no Festival de Cannes de 2017 —o mesmo prêmio levado em 2019 pelo brasileiro “Bacurau”, de Kleber Mendonça Filho. O longa também concorreu ao Oscar de melhor filme internacional e ao Globo de Ouro na mesma categoria.

A próxima sessão do Ciclo de Cinema e Psicanálise está marcada para o dia 10 de dezembro, quando será exibido o drama libanês “Cafarnaum” (2018).

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